Coluna

DIÁRIO ETÍLICO DE UM CARTUNISTA

Aeroporto Santos Dumont - Rio de Janeiro - 01 de julho de 2023 -17h15.

Reprodução - 

Querido diário… Querido, não. Tá muito gay. Prezado diário. 

Começa aqui minha viagem pela Europa de Hemingway. Essas anotações servirão de base para um pretenso livro sobre a saga etílica do escritor americano Ernest Hemingway pela Europa. 

Vou começar por Portugal. Hemingway nunca bebeu lá. Não existe nenhuma menção em seus livros sobre qualquer boteco português que o escritor de 'Paris é uma Festa' tenha colocado os pés.

Então, por que Portugal? Por dois motivos: primeiro porque é um país onde se bebe muito e depois, porque é o país da Europa que mais presta homenagens ao escritor.

Pelo menos seis botecos lusitanos levam o nome de Hemingway na fachada. Vamos conhecê-los.

De lá, vamos a Madrid, na Espanha, conhecer o El Cuchi, o Botin e a Cerveceria Alemana, botecos onde Hemingway batia ponto.

Depois, a Paris, na França e Veneza, na Itália. Lá, fechamos o círculo de bares do escritor.

 

Aeroporto Internacional Humberto Delgado - Lisboa - Portugal - 2 de julho de 2023 - 14h5.

Finalmente, chegamos.

Eu odeio voar. Se Deus quisesse que a gente voasse tinha nos feito com asas. 

Várias vezes o piloto nos avisou para apertarmos o cinto porque íamos atravessar uma zona de turbulência. A aeronave tremia toda. Eu também. 

Do meu lado, uma senhora rezava. Parecia mais nervosa que eu. "O senhor não vai rezar?", perguntou. "A senhora já rezou e acredito que sua área de proteção cubra o meu assento também", respondi, querendo parecer durão, mas eu estava morrendo de medo.

Conseguimos. 

O avião inicia a descida - a pior parte, depois da queda, claro. 

O tempo está bonito. Sol com poucas nuvens. A tripulação recolhe os copos do café da manhã - horrível, por sinal. Pelo preço da passagem o café deveria ser melhor que o do Starbucks. Não é.

Li no cardápio que serviriam vinho no almoço. Espero que seja bom e de graça. E era. Lembrei-me da Sheila e seu gosto apurado por vinhos secos. Eu sou um bebedor amador. Gosto dos vinhos suaves. 

O almoço deu pro gasto. A cozinha não era digna de uma estrela Michelin, como o  La Vague d'Or (Saint-Tropez, Paris), mas matou a minha fome.

Agora é descer e enfrentar a fila da imigração. Espero que esteja menor que a do Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. 

Pra fazer o check in encarei uma fila de quase três horas. Até o Gustavo Scarpa, ex-Palmeiras, estava na fila, com uma criança no colo, como um simples mortal.

Dei sorte. Passei ileso pela imigração portuguesa. A única pergunta deles foi se eu tinha vindo vender chinelos havaianas em Lisboa. Eu trouxe vários pares para o meu filho. "Aqui as havaianas são mais caras que um carro" , disse ele.

 

Lisboa - Portugal - 3 de julho de 2023.

Hoje fomos conhecer os bairros Alto e Alfama, no centro da cidade.

Alfama é como se fosse Santa Teresa, no Rio de Janeiro, só que mais limpo e organizado. 

Considerado o coração da cidade, Alfama é o bairro mais antigo da Europa.

Com suas ladeiras íngremes, seus sobrados, vielas, bares e cafés é o bairro boêmio de Lisboa. A 'Pink Street'- Rua Rosa - é onde ficam as boates, as prostitutas, e os barzinhos mais descolados do bairro.

A cerveja é boa. Um pouco cara. 6 Euros a caneca - aproximadamente 36 reais. Vale a vista magnífica da cidade.

O bairro era frequentado, no passado, pelo poeta Fernando Pessoa. Ele, provavelmente, é a figura mais conhecida de Portugal. Tem a foto e desenhos do rosto dele em tudo por aqui. Em casas, muros, canecas, camisas, tudo.

Consegui uma caricatura dele em um desenho dos artistas Gui & Hauke.

Outro artista muito popular por aqui é o Bordalo. O artista expõe suas obras construídas com restos de peças de automóveis, nas paredes de Lisboa.

 

Lisboa - Portugal - 5 de julho de 2023.

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Divulgação - 

Vamos hoje conhecer o charmoso e bucólico Bairro do Chiado onde nasceu e viveu o poeta e escritor Fernando Pessoa.

Aqui, em um prédio charmoso de quatro andares, no Largo do Sossego, nasceu Fernando Pessoa, no dia 13 de junho de 1888.

Poeta lírico e nacionalista foi um dos mais importantes poetas da língua portuguesa e figura central do Modernismo português.

Fernando Pessoa foi vários poetas ao mesmo tempo. Tendo sido plural, como se definiu. Criou seus heterônimos, com traços e personalidades próprias, cada um com biografias diferentes.

Paramos no Chiado para conhecer "A Brasileira", café próximo a residência do poeta, local frequentado diariamente pelo escritor. 

Levei meu livro 'Poesia Suja' e 'Pra Você', livro da poeta Sheila Ferreira, para serem abençoados pelo poeta maior.

Abenção, poeta!

 

Lisboa - Portugal - 6 de julho de 2023.

Hoje fomos conhecer a Casa dos Bicos, na Rua dos Bacalhoeiros, 10, em Lisboa, onde funciona a Fundação José Saramago.

A entrada custa 11 euros. Idosos pagam 6 euros e jornalistas não pagam nada. Estou adorando isso. Já visitei exposições, castelos e casas de cultura, sem pagar nada. No Brasil cobram tudo da imprensa.

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Oliveira onde estão enterradas as cinzas de Saramago. Ao fundo, a Casa dos Bicos. (arquivo pessoal)

A Casa dos Bicos, sede da instituição desde junho de 2012, oferece uma exposição permanente dedicada à vida e à obra de José Saramago.

Saramago foi um dos maiores escritores de língua portuguesa. Ácido,irônico, sarcástico e contestador, o escritor deixou uma obra vasta e de enorme importância para Portugal e para o mundo.

Autor de mais de 40 títulos, Saramago nasceu em 1922, na Aldeia de Azinhaga. Em 1947 publicou "A   Viúva", o seu primeiro livro.

Em 1971, começou a trabalhar como editorialista no "Diário de Notícias". Escreveu obras definitivas como "Memorial do Convento", "O Evangelho segundo Jesus Cristo", "Caim" e "Ensaio sobre a Cegueira", obras traduzidas em todo o mundo.

Saramago - que nunca ocultou a sua militância comunista - projetou mundialmente sua figura polêmica, pessimista, brilhante, ativista e incômoda em romances, poesias, teatro, crônicas jornalísticas e memórias.

José Saramago recebeu o "Prêmio Camões", em 1995 e o "Prêmio Nobel de Literatura", em 1998.

O escritor morreu em sua residência, em Lanzarote, no dia 18 de junho de 2010, aos 87 anos.

 

Cascais, Portugal, 7 de julho de 2023.

Cascais - Hoje viemos a Cascais, uma estância balneária fincada em uma parte alta
de Portugal.

Cascais é conhecida pelas suas belas praias de areias brancas e lindas marinas - aqui fica uma das residências do jogador Cristiano Ronaldo.

No centro histórico fica a Fortaleza de Nossa Senhora da Luz e o Palácio da Cidadela, um antigo retiro real. Lá também fica a Igreja de Nossa Senhora da Assunção, com azulejos vitrificados.

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Arquivo - 

Mas os locais mais visitados são as praias. Fizemos uma caminhada pelo litoral até Estoril, onde fica um dos maiores e mais antigos casinos da Europa.

Com casas, hotéis e pousadas luxuosas, de frente para o mar, Estoril atrai visitantes de todos os cantos do mundo, ávidos pela cultura pop e o jet set. Aqui rolam festivais de cinema e lendários concertos de jazz. Eu, que amo o jazz, estou adorando conhecer o lugar.

Um dos lugares mais incríveis de Cascais é a "Boca do Inferno". São imensas paredes rochosas com crateras formadas pela fúria das ondas do Atlântico contra os rochedos.

Os museus também são muito visitados. Um deles, o Museu do Mar, presta homenagem ao legado marítimo de Cascais e ao Rei D. Carlos I, pioneiro da oceanografia portuguesa, assassinado em 1908.

Amanhã, vamos de carro para a Espanha. Seguindo os passos do velho Hemingway, vamos conhecer o "El Cuchi", o "Botin", a "Cerveceria Alemana" e o "Café Iruna", botecos frequentados pelo escritor.

Eu queria conhecer Madri de trem, mas meu filho preferiu fazer a viagem de carro.

Então, até amanhã, diário.

 

Madrid - Espanha, 9 de julho de 2023. - Após 6 horas e 10 minutos de estrada, chegamos a Espanha.

A estrada de Lisboa a Madrid é muito boa. Bem sinalizada e com pouco tráfego. 

Atravessamos dois países da Europa e não encontramos nenhuma viatura policial na estrada. Ainda assim, aqui as leis são respeitadas. Todos usam o cinto de segurança. E respeitam os limites de velocidade. 

A E90 é uma estrada européia que começa em Lisboa e que acaba na Turquia. Tem uma extensão de 4770 km. Esta estrada passa sucessivamente por Portugal, Espanha, Itália, Grécia e Turquia, terminando junto da fronteira Iraque-Turquia.

Arquivo pessoal - 

O fuso horário aqui na Espanha é de uma hora em relação a Portugal. Estamos uma hora na frente dos portugueses, a cinco dos brasileiros e  com fome. 

Alugamos um apartamento na Calle de Leon, uma bucólica ruazinha próxima a casa onde nasceu e morreu o escritor, romancista e poeta Miguel de Cervantes. Aqui, ele escreveu parte do livro Dom Quixote, considerado um dos maiores romances da literatura moderna.

Madrid é uma das cidades mais lindas da Europa. Suas avenidas largas e elegantes e seus belos parques combinam com seu rico acervo de obras de arte. Entre seus artistas maís famosos, expostos no Museu do Prado, destacam-se Goya, Velasquez e outros grandes  mestres.

A Plaza Mayor, ladeada por grandes pórticos, é o centro turístico de Madrid. A cidade preservou muitos dos seus bairros e ruas históricas. Jóia da cultura local, o chamado "Triângulo de Ouro da Arte", localizado ao longo do "Paseo del Prado" é composto por três importantes museus de arte: o Museu do Prado, o Museu Rainha Sofia  (onde ficam as obras de Picasso, incluindo o quadro Guernica), e o Museu Thyssen. 

Uma dica para os amigos jornalistas: em visita a Europa, não esqueçam de trazer suas credenciais de imprensa. As visitas a todos os museus - e são muitos pela Europa - são pagas. 12 euros (72 reais), em média. Jornalistas - aqui eles chamam de periodistas - não pagam. Até agora, economizei uns 120 euros (720 reais) aproximadamente.

Amanhã vamos visitar o Rainha Sofia e os botecos "El Cuchi", o "Botin", o "Museo Chicote" e a "Cerveceria Alemana", os preferidos de Hemingway.

 

Madrid, 10 de julho de 2023 - Hoje, fomos conhecer a Calle de la Montera.

A Montera é, sem dúvida, a mais famosa rua de prostituição de Madrid. Por estar numa zona central e supervalorizada - entre a Gran Via e a Porta do Sol - esta movimentada rua de pedestres, cheia de lojas, bares e restaurantes está sempre cheia de gente a qualquer hora. Seria o equivalente local da paulistana Rua Augusta.

Arquivo pessoal - 

As prostitutas podem ser vistas 24 horas por dia. Elas estão organizadas por áreas. Na parte baixa da rua - próximo á delegacia - estão as negras, um pouco acima estão as sul-americanas e, na parte mais alta, ocupando a maior área, as 'meninas' do leste europeu e pouquíssimas espanholas.

Até 2007, as brasileiras dominavam a maioria dos pontos da rua, mas a Romênia entrou para a União Europeia nesse mesmo ano e, com uma Máfia mais forte, obrigou as brasileiras a saírem da rua e se prostituirem somente nas casas destinadas a prostituição.

Na Calle de la Montera, assim como na Augusta, os comerciantes, os turistas e os moradores, convivem pacificamente com as prostitutas. A noite, os bares e os restaurantes estão sempre lotados. Para mim, o melhor deles é o 'Cuidad de Tui', um boteco chic de cozinha galega de qualidade, que serve bons vinhos e o famoso mojito.

As 'meninas' não assediam os turistas. O máximo de assédio que sofri em Madrid foi uma ou outra piscadela, por parte das mais afoitas. Diferente das prostitutas, os traficantes de drogas te assediam na cara de pau, a luz do dia.

Um dos 'mulas' - jovens que oferecem drogas, livremente -, um tipo bem vestido, limpo, bem barbeado, de uns 30 anos (pode ter muito menos, as drogas e a vida nas ruas envelhecem muito) se aproxima, educadamente, e nos oferece 'marijuana', cocaína e o 'speedball' - injeção de heroína e cocaína misturadas. Cinco euros.

Se você não aceitar, eles respeitam. Não insistem. E até agradecem a atenção dada. 'Gracias', eles dizem, e saem, discretamente.

 

PINK STREET
Lisboa, 12 de julho de 2023 

De volta a Lisboa, fui conhecer locais por onde não passei na minha primeira visita a Portugal.

Então, fomos a ‘Rua Cor-de-Rosa’, a mais famosa rua de prostituição da noite lisboeta. A rua é uma das mais badaladas de Lisboa. Oficialmente, o nome é ‘Nova do Carvalho’, mas o nome ‘Rua Cor-de-Rosa’ acabou surgindo após um projeto de intervenção urbana em 2011, e pegou. Um dos momentos chave desta renovação foi a pintura do pavimento da rua que a partir de então passou a ser conhecida como a ‘Rua Cor-de-Rosa’ - ou ‘Pink Street’, na linguagem dos turistas - e virou o epicentro da noite lisboeta. Outra vez.

pink street
Divulgação - 

Neste recanto da cidade, ocupado por bares e chapéus de sol coloridos - lembra uma charmosa rua de Penedo, que visitei com a Sheila - o decadente deu lugar ao cool e o kitsch passou a ser um ponto a favor.

No passado, ela já foi um dos principais pontos de drogas e prostituição da cidade e o ‘Cáis do Sodré’ - nome da região - conhecido como ‘Ilha da Prata’. ‘Prata’ ou ‘Chinesa’, é o nome da mistura de heroína e cocaína, preparadas em folhas de papel inox de cozinha  e aquecida com um isqueiro, até liquefazer, e aspirada com um canudo. 

Os bares da ‘Pink Street’ tinham os nomes das capitais do Norte da Europa, que serviam para atrair os marinheiros que desembarcaram em Lisboa. Hoje em dia, esta má fama ficou no passado e a ‘Rua Cor-de-Rosa’ se tornou tão badalada que está entre as 12 ruas prediletas do ‘New York Times’, na Europa. Por isso, mesmo que você não queira curtir a noite, passe por lá, durante o dia, para conhecer. Vale a pena.

A ‘Pink Street’ não é só restaurantes e bares de prostituição, também é lugar para beber, dançar e - acreditem - ler. Pelo menos três bares da rua são de passagem obrigatória: a “Espumaria do Cais". Neste bar, que ocupa uma antiga garagem, o espumante da casa - para beber em copo ou em garrafa para levar - é a estrela da casa. Também brilham por lá os cocktails, sangrias, cervejas e gins que acompanham petiscos deliciosos.

O ‘Menina Moça’, livraria-bar. Sim, é possível ler na ‘Rua Cor-de Rosa. Aquela idéia de que a rua do pavimento rosa é só barulho, música alta e prostituição, ficou no passado. Bom, pelo menos é o intuito de Cristiano Ovídio, ex-professor de Literatura Portuguesa e dono do ‘Menina Moça’. O bar é decorado com livros, máquinas de escrever e fotos antigas. O teto é uma obra de arte do ilustrador João Fazenda. Deixei lá uma frase do meu livro “Poesia Suja’, junto com frases de outros poetas, frequentadores do local. 

‘Pensão do Amor’. Por trás do nome singelo, se esconde um dos cabarés mais fantásticos que já vi. Nenhum local simboliza melhor o espírito da ‘Rua Cor-de Rosa’ que este. O charme vintage e a decoração fazem parte do ambiente. As paredes totalmente ilustradas com figuras de boêmios e prostitutas em tons vermelhos dão charme e calor ao lugar. A noite é animada por DJ´s e música ao vivo.

Amanhã vou voar para Paris; de lá vou de trem para Veneza, na Itália, onde vou conhecer e tomar umas cervejas no ‘Harry´s Bar’, na Calle Vallaresso; bar mencionado por Hemingway em seu livro “Na Outra Margem, entre as Árvores”.

Tim! Tim!

 

Vôo Lisboa - Paris -Sexta-feira, 14 de julho -1h30.

Essa, leitor, você não vai acreditar. Vai parecer uma das crônicas do Luiz Fernando Veríssimo, do livro "Traçando Paris". Mas não é. Aconteceu de verdade.

Na viagem para Paris, voei por uma companhia aérea que nunca tinha voado. E nem conhecia: "Ryanair".

A aeronave é até bonita. Grande, limpa, confortável. Transmitia segurança. Mas o que me impressionou foi o serviço de bordo. Ao contrário das outras companhias pelas quais já voei, está levou o mercantilismo ao extremo. 

Já na fila de embarque, eles, além de jogarem fora todos os meus frascos de desodorante, talco de pé e perfumes (só são permitidos embalagens de até 100ml), ainda tentaram me cobrar por uma mochila, só porque ela não cabia num bagulho que eles usam para medir o tamanho das bagagens. Dei o meu "jeitinho carioca" e consegui embarcar.

Apesar do preço da passagem - caríssimo - e diferente de outras companhias, eles não servem nem água. Café, nem pensar. Foram duas horas com sede e fome. Não consigo comer em casa pela manhã. Menos ainda antes de voar.

A companhia parece que proíbe a tripulação de fazer qualquer cortesia para os passageiros. Mas, cobrando, eles te oferecem tudo: uma Coca Cola, 5 € (R$30), um café frio 3€ (18R$), um sanduíche 10€ (R$60). Nem me atrevi a perguntar do que era feito o sanduba.

Depois de explicar os procedimentos de segurança, a tripulação começou a vender tudo o que tinha no avião. Mais um pouco e eles ofereciam "um motor novinho, com pouco uso".

Uma aeromoça que, pela aparência, nasceu antes de Santos Dumont inventar o avião, recolheu o carrinho com as bebidas e os alimentos (só um sujeito gordo sentado do meu lado, comprou alguma coisa) e começou a oferecer perfumes importados. 

Isto mesmo, perfumes!!! Me senti na 25 de Março, em São Paulo. 

Armani, Chanel, Cartier, Lancôme, Carolina Herrera, 212 Vip, Hugo Boss, Paco Rabanne, Jean Paul Gaultier, e outros.

Ela oferecia os perfumes importados por 30 €. E para forçar a venda, afirmava: "Lá fora é 150 €". Como se alguém fosse abrir a porta do avião - em pleno vôo - e sair pra comprar lá em baixo. Só faltou ela gritar, como os camelôs no trem: "Na minha mão é mais barato".

E quando eu achei que já tinha visto se tudo naquele vôo, outra aeromoça, uns 50 anos mais jovem que a primeira, apareceu no corredor, sorrindo, e, pasmem, vendendo loteria! Em francês. "Com apenas 2 euros você pode ficar milionário" - dizia ela. O prêmio era de 1 milhão de euros. 

Pensei: 'Ficar milionário nesse vôo é mole. Foda é conseguir um copo d'água.

 

O PIOR AEROPORTO DA EUROPA

Paris - Semana passada, escrevi aqui sobre a viagem atípica que fiz de  Lisboa à Paris, pela Ryanair. 

Se você, leitor, achou a companhia aérea ruim, espere para conhecer o Beauvais-Tillé,  aeroporto onde desembarcamos, em Paris, perto da cidade de Beauvais, na Picardia, norte da França.

É horrível.

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Reprodução - 

O site ‘Sleeping In Airports’ dedicou uma reportagem de um número recente à classificação dos melhores e piores aeroportos do mundo. Nela vimos confirmadas conclusões a que já tínhamos chegado por nossa conta, como a de que o pequeno e apertado aeroporto de Beauvais-Tillé, é o pior aeroporto da Europa.

As críticas do site  são inúmeras: pequeno, sujo, mal cuidado. O atendimento é inexistente. O terminal é apresentado pelas operadoras e agências de viagens como um aeroporto parisiense, no entanto, ele se encontra a mais de 80 km de Paris. 

A pesquisa da ‘Sleeping In Airports’, foi baseada nos seguintes fatores: conforto, poltronas confortáveis, commodities, wifi gratuito, restaurantes, sanitários, serviços aos clientes, eficácia e simpatia dos empregados.

No Beauvais-Tillé só operam as companhias aéreas low-cost, de baixo custo, e low rise como a Ryanair e a EasyJet.  São viagens curtas e baratas.  

Nosso desembarque foi  no meio da pista de pouso, a vários metros do prédio principal do aeroporto. Fazia uns 40 graus e não havia nenhum transporte para os passageiros se deslocarem até o terminal. 

Minha mochila pesava 12 quilos. Haviam passageiros com malas e mochilas mais pesadas ainda. O sol a pino queimava o corpo. A minha mania de usar  boné, mais uma vez salvou a minha pele. 

O calor infernal fez, até nós, turistas, sentirmos saudade do clima tipicamente parisiense. Cinzento, úmido e frio.

A fila, formada em plena pista, era enorme. E havia outra fila, ao lado da nossa, separadas por grades de ferro, com passageiros prontos para o embarque. Todos no sol. Enquanto a fila de embarque não deixou o prédio principal, nós não tivemos autorização de seguir. O jeito foi esperar ali mesmo, no sol. Esperamos uns 15 minutos.

Lá dentro, nenhum funcionário do aeroporto ou da companhia aérea recebia os passageiros para orientá-los. Três funcionários conversavam animadamente num canto, mas nenhum deles dava qualquer ajuda. Os franceses, assim como os italianos, se orgulham de sua língua e evitam falar outro idioma. Especialmente, o português. Tivemos que nos guiar pelas placas indicativas. Poucas, e em francês.

Não há guichês dentro do aeroporto para a compra de passagens do busão para Paris. O guichê da única empresa de ônibus que faz o trajeto, fica no pátio, lá fora. Só havia um guichê aberto, onde  uma senhora mal humorada vendia as passagens. No local, só havia um banco de três lugares para os passageiros sentarem e esperarem o ônibus. A espera durou cerca de 25 minutos. Os outros passageiros esperavam de pé, ou, como eu, liam o jornal, sentados no chão. Incluindo crianças e idosos.

A viagem até Paris demorou cerca de 1h40min. O ônibus até que era bom. Novo e limpo. O motorista, um senhor simpático, era cauteloso e dirigia bem. O ticket do ônibus - a opção mais econômica - custa 18 € (R$108), quase o preço da passagem de avião.

O aeroporto possui uma pequena estrutura. O desembarque é junto com um pequeno duty free para os voos internacionais, 3 lanchonetes, caixa eletrônico, banheiros e quiosques para alugar carros. E não permanece aberto 24 horas, funcionando apenas das 6:30 h às 23:30 h. Fecha para descanso dos moradores na área do aeroporto. 

O Beauvais-Tillé é considerado o sexto pior aeroporto do mundo. Fico imaginando como deve ser o ‘Islamabad Benazir Bhutto International Airport’, no Paquistão, o pior aeroporto do mundo.

Ediel Ribeiro (RJ)

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Ediel Ribeiro é carioca. Jornalista, cartunista e escritor. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) do romance "Sonhos são Azuis". É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG). Autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty" publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ) e Editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!". O autor mora atualmente no Rio de Janeiro, entre um bar e outro.

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