Coluna

POR QUE NOS APAIXONAMOS?

Responderia, rapidamente, porque gostamos, não sei por quê, tipo fazer coisas sem sentido.

Isso mesmo! Afinal, qual o sentido de se largar uma profissão, desfazer uma reunião importante, só porque não deixamos de pensar em alguém? Em uma segunda-feira, indo para o trabalho, para a escola, entrar no carro e ele estar com um perfume diferente, alguns fios de cabelo que ficaram trançados no estofamento, os guardamos com um certo desvelo, e sem pensar que, apenas, são fios de cabelos de alguém que amamos ou após um primeiro encontro bacana, coisa normal entre dois seres humanos.

Ou, então, a letra rapidamente rabiscada nas folhas do caderno, com o número de um telefone e sem nome, afinal, alguém se apresentou, disse quem era, coisas que dois seres humanos fazem ao querer se conhecer… melhor! Clichês!

Seres humanos que se atraem, coisa natural, faz parte.

PRAIA
Foto: Etienne Boulanger na Unsplash - 

E quando encontramos alguém que nunca vimos antes, alguém que fala coisas diferentes, de perto, encaixando com as nossas, não se sabe por quê, exatamente aquilo que queremos ouvir... Ou então, veja bem, o fruto de uma conquista, algumas vezes batalhada, num cerco invisível, envolvente ou alguém que nos foi apresentado, olhares  trocados, e tem um negócio de brilho diferente, um olhar mais aguçado que nos envolve, uma nuvem que baixa e parece que o mundo silencia, e somente as vozes de um de outro se ouvem... Vai se explicar, como?

E, então, são algumas horas no espelho, um banho mais demorado, a difícil escolha da roupa, a dúvida sobre o programa escolhido, se certo ou errado. Mas isso tudo dá muito trabalho, tempo, e depois a escolha de um presente adequado, quando se poderia estar em casa sozinho, lendo um bom livro, assistindo a um filme ou dormindo porque a noite está gelada, quente, sei lá, de qualquer jeito, mas a gente arruma um jeito de achar que o mundo está perfeito e funcionando a nosso favor, até mesmo que um aguaceiro caia lá fora não achamos que seja mau presságio, mas que o universo conspira ao nosso lado.

E é o trabalho de casa de prazo apertado, o chefe importunando porque o relatório saiu errado e o único consolo… o único consolo é ver no retrato você abraçado a alguém, que poucos dias, semanas atrás era um ser simplesmente desconhecido. Mas o retrato está lá, e o colega te cutuca e diz: Cê tá apaixonado, cara! Miga, quem é esse gato!

Pois é, vai lá você ficar com o olhar perdido, pensando no nada, enquanto o tempo passa, e quanta coisa importante você poderia fazer, e não achando grande coisa a nota baixa ou o trabalho que ficou uma porcaria, e você, ainda por cima, ou fica no telefone ou chega atrasado,

E o mundo fica cor-de-rosa, verde, abóbora - que coisa estranha ver coloridos onde não existe cor alguma -, é como uma droga que a gente toma e, de repente, parece que o mundo vai dar certo.

Fica, finalmente, a pergunta que não quer se calar: Por que ficamos apaixonados!

Porque é bom demais, mesmo que dure uma pouca eternidade.

Nilson Lattari

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Crônicas e Contos

NILSON LATTARI é carioca e atualmente morando em Juiz de Fora (MG). Escritor e blogueiro no site www.nilsonlattari.com.br, vencedor duas vezes do Prêmio UFF de Literatura (2011 e 2014) e Prêmio Darcy Ribeiro (Ribeirão Preto 2014). Finalista em livro de contos no Prêmio SESC de Literatura 2013 e em romance no Prêmio Rio de Literatura 2016. Menções honrosas em crônicas, contos e poesias. Foi operador financeiro, mas lidar com números não é o mesmo que lidar com palavras. "Ambos levam ao infinito, porém, em veículos diferentes. As palavras, no entanto, são as únicas que podem se valer da imaginação para um universo inexato e sem explicação".

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