Rio de Janeiro - Um dia – faz tempo isso –, andando por aí, fui bater no Boteco Salvação, um pé-sujo metido a besta que fica alí, na rua Henrique de Novaes, 55, em Botafogo.
Fui lá a convite do amigo Moacyr Luz. O Moa, como é conhecido pelos mais chegados, estava lançando o seu gostoso livro “Manual de Sobrevivência nos Butiquins Mais Vagabundos” (editora Senac Rio) e chamou um bocado de gente.
Estavam lá, além do Moa e seu fiel violão, os cartunistas Jaguar e Lan, Aldir Blanc, Paulão Sete Cordas, Noca da Portela, Tia Surica, Luiz Carlos da Vila, os atores Paulo César Peréio, Otávio Augusto, Antônio Pedro e mais uma penca de gente.
Só vi tanta gente famosa, assim, juntas, no lançamento do livro “Natureza Morta – e outros desenhos do Jornal do Brasil”, do cartunista Chico Caruso, em 1980, em Ipanema.
O livro do Moa, tem cento e poucas páginas, dá pra ler de um fôlego só. Além de tudo, é muito bom. Como mocotó de boteco, não dá vontade de largar.
Moacyr Luz é cantor, compositor, violonista e, agora, com esse seu primeiro livro, escritor dos bons. Escreve como fala, como ensinou o semanário “O Pasquim”, do amigo Jaguar. Moa diz que aprendeu a ouvir com Hélio Delmiro e a falar com Aldir Blanc.
Sobre a inspiração e a criatividade com que faz suas música, Moa disse o seguinte: “Acho que a manifestação criativa surge da maneira como você olha as coisas. Não é que você seja uma pessoa diferente, mas você observa as coisas diferente.”
E conta uma história: “Picasso fez um cavalo na pedra, maravilhoso, e um crítico: ‘Mas como é que você viu, como bolou esse cavalo nessa pedra?’ Não, já era um cavalo! O cavalo já existia ali. Só tirei o que não era cavalo!”
Com toda essa criatividade, o carioquíssimo Moa compôs mais de cem músicas que foram gravadas por artistas como Maria Bethânia, Nana Caymmi, Leny Andrade, Aldir Blanc, Martinho da Vila e Gilberto Gil, entre outros.
Depois de João Bosco, Moacyr Luz foi o parceiro mais constante de Aldir Blanc – genial compositor que o vírus levou, semana passada. Com ele, fez centenas de canções, como “Só Dói Quando Eu Rio” e o hino oficioso da Cidade Maravilhosa “Saudades da Guanabara” (Moacyr Luz, Aldir Blanc e Paulo César Pinheiro) e deixou algumas ainda inéditas, como a dolente “Palácio de Lágrimas”.
Mas, voltando ao livro que o Moa lançou, em 2005 – e autografou para mim com um conselho que eu nunca segui: “Ao Ediel, ande sóbrio, com um abraço do Moa” - é um manual prático e didático para os boêmios evitarem as ciladas dos botecos mais vagabundos da cidade.
O prefácio, servido como entrada pelo Martinho da Vila, já nos dá a idéia de como vai ser gostoso devorar aquele livro. Nele, algumas pérolas do compositor da Vila Isabel: “Botequim é um templo onde os solitários se sentem acompanhados com seus copos.” e “Nada melhor que a amizade de boteco porque os amigos não se visitam e nenhum pede para assinar fiança ou dinheiro emprestado. Só falam de mulher, futebol e política.”
Outra: “Amigos de bar, são como amantes recentes: um quer agradar o outro e não discordam nunca.”
Entre uma crônica e outra, leves e saborosas como jiló de boteco, Moacyr faz uma breve entrevista com os convidados amigos e boêmios célebres. São 10 perguntas para cada um, mas só uma comum a todos: Qual a sua receita para curar a ressaca?
Para mim, a mais original e hilária é a da Tia Surica, famosa sambista da Portela: “Tomo um copo de água gelada e prometo que nunca mais vou beber de novo”.
Pra fechar a tampa, o livro é ilustrado pelo Jaguar. São ilustrações originais que acrescentam ainda mais tempero aos textos, tornando o livro do Moacyr Luz ainda mais irresistível.
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