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CACASO - DENTRO DE MIM MORA UM ANJO

Rio de Janeiro - Neste Natal, aproveitei o sossego do sítio, em Xerém (RJ), para devorar  “Cacaso - Poesia Completa” (Companhia das Letras -456 págs.).

A coletânea da Cia. das Letras, sobre o poeta mineiro Antônio Carlos de Brito, conhecido como Cacaso, reúne seus seis livros publicados – de ‘A palavra Cerzida’, de 1967, a ‘Mar de Mineiro’, de 1982 –, além de vários poemas inéditos; uma amostra da breve incursão do poeta nos contos e letras de músicas que compôs com parceiros como Nelson Angelo, Francis Hime, Edu Lobo, Sueli Costa, Danilo Caymmi, Tom Jobim, e Toninho Horta, entre outros. 

livro cacaso
Divulgação - 

‘Poesia Completa’ traz ainda um caderno de imagens com reproduções dos diários de Cacaso e textos de Roberto Schwarz, Heloisa Buarque de Hollanda, Francisco Alvim, Vilma Arêas e Mariano Marovatto sobre o poeta que se definia como: “Exagerado em matéria de ironia e em matéria de matéria moderado”.

Mineiro de Uberaba, Cacaso morou um tempo no interior de São Paulo. Aos 11 anos, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde estudou filosofia. Nas décadas de 1960 e 1970, lecionou teoria da literatura e literatura brasileira na PUC-Rio. 

Colaborou regularmente em revistas e jornais, como ‘Movimento’ e ‘Opinião’, sempre defendendo e teorizando sobre o cenário poético dos seus contemporâneos, da chamada geração mimeógrafo. É um dos integrantes da antologia “26 poetas hoje”, organizada por Heloísa Buarque de Holanda.

Com verso coloquial, breve e divertido, o poeta aliou bom-humor, sagacidade e vasto repertório intelectual a sua obra. Cacaso foi um intelectual, no melhor sentido da palavra: professor, poeta, letrista, desenhista, crítico, ensaísta, agitador cultural e pensador, o mineiro foi um dos protagonistas da poesia marginal, período em que a postura arrojada, do “desbunde”, era um contraponto ao autoritarismo dos anos de chumbo. Foi um dos nomes essenciais da turma conhecida como ‘geração mimeógrafo’. 

Cacaso era contra regras estabelecidas e gostava de experimentalismos. Seu método de escrita era muito pessoal.  Era extremamente disciplinado e seguia uma metodologia de trabalho invejável. Tinha a mania de carregar pequenos cadernos de anotações onde fazia colagens, desenhava e escrevia poesia. Andava sempre com um deles na inseparável bolsa de couro a tiracolo. Tinha uns trinta cadernos com o material inédito,  produzido ao longo da vida. 

Agregador, Cacaso foi uma espécie de guru de muita gente. Tinha sacadas geniais, era observador, irreverente, debochado, mas doce, nunca agia com más intenções. 

Sem dúvida, Cacaso foi uma das vozes mais combativas e criativas daqueles anos de chumbo, dando visibilidade ao fenômeno poesia marginal, em que militavam poetas como Francisco Alvim, Ana Cristina Cesar, Chacal, Charles e Paulo Leminski, entre muitos outros. 

Nos anos 1970, Cacaso e outros poetas escreveram letras para canções da MPB, visando atingir um público maior do que o consumidor de literatura. Cacaso estava tão decidido  a ter seus poemas musicados e gravados que mandava a mesma letra para vários compositores. Isso, algumas vezes, deu confusão entre os parceiros, mas isso também divertia o irreverente e debochado Cacaso.     

Cacaso teve dois filhos. O jornalista Pedro Landim, do primeiro casamento, com a antropóloga Leilah Landim Assumpção e Paula Dias de Brito, de seu relacionamento com a cantora Rosa Emilia Dias, sua segunda mulher.                    

Cacaso morreu em 27 de dezembro de 1987, em plena 'abertura', dois anos antes das eleições diretas de 1989. À época, andava escrevendo artigos de notável originalidade para o ‘Jornal do Brasil’, a ‘Veja’ e a ‘Folha de São Paulo’.

O poeta sucumbiu a um infarto, sofrido no escritório de seu apartamento, na Avenida Atlântica, em frente ao Posto 3, em Copacabana. Tinha 43 anos.
 

Ediel Ribeiro (RJ)

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Ediel Ribeiro é carioca. Jornalista, cartunista e escritor. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) do romance "Sonhos são Azuis". É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG). Autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty" publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ) e Editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!". O autor mora atualmente no Rio de Janeiro, entre um bar e outro.

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