Coluna

AGNOTOLOGIA

O nome é estranho, O termo é de autoria do Prof. da Universidade de Stanford, Robert Proctor. E foi escolhido para o estudo da produção política e cultural da ignorância. Coisa legal, não é mesmo?

E no final o que vem a ser isto? Interessante, estudar a ignorância e seus valores. Sim, valores, porque se alguma coisa acontece alguém está ganhando com isso. E, com certeza, não são os ignorantes, mas aqueles que não ignoram a importância de algumas situações no mundo para tirar vantagem. E, no caso, dos ignorantes.

Os ignorantes têm duas facetas: a questão da agnosis, ou seja, não saber, desconhecer, porque simplesmente não tem como explicar, e a questão dos ignorantes, não no sentido de não saber ou desconhecer, que fazem disso uma forma de vida, de ser um ignorante, comportar-se como tal. Em resumo, o sujeito ignorante que ignora e o sujeito que é ignorante agem como e também ignoram o que o outro pensa. Nesse caso, o que se comporta como ignorante diz apenas que é direto no falar e no dizer. O que me lembra o fato de que excesso de franqueza é… ignorância ou, simplesmente, falta de educação.

BODE
Foto: Torsten Dederichs on Unsplash - 

Enfim, a ignorância hoje é uma maré alta que resolveu chegar na nossa praia e fazer a farofada que quiser na areia, pouco se importando se incomoda ou não. Perde a vergonha e se assume.

Eu diria que existe uma ignorância intelectualizada. Que é a ignorância do sujeito que pouco se importa com o que está nos livros, até porque não tem a menor ideia sobre qualquer assunto ou não quer perder seu tempo com leituras enfadonhas. A ignorância, simplesmente, tira do seu sovaco as suas reflexões sobre o mundo e ignora, solenemente, o que os outros pensam: são ignorantes demais para compreender a própria ignorância.

O problema da ignorância é a ostentação, é um prazer imenso de se mostrar um ignorante. E se contenta com outros ignorantes que o cercam e vivem em uma bolha que ignora o resto da humanidade. Todos estão errados, eles estão certos.

O ignorante não ignora o argumento, porque ele é o argumento em si mesmo. Porque acredita que a ignorância está no outro e não nele.

A ignorância, hoje, nada tem a ver com a burrice (que os burros, no caso, os animais, me perdoem e, por favor, ignorem). Porque a burrice é uma ignorância que tem conserto, basta colocar o conhecimento e o burro vai parar de ignorar. Talvez haja uma dificuldade de aprendizagem. Mas isso não faz do burro um ignorante. O burro consegue evoluir e deixar de ser burro.

O ignorante, pelo fato de ignorar, sabe, exatamente, o que está fazendo. O importante é marcar um ponto de vista e tudo que está à direita e, por que não, à esquerda não existe. É, solenemente, ignorado.

Antes camuflada, a ignorância mostra a sua cara e se espalha pelo mundo, ou melhor, aparece para o mundo. É uma guerra perdida, desleal e única, porque ao final de tudo todos perderão, inclusive os ignorantes. Mas, pela sua própria característica, ignoram isso. 
 

Nilson Lattari

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Crônicas e Contos

NILSON LATTARI é carioca e atualmente morando em Juiz de Fora (MG). Escritor e blogueiro no site www.nilsonlattari.com.br, vencedor duas vezes do Prêmio UFF de Literatura (2011 e 2014) e Prêmio Darcy Ribeiro (Ribeirão Preto 2014). Finalista em livro de contos no Prêmio SESC de Literatura 2013 e em romance no Prêmio Rio de Literatura 2016. Menções honrosas em crônicas, contos e poesias. Foi operador financeiro, mas lidar com números não é o mesmo que lidar com palavras. "Ambos levam ao infinito, porém, em veículos diferentes. As palavras, no entanto, são as únicas que podem se valer da imaginação para um universo inexato e sem explicação".

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