Coluna

Clã Bolsonaro e as milícias

- Marineth, o livro República das milícias, carregado com o subtítulo Dos esquadrões da morte à era Bolsonaro, chega às livrarias com impacto explosivo de bomba atômica. O livro é do jornalista e cientista político Bruno Paes Manso, também co-autor de A guerra: ascensão do PCC e o mundo do crime no Brasil, com Camila Dias Nunes. A direção da Editora Todavia afirma que “a publicação é mistura rara de reportagem de altíssima voltagem com olhar analítico e historiográfico que expõe de forma corajosa e pioneira uma face sombria da experiência nacional”. Portanto, aguardemos o efeito devastador do petardo no colo da milícia.

- Athaliba, infelizmente, o crime no Brasil, intenso e com variadas modalidades, é munição farta para produção de livros e filmes. Por exemplo, teu saudoso amigo e jornalista José Louzeiro, co-autor com ocê no livro biográfico da cantora Elza Soares, Cantando para não enlouquecer, tem várias publicações enfocando o submundo do crime: Pixote - A lei do mais forte; Aracelli, meu amor; Lúcio Flávio: o passageiro da agonia e Devotos do ódio, entre outros.

livro Republica das Milicias
O livro chega às livrarias como uma bomba que pode explodir no colo das milícias. 

- Bem lembrado, Marineth. Meu início no jornalismo se deu na transição da era romântica para o jornalismo indústria. A mordaça à cultura da ditadura empresarial-militar no Brasil, entre 1964-1985, favoreceu a formação dos oligopólios da comunicação. Donos da maioria dos meios de comunicação (entre os quais, jornais sensacionalistas) faturaram rios de dinheiro explorando crimes e o futebol. Assuntos permitidos, sem censura. Quando se diz que “o Brasil é o país do futebol”, esse famigerado título tem tudo a ver com aquele malfadado período.

- Athaliba, deixa essa questão em stand-by e me fale do livro República das milícias.

- Marineth, antes de tudo, o Bruno Manso, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP - Universidade de São Paulo -, merece nossos cumprimentos pelo ousado trabalho. No livro, Fabrício Queiroz, Adriano da Nóbrega e Ronnie Lessa (os três integraram a Polícia Militar) são descritos como protagonistas de uma forma violenta de gestão de território que tomou corpo nos últimos 20 anos e ganham um retrato por inteiro: as milícias. “Dos esquadrões da morte nos anos 1960 ao domínio do tráfico nos anos 1980-1990, dos porões da ditadura militar às máfias de caça-níquel, da ascensão do modelo de negócios miliciano ao assassinato de Marielle Franco, a publicação joga luz sobre uma face sombria da experiência nacional que passou ao centro do palco com a eleição de Jair Bolsonaro à presidência em 2018”, observa a direção da Todavia.

- Athaliba, esse livro pode fazer jus a campeão de venda no mercado literário?

Bruno Manso
Bruno Manso, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP - Universidade de São Paulo. 

- Quem sabe, Marineth. O livro revela “a ligação do clã Bolsonaro com a rede paramilitares e milicianos que se formava na Zona Oeste do RJ se estreitou, em 2002, com a eleição de Flávio Bolsonaro para a Assembléia Legislativa – ALERJ. O deputado, neófito no parlamento, pretendia se vender como o representante político e ideológico dos ‘guerreiros fardados’ que lutavam por espaço e poder nos territórios do RJ. Coube a Fabrício Queiroz o papel de articular a rede de apoio no mandato do deputado primogênito de Jair Bolsonaro. E Querioz seria fundamental para ajudar a fortalecer a base de votos do clã Bolsonaro nos quartéis da PM - Polícia Militar - para onde levou Flávio, em sua primeira campanha para pedir votos”.

- Athaliba, essa publicação é realmente bombástica, né?

- Sim, Marineth. No site da editora tem alguns comentários postados. Um deles sinaliza que “esta obra rouba a inocência à boa consciência nacional; ninguém mais poderá dizer que não sabia; a história da Nova República terá de ser contada de outro modo depois deste livro”. Outro diz que “com uma pesquisa primorosa, Bruno Manso nos revela como o crime organizado chegou ao poder Legislativo e Executivo, tornando o Brasil um dos países mais violentos do mundo”.

- Athaliba, o caldeirão da violência no Brasil está prestes a explodir, heim! O que sobrará?

- Impossível qualquer previsão, Marineth. Segundo o autor de República das milícias, “os Bolsonaros sempre foram os representantes ideológicos dos grupos milicianos. Eles podem não ter uma ligação direta com os grupos que fazem negócios em comunidades, mas sempre fizeram discursos favoráveis a eles”.

- Athaliba, centenas de comunidades são controladas por milícias e traficantes. Sobreviver nelas é uma grande aventura, tendo opção forçada de escolha entre traficantes e milicianos, na ausência do estado de direito. E, ao reler, “Navio negreiro”, poema de Castro Alves, como o poeta imploro: “Astros! Noites! Tempestades! Rolai das imensidades! Varrei os mares, tufão!”.

Lenin Novaes

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Crônicas do Athaliba

LENIN NOVAES jornalista e produtor cultural. É co-autor do livro Cantando para não enlouquecer, biografia da cantora Elza Soares, com José Louzeiro. Criou e promoveu o Concurso Nacional de Poesia para jornalistas, em homenagem ao poeta Carlos Drummond de Andrade. É um dos coordenadores do Festival de Choro do Rio, realizado pelo Museu da Imagem e do Som - MIS

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