“O que importa é que Samuel é uma das coisas mais vivas que alguém possa ter conhecido. Não era bom, nem mau, nem correto, nem incorreto, nem nada. Era uma maravilha, um cara que transformou o nome Samuel numa espécie de propriedade, que ninguém poderia pensar num cara chamado Samuel, que não fosse Samuel Wainer.” (Tarso de Castro)
Rio de Janeiro - Samuel Wainer foi um dos maiores jornalistas brasileiros de todos os tempos.
É difícil imaginar algum jornalista ou estudante de comunicação dos anos 80 e 90 que não tenha lido “Samuel Wainer - Minha Razão de Viver.”
Eu li.
Era fã do jornalista que, entre outras coisas, criou a “Diretrizes” a primeira revista política brasileira; o jornal “Última Hora", o mais moderno diário da época e foi o único jornalista brasileiro a cobrir o julgamento de Nuremberg.
Conheci Samuel em 1985, através de sua autobiografia. Devorei “Samuel Wainer - Minha Razão de Viver - Memórias de um repórter" (Editora Record) em dois dias. A biografia, ditada entre fevereiro e agosto de 1980 a Sérgio de Souza e Marta Góes; e organizada e editada pelo jornalista Augusto Nunes, lá pelos idos de 1985 , teve mais de uma dezena de edições.
A história apaixonante, perturbadora e instigante do jornalista me levou a ler tudo sobre ele. Li, de Danuza Leão, sua segunda mulher, “Quase Tudo” (Companhia das Letras) e “A Rotativa Parou! - Os Últimos Dias da Última Hora” (Editora Civilização Brasileira), do jornalista Benicio Medeiros.
Quando achei que já tinha lido tudo sobre o homem e o mito, eis que a Companhia das Letras lança “Samuel Wainer - O Homem Que Estava Lá”, uma fascinante biografia de Samuel Wainer escrita pela jornalista mineira Karla Monteiro.
Em “Samuel Wainer - Ele Estava Lá”, a jornalista mostra a construção da vida e mito do jornalista Samuel Wainer a partir de centenas de entrevistas que fez, e da leitura de pilhas de documentos, entre cartas, contratos, recortes de jornais, documentos dos arquivos públicos, e da audição das fitas que deram origem a autobiografia de Wainer.
Como os outros livros se baseiam mais na autobiografia do jornalista, “Ele Estava Lá”, permite uma melhor compreensão das dúvidas e do processo pelo qual Samuel se tornou o jornalista de três presidentes da República - Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek e João Goulart.
A biografia tem uma proposta clara: compreender a vida do jornalista Samuel Wainer levando em conta os conflitos do personagem na relação com políticos, jornalistas, donos de jornais e com seu tempo.
É isso que Karla Monteiro faz, mostrando um Samuel com suas grandezas e defeitos, ela reconstrói com riqueza de detalhes, cerca de meio século de história social, política e jornalística do país.
Por outro lado, Karla desconstrói, em parte, o mito criado pelo próprio Samuel em sua autobiografia. O livro da jornalista mineira mexe num vespeiro. Põe em dúvida a história contada por Samuel em sua biografia de que, em 1949, indo ao Sul para uma reportagem sobre o trigo, decidiu, de repente, descer na fazenda do ex-ditador Getúlio Vargas para entrevistá-lo. A jornalista conta que ao contrário do que dizia Wainer, a entrevista não aconteceu por acaso, mas combinada anteriormente pelo jornalista com Alzira, filha de Getúlio.
Mesmo que não caía em críticas moralistas à vida sexual de Samuel, a autora não foge à questão, e revela que Samuel foi traído por suas duas esposas. A fotógrafa Bluma Chafir traiu Samuel com Rubem Braga que à época trabalhava com ele na revista ”Diretrizes”. E Danusa Leão, sua segunda mulher, o traiu com o jornalista Antônio Maria, com quem foi viver.
A jornalista revela que Samuel, na verdade, não fundou a revista ‘Diretrizes’, e sim tomou de seu amigo Azevedo Amaral, registrando-a em seu próprio nome sem que Amaral se desse conta - por ser cego.
Karla desmonta ainda outra versão oficial de Wainer. A jornalista mostra que Wainer não nasceu no Brasil, e sim na Bessarábia (à época, parte do território Russo), fato que o jornalista negou até à sua morte.
A biografia escrita por Karla Marinho, mostra que Samuel Wainer - para o bem ou para o mal - realmente ‘estava lá’, e foi um importante jornalista e uma figura fundamental para nossa época.
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