Coluna

VENDE-SE BRASÍLIA

Rio de Janeiro - Acreditem, eu nem sabia que em Goiás tinha índio. Mas tinha.

Dizem, inclusive, que foram eles que venderam Brasília para Juscelino Kubitschek, em 1960.

Brasília que, na língua indígena, quer dizer, “Cadê o Meu?” era uma área de mata fechada quando o carro de JK furou o pneu numa estradinha de barro. JK e o arquiteto Oscar Niemeyer que, na época, era um jovem de 104 anos, tentavam chegar a Goiás.

Os nativos ajudaram a trocar o pneu. Enquanto aguardava, Juscelino, que era um bom negociante, acabou comprando a área onde ficava a aldeia dos índios por 200 contos e uns espelhinhos.

Desde que JK transferiu a Capital Federal do Rio de Janeiro para Brasília, o governo vem sofrendo duras críticas dos congressistas. Deputados e senadores já reclamaram da distância, da falta de esquinas, dos mosquitos e até da ausência de praias.

Depois da reunião de ministros, do dia 22 de abril, Paulo Guedes, mais conhecido como Posto Ipiranga resolveu, junto com o Banco do Brasil e a Petrobrás, vender, também, Brasília.

Arte - Nani

- Presidente, vamos vender Brasília e levar a Capital Federal de volta para o Rio de Janeiro.

- Vender Brasília? - questionou Bolsonaro - Zero! Zero de chance! Onde o pessoal do cercadinho vai protestar? Os cariocas não vão aturar essa gente.

- Dá pra gente ganhar um bom dinheirinho com isso aqui, presidente - disse o Posto Ipiranga. - E depois, o senhor vai trabalhar perto de casa.

- Concordo, Paulo Guedes - disse o ministro da “Deseducação”, Abraham Weintraub. - Isso aqui tá cheio de corruptos, vagabundos, a começar pelo STF. Tem que vender e mandar prender esses vagabundos!!

- Mas ministro, isso aqui é terra indígena. Pertencia aos povos indígenas. Não quero problemas com esses ambientalistas, a Greta, essas ONGS, taokey? Zero problemas com eles - disse o presidente.

- Odeio o povo indígena! Odeio o povo cigano! É tudo um bando de ignorantes! E ainda querem regime de cotas no Enem. Se ainda fosse índio americano! Eles ao menos aparecem na TV no cinema… Os nossos só fazem figuração no “Macunaíma”, aquele filme de comunistas.

- Se reclamarem manda prender todo mundo - gritou Damares, saltando da cadeira.

- Calma aí, Damares! Porra! Essa merda aqui é uma reunião ministerial, caralho! Por isso que eu não queria mulher no meu Ministério!

- Presidente, vamos aproveitar esse momento de tranquilidade que a imprensa só fala no Covid 19 e ir passando a “boiada” - bradou o ministro do Meio-Ambiente, Ricardo Salles.

- Que boiada, Salles? Com meus seguidores ninguém mexe! Nada de passar boiada. Zero!

- Eu não tô falando do gado do cercadinho, presidente. “Boiada” é um eufemismo.

- Bom, esse troço aí de “feminismo” é com a Damares - rosnou o Zero Um.

- Vamos aproveitar que o foco da mídia e da população está na Covid e mudar tudo de “baciada”. Vender tudo. Entregar tudo aos ruralista. Assim a gente evita críticas e processos na justiça.

- Mas vamos vender pra quem? - quis saber o presidente da Caixa Econômica, já de olho na grana da venda para repassar para a Bandeirantes.

- Para os índios  - sugeriu o ministro do Meio Ambiente.

- Onde nós vamos achar um índio? - quis saber Damares?

- Conheço um chefe indígena que trabalha como curandeiro lá no Ministério da Saúde - disse o ministro Teich.

Os descendentes dos índios nunca contaram direito como foi feita a venda. Sempre foi um segredo muito bem guardado. Mas o presidente foi lá conversar com ele.

- Chefe, soubemos que os seus ancestrais venderam a cidade de Brasília para o presidente Juscelino, é verdade?

O chefe disse:

- É verdade. Por uma ninharia. Fomos enganados por homem branco.

- Nós nos sentimos culpados e por isso estamos aqui para vendê-la de volta a vocês.

- Com tudo!?

- Tudo! Palácio do Planalto, Alvorada, a Granja do Torto, tudo.

- Os políticos vão com vocês, certo? - quis saber o chefe.

- Sim. Só fica a Damares.

- Querem fuder índio outra vez?

Ediel Ribeiro (RJ)

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Coluna do Ediel

Ediel Ribeiro é carioca. Jornalista, cartunista e escritor. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) do romance "Sonhos são Azuis". É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG). Autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty" publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ) e Editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!". O autor mora atualmente no Rio de Janeiro, entre um bar e outro.

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