Rio de Janeiro - O poeta Carlos Drummond de Andrade era um frequentador assíduo dos sebos da cidade.
Certa vez, em visita a um sebo, no centro do Rio de Janeiro, escreveu: “o sebo é a verdadeira democracia, para não dizer, uma igreja de todos os santos, inclusive os demônios, confraternizados e humildes. Saio deles com um pacote de novidades velhas e a sensação de que visitei, não um cemitério de palavras, mas o território livre do espírito, contra o qual não prevalecerá nenhuma forma de opressão”.
Os sebos, assim como as livrarias, estão acabando. Mas, acredite, leitor, ainda há sebos, no Rio de Janeiro, onde é possível encontrar verdadeiras relíquias.
Encontrei num sebo, na Rua da Carioca, ao lado da antiga redação do “O Pasquim”, dois exemplares da revista “Pif-Paf”, do Millôr Fernandes.
Os números 6 e 7. De 27 de julho e 13 de agosto de 1964, respectivamente.
No expediente, a revista se apresenta como uma publicação com um ponto de vista carioca, irreverente e crítica. “Não temos prós nem contras, nem sagrados nem profanos”, diz.
Nota da redação: Ainda não nos manifestamos sobre a prorrogação dos mandatos porque eles podem não prorrogar nossa liberdade.
Entre os colaboradores, a nata dos humoristas da época: Jaguar, Fortuna, Sérgio Porto, Claudius Ceccon, Ziraldo, Leon Eliachar, Vilmar e Emmanuel Vão Gôgo - pseudônimo de Millôr Fernandes -, entre outros.
A revista mantinha, na página 22, um concurso de humor que pagava ao melhor cartum, conto ou frase 500 contos. O concurso revelou grandes nomes como Redi que, no número 6, assina como Redinger, um elegante cartum.
Ainda na número 6, Jaguar apresenta os temas bíblicos. Na página 15, uma Eva com formas voluptuosas grita, “Adão!!” ao flagrar Adão beijando a serpente.
Na número 7, em um cartum do Fortuna, o astronauta chega a lua e grita para um habitante da terra: “Incrível! O lado desconhecido é igual o lado conhecido.
Ainda nesta edição, o pensamento vivo de Leon Eliachar. Alguns deles:
“O namoro é um passatempo a quatro mãos.”
“O cigarro não provoca o câncer. O câncer é que vive provocando o cigarro.”
“Algumas mulheres são contra o biquini. Elas sabem que o biquini também é contra elas.”
“No dia em que as mulheres aprenderem a sentar, lá se vai um dos mais belos espetáculos da terra.”
“Aniversário é essa comemoração que fazemos sempre com menos um ano de entusiasmo.”
“Urna é uma caixinha onde uma porção de gente coloca um papelzinho para fazer sorteio, e, às vezes, o azar é tanto que sai um presidente.”
“A mulher foi o que Deus conseguiu quando resolveu passar a limpo o primeiro homem.”
Até os anúncios eram engraçados. Como o do Banco Nacional de Minas Gerais, na número 7. Nele, um caçador está para ser queimado na fogueira por um canibal quando chega um funcionário do banco e diz, apresentando uma apólice de seguro: “Ele é cliente do ‘Banco Nacional’, nós pagamos o resgate dele, tá?”
A contra-capa, do cartunista Claudius Ceccon, é hilária. O domador, com um chicote, manda o leão saltar por dentro de um arco. Irritado, o animal salta e engole o domador, deixando só o arco de fora.
As revistas custavam Cr 200 (duzentos cruzeiros).
Hoje, não tem preço.
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