Rio - O ano era 1976.
Lembro como se fosse hoje, o dia em que abri uma revistinha de humor e “uma penca” de cartunistas, irônicos, ferozes e mordazes surgiram na minha frente.
Era o “Almanaque do Humordaz”.
A revistinha, uma espécie de “Pasquim Mineiro” foi presente dos cartunistas Aragão e Celim.
Conheci a dupla quando morei em Minas Gerais - no Salão de Humor de Juiz de Fora, de saudosa memória.
Os dois estavam lançando um livrinho que tinham acabado de publicar. Não lembro o título, só sei que na capa tinha um desenho dos dois, pelados, carregando uma espécie de lança. Acho.
O “Humordaz” era a seleção mineira do humor. Editada pelo Nilson, tinha em suas páginas Lor, Afo, Dirceu, Procópio, Clacchi, Ernandez e um jovem que começava a dar os primeiros passos no humor, chamado Aroeira.
Um dos mais geniais era Afonso Celso Duarte, o Afo.
Já conhecia Afo de suas tirinhas sobre futebol publicadas no caderno de Esporte do jornal “O Estado de Minas”, mas aqueles cartuns que traduziam a vida e os pormenores do cotidiano dos brasileiros sofridos, vítimas da fome e perseguidos pelo regime militar, com humor inteligente e ácido me impressionaram.
Não cheguei a trabalhar com Afo na imprensa de Minas. Quando ele chegou nos Diários Associados, em 84, eu já tinha voltado para o Rio de Janeiro, onde viria a trabalhar no jornal “Tribuna do Povo”.
Afo nasceu em Araguari, no Triângulo Mineiro, em 3 de agosto de 1942. Levava a sério o ofício de cartunista. Acordava cedo e antes de desenhar suas tiras lia dois ou três jornais em busca de inspiração. Em sua casa, no bairro Cidade Nova, região nordeste da capital mineira.
Seu primeiro emprego foi em “O Diário”, no fim da década de 60. Trabalhou também no “Diário de Minas”, “O Estado de Minas”, no jornal "Aqui" e no “Almanaque Humordaz”.
Sua primeira tira em jornal foi publicada no dia 27 de julho de 1984, às véspera de um Cruzeiro e Atlético. Nas três décadas seguinte publicou diária e religiosamente a tira que tratava do futebol mineiro, sobretudo do América, seu time de coração.
Atletas e até alguns dirigentes - como o ex-presidente do Atlético, Ziza Valadares eram colecionadores da obra do cartunista.
Para o editor de esportes do "Estado de Minas", Cláudio Arreguy, o chargista foi um craque no ofício: "O Afo dominava como poucos a arte de criticar sem ofender, sem partir para o lado pessoal. Ele conseguia provocar mais humor que irritação". No dia em que a tirinha não saía, o jornal recebia muitas ligações”, lembra.
Com a morte do chargista - em 26 de abril de 2014 -, ficam na lembrança, a ironia, a genialidade e a sutileza de sua obra.
"O traço era muito marcante. Ele coloria seus desenhos à mão, não se rendeu a colorir por computador. O que a gente via no jornal, era a arte dele. A mão do Afo", diz Son Salvador, seu colega de trabalho na página “Gandula”, do jornal “Aqui”.
Afo tinha 72 anos e lutava há mais de 10 contra a Hepatite C. contraída em transfusão de sangue, quando tratava de pneumonia no pulmão.
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