Felizes seriam aqueles que se casam apaixonados. Que podem planejar suas vidas futuras, com projetos de contos de fadas, de histórias de super-heróis, cada um casando e vivendo com o seu. Felizes seriam aqueles que sentem a falta um do outro. Felizes seriam aqueles que têm os mesmos gostos ou, se não os têm, apreciam o gostar do outro, simplesmente porque é o outro de quem se gosta.
Felizes seriam os amantes que se encontram nas ruas e trocam um beijo apaixonado, ignorando as pessoas que passam, indiferentes aos olhares invejosos, dos repúdios rancorosos, mascando no peito a mesma vontade de ter um amor assim, ou resgatá-lo de volta.
Felizes seriam os artistas, os famosos que trocam de par à medida que encontram um novo rosto, e se iluminam a cada vez, mostrando que a felicidade está aberta a todos, e basta escolher o novo produto, o novo acabamento, diriam alguns, expectadores crédulos.
Felizes seriam aqueles que saem de casa todos os dias para fazer o que gostam, para se divertirem em troca de um salário, de um ganho ao final do dia, ao final do mês. Que podem comprar o que quiser, na hora que bem entender, que podem ser caridosos, amigos do outro, de coração.
Felizes seriam aqueles que têm a boa saúde para dar e vender, que nascem com um belo rosto, uma cor de olhos indecifrável, o cabelo no lugar, o corpo perfeito, que podem se dedicar a ele em horas trabalhadas nas academias, que podem usar as melhores roupas, as mais inusitadas e permanecerem belos e elegantes.
Felizes seriam os poderosos que podem ditar regras, podem delegar outros poderes, ou podem ajudar os outros ou, sem o menor constrangimento, cobrar a dívida com outro favor, podem ser experts em alguma coisa, mesmo que essa alguma coisa implique na perda do outro; que podem dizer, à força de argumentos e com os exemplos da própria vida, que o mundo não é injusto, ele apenas pertence àqueles que trabalham duro. E depois disso tudo podem pousar a cabeça no travesseiro e dormir em paz.
Felizes seriam aqueles que passam pelo mundo e ignoram a existência do mundo à sua volta, que são bafejados pela sorte, que podem dizer que a justiça poderia ser assim e assado, que, com suas regras, e seus ditos moralizantes, podem, simplesmente, excluir os outros que atrapalham suas trajetórias, e, mesmo assim, são aplaudidos e festejados por seus pares, meros bajuladores do sucesso alheio.
Felizes, realmente, são aqueles que têm tudo isso, ou uma parte disso, e não esquecem, de verdade, todos os outros que não podem ter a sua mesma felicidade.
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