Coluna

A ESCRITORA E A DITADURA

Rio - Cassandra Rios, por sua importância na literatura, seu pioneirismo, ousadia e, principalmente, por sua temática homossexual, foi a mais lida e censurada escritora brasileira. 

Quando comecei a pesquisar e fazer entrevistas para escrever meu novo livro “Cassandra”, me deparei não apenas com uma escritora talentosa, mas também com uma grande mulher; nem sempre reconhecida ou compreendida. 

A escritora, foi alvo viva e depois de morta de preconceitos menores e censura ferrenha. 

Nascida, Odete Pérez Rios, no bairro de Perdizes, em São Paulo, aos 14 anos já escrevia crônicas para o jornal “O Tempo”. 

Em 1948, aos 16 anos, abandona as histórias pueris e com o pseudônimo de Cassandra Rios escreve seu primeiro romance, “Volúpia do Pecado” - a história de duas garotas que descobrem o amor homossexual - dando início a uma polêmica carreira de escritora.

Divulgação

O livro fez tanto sucesso que teve nove edições em dez anos. 

A partir daí, Cassandra enfrentou a ditadura de Getúlio Vargas - em 1952 - quando teve seu segundo livro, “Eudemônia”, proibido e tirado de circulação; e depois, a ditadura militar - a partir de 1968 - sendo rotulada pela imprensa de “A Escritora Maldita”. 

Bonita e namoradeira, Cassandra teve vários namorados, mas nunca demonstrou amor ou  encantamento por nenhum deles. Lésbica, Cassandra, aos 18 anos casou-se na igreja com Eugênio, um amigo homossexual. 

O casamento seguiu os ritos que mandava o estilo católico e burguês da época, entretanto, o enlace foi apenas para satisfazer aos pais, a sociedade tradicional e poder sair de casa para continuar escrevendo seus romances. 

Depois do casamento, mudou-se para a capital. Cassandra e Eugênio logo se desquitaram e ela foi morar sozinha num apartamento no centro de São Paulo, comprado com os direitos autorais de seus livros.

Lá, teve vários casos com mulheres da sociedade paulistana, famosas ou não. 

Escreveu mais de 50 livros. Destes, 36 foram censurados e muitos queimados. Só o livro “Eudemônia” , de 1976, sofreu 16 processos.

A escritora foi várias vezes levada ao DOPS paulista e em 1962, presa, mas nunca desistiu:  “A ditadura me persegue por eu ser lésbica, mulher e por vender muitos livros. Se o homem escreve, ele é sábio, experiente. Se a mulher escreve, é ninfomaníaca, tarada. A censura é machista e burra e não se conforma com uma mulher escrevendo explicitamente cenas de sexo entre mulheres, e com tiragens imensas de livros. Meus livros são explícitos, sempre foram, não escondo nada, seja em cenas de sexo hétero, como, principalmente, em cenas homossexuais femininas. Não sou pornográfica nem subversiva. A ditadura não admite uma mulher que aborda abertamente temas tabus. A sociedade brasileira é extremamente homofóbica, conservadora e machista.” - dizia, em suas entrevistas.

Cassandra foi a primeira escritora a viver exclusivamente das vendas de seus livros. Em 1970 chegou a vender um milhão de exemplares; mais do que Jorge Amado, Clarice Lispector e Érico Veríssimo, os maiores vendedores de livros da época.

Com os direitos autorais das publicações,  comprou carros, casas, apartamentos e até uma chácara em Embu das Artes, além da sua própria livraria onde vendia seus livros.

Com a perseguição sistemática dos militares e a censura a seus livros, Cassandra teve que se desfazer de seu patrimônio para sobreviver.

Em março de 2002, morreu sozinha (suas companhias eram seis gatos), de câncer, aos 65 anos de idade. 


*Ediel é jornalista e escritor

Ediel Ribeiro (RJ)

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Coluna do Ediel

Ediel Ribeiro é carioca. Jornalista, cartunista e escritor. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) do romance "Sonhos são Azuis". É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG). Autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty" publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ) e Editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!". O autor mora atualmente no Rio de Janeiro, entre um bar e outro.

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