- Marineth, no campus da universidade federal, em Alucard, quis saber de um professor quais os investimentos à instituição obtidos na viagem à China pela comitiva municipal àquele país liderada pelo prefeito Esponjinha. Ele, afinal, prometera conseguir recursos para diversificar a economia alucardeana, centrada há décadas na arrecadação proveniente da Yale na exploração de minério de ferro que destrói a cidade de cabo a rabo. Mais de uma dúzia de barragens com rejeitos de minério cercam a cidade.
- E quais os avanços conseguidos para a universidade, Athaliba, inclusive para os projetos do Parque Científico e Tecnológico e do Aeroporto de Carga objetivando alavancar Alucard?
- Ficou tudo, Marineth, na estaca zero; “tudo como antes no quartel d’Abrantes”. Esponjinha teve postura dúbia antes da viagem, ao considerar que “precisamos entender e estudar o funcionamento de uma possível parceria e, principalmente, analisar se é realmente interessante para o município”.
- Pô, Athaliba, brincadeira. Que fanfarrice do Esponjinha.
- Pois sim, Marineth. Ele, obviamente, não compreende que o socialismo salvou a China e que a levou a ocupar o lado oculto da lua, com a sonda Chang’e-4, conduzindo experimentos biológicos e instrumentos para analisar a geologia de uma região nunca explorada. Os cientistas afirmam que o lado escuro da lua não tem nada a ver com a “falta de luz”, pois os dois lados da lua experimentam o dia e a noite, sendo que a expressão “lado oculto” se refere ao lado da lua que nunca foi visto da terra.
- Excepcional façanha que pode beneficiar a humanidade, Athaliba.
- Muito bem, Marienth! Um astrônomo garante que essa foi a primeira vez que a China tentou algo que outras potências espaciais nunca tinham tentando antes. Ele diz que a sonda tá explorando um lugar chamado Von Kármán, uma cratera na Bacia de Polo Sul-Aitken. A cratera tem mais de 2,5 km de diâmetro e 13 km de profundidade, afirma um professor de física.
- Será, Athaliba, que essa cratera na lua se compara à cratera provocada pela exploração do minério de ferro do Pico Cauã, em Alucard, feito pela Yale?
- Não tem semelhança alguma, Marineth. O desaparecimento do Pico Cauã serviu à gula insaciável do capitalismo selvagem, causador das aberrantes diferenças sociais que condiciona milhões e milhões de pessoas a sobreviver abaixo da linha da pobreza, em extrema miséria. A China, por exemplo, com o sistema socialista, resgatou e deu dignidade a cerca de 800 milhões de chineses que estavam amargando a sobrevivência abaixo da linha da pobreza. Corresponde quatro vezes à população brasileira.
- Mas, Athaliba, como o Esponjinha explica a viagem à China?
- O Esponjinha nunca explicou claramente o resultado da viagem que fez no final do ano passado. A população que acredita na história de que o lobo mau queria comer a Chapeuzinho Vermelho se mantém impassível. Aliás, Marineth, a impressão é que a população está esperando a morte chegar com a possível explosão das mais de uma dúzia de barragens com milhões e milhões de m³ de rejeitos de minério de ferro que cerca Alucard pelos sete lados. Se elas explodir não tem como escapar.
- Sabe, Athaliba, já não duvido que o trem vá descarrilar antes da curva do ‘S’. A natureza, sem culpa alguma, pelo contrário, aplica a lei do retorno. De tanto ser arrombada pela exploração da mineração pela Yale, agora Alucard pode pagar com o seu desaparecimento do mapa. Divisa-se no horizonte pânico maior do que ocorre numa das cidades do Médio Piracicaba. A população está em polvorosa.
- Marineth, vamos deixar o Esponjinha entregue à população retrógrada de Alucard. Sobre a China, sempre me recordo de Deng Xiaoping. Trata-se de uma das mais importantes figuras da política no mundo, junto com Mao Tsé-tung, Chen Yun e Zhou Enlai. As ideias e ações dele foram fundamentais para a mudança radical da face da sociedade chinesa.
A imprensa burguesa mundial questionava a Reforma e Abertura do Partido Comunista da China e Deng Xiaoping, em 1979, num discurso, lembrava aos militantes do Partido e o conjunto do povo chinês que “as ideias que apregoam a superioridade do capitalismo sobre o socialismo devem ser eliminadas, pois somente o socialismo pode salvar a China”. E salvou.
- Estou convencida, Athaliba, que não tem caminho de volta à selvageria do capitalismo na China. O nosso país, tão rico em biodiversidade, maltratado, degradado por falta de um projeto político, bem que pode se espelhar no exemplo da República Popular da China. Seria uma beleeeeeeeeeeeeeeeeeza!!!
- É a alternativa mais viável e segura, Marineth. Mas, nada fácil. Deng Xiaoping dizia que “é necessário lembrar que desenvolver a democracia socialista não significa deixar de exercer a ditadura do proletariado. A ideia de que a luta de classes, entendida apenas como uma feroz luta entre burguesia e proletariado, que se reflete no Partido por existir neste uma burguesia infiltrada, também é rechaçada. Reconhece-se que também no socialismo existem contrarrevolucionários, agentes secretos a serviço do inimigo, delinquentes de todo tipo que se dedicam a sabotar a ordem socialista, assim como novos exploradores que se dedicam a todo tipo de atividades corruptas. Sob a concepção marxista-leninista, a luta de classes segue existindo no socialismo, porém de um modo diferente como existia na época das sociedades baseadas na exploração do homem pelo homem, pois a burguesia deixou de existir como classe, apesar de ainda existirem indivíduos que agem sob a influência da ideologia burguesa. A ditadura do proletariado deve, portanto, tratar de cuidar de todos aqueles elementos que lutam contra a construção do socialismo”.
- Muito bem, Athaliba. Enquanto a China habita, soberana, o lado oculto da lua, Alucard pode sucumbir na cratera do extinto Pico Cauã.
- Nas redes sociais, Marineth, circula o poema “Lira itabirana” do poeta Antônio Crispim, que foi publicado em 1984 no jornal O Cometa, e não consta de nenhuma antologia poética dele. Confira:
“O Rio? É doce.
A Vale? Amarga.
Aí, antes fosse
Mais leve a carga.
Entre estatais
E multinacionais,
Quantos aís!
A dívida interna.
A dívida externa.
A dívida eterna.
Quantas toneladas exportamos de ferro?
Quantas lágrimas disfarçamos sem berro?”
*Lenin Novaes, jornalista e produtor cultural. É co-autor do livro Cantando para não enlouquecer, biografia da cantora Elza Soares, com José Louzeiro. Criou e promoveu o concurso nacional Poesias de jornalistas, homenagem ao poeta Carlos Drummond de Andrade. É um dos coordenadores do Festival de Choro do Rio, realizado pelo Museu da Imagem e do Som – MIS.
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