Coluna

A CHUVA

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Existe algo mais democrático do que a chuva? Ou tão democrático quanto ela? Ela pode chegar de mansinho e derramar suas lágrimas igualmente. Ela pode chegar torrencialmente e afogar a todos, quer sejam ricos ou pobres, ela arrasta desde a mansão mais nobre ou o barraco mais pobre.

Quando alaga não interessa a ela se as coisas que destrói sejam decorações de palácios ou casas médias ou pobres.

A água se imiscui pelas reentrâncias e nenhum poder a impede. Ela não se deixa conduzir quando a sua índole, o seu fazer natural lhe domina, e a natureza vingativa retoma aquilo que lhe foi roubado, ou é festejada quando chega ao solo seco e despeja dos telhados uma alegria que é festejada pelas ruas, com as pessoas a se banharem.

A chuva se anuncia, algumas vezes é saudada ou bem-vinda, e, às vezes, é temida, é mal vinda, e não importa a origem dos olhares que a enxergam.

Ela se anuncia num repente como a chuva de verão que nos surpreende. Ou é antevista pelos relâmpagos e trovões a iluminarem o céu.

A chuva transborda os rios, alaga as ruas, enche os reservatórios, as represas, e se transforma em riqueza que traz a água que nos mata a sede ou a intempérie furiosa que arrasta na noite, sejam ricos, pobres, brancos ou negros, todos à procura de proteção.

Para os desertos é coisa rara, para as florestas abundância, pune com suas regras aqueles que desmatam, e abençoa aqueles que peregrinam nas areias, e valorizam a água como tesouro descoberto.

O aprendizado da chuva é enorme, nas plantas que agradecem, no solo seco que rejuvenesce, no viajante que enfrenta a mudança, porque depois da tempestade vem a bonança.

Quanta coisa nos traz a chuva, e, no entanto, são somente as nuvens a espremer o que lhes trouxe o sol. Quanta coisa nos traz a chuva e, no entanto, é apenas água que cai do céu.

Nilson Lattari

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Crônicas e Contos

NILSON LATTARI é carioca e atualmente morando em Juiz de Fora (MG). Escritor e blogueiro no site www.nilsonlattari.com.br, vencedor duas vezes do Prêmio UFF de Literatura (2011 e 2014) e Prêmio Darcy Ribeiro (Ribeirão Preto 2014). Finalista em livro de contos no Prêmio SESC de Literatura 2013 e em romance no Prêmio Rio de Literatura 2016. Menções honrosas em crônicas, contos e poesias. Foi operador financeiro, mas lidar com números não é o mesmo que lidar com palavras. "Ambos levam ao infinito, porém, em veículos diferentes. As palavras, no entanto, são as únicas que podem se valer da imaginação para um universo inexato e sem explicação".

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