Coluna

Tabu do nº 24 conexo a gay

- Athaliba, o ano 2024 mal deu sinal de vida à longa trajetória de 365 dias, composta por 12 meses, e pode ser alvo de chacotas. O final da dezena da milhar da numeração atiça gozações. Na Praça Acrísio Alvarenga, em Itabira, Minas Gerais, as gêmeas lésbicas Ivonete e Francinete lembraram casos bizarros do nº 24, associado com gays. Na roda do bate-papo estava a travesti Shelby e as transexuais Mary Help e Gina. E, antecipadamente, todos (as) declararam os votos ao vencedor da edição nº 24 do Big Brother Brasil para um dos participantes que seja gay.

- A torcida tem sentido, Marineth, no contexto do estigma do nº 24. O besteirol reality show, que invadirá os lares pela TV, de janeiro a abril, já teve vencedor gay: o professor Jean Wyllys, na 5ª edição. Ele ganhou da Grazi Massafera, no final, ao botar a boca no trombone dizendo que os demais participantes não gostavam dele por ser gay. O programa já contou com dezenas de gays e de mulher trans, a Ariadna Arantes. Ela deixou os telespectadores ansiosos na expectativa de vê-la nua na piscina. Prometeu e não cumpriu. Foi eliminada do programa na 9ª semana.

- Pois é, Athaliba. Inclusive, a promessa da Ariadna de nadar nua levou Gina a segui-la, na perspectiva de comparar a cirurgia de redesignação sexual que fizera com a dela. Estima-se que o país, de acordo com o Banco Mundial, tenha cerca de quatro milhões de pessoas transgêneras ou não binárias. Mas, o que quero dizer é que o estigma do nº 24 associado ao gay está ligado ao jogo-do-bicho. Nessa contravenção, o nº 24 é veado, na relação geral de bichos que totalizam 25 animais. E tudo isso por culpa do Barão de Drummond.

- Como assim, Marineth?

- Athaliba, não é tanto a culpa do Barão de Drummond. Ele, João Batista Viana Drummond, mineiro de Nova Era, nascido 1º de maio (mesmo dia que ocê) de 1825 e falecido 7/8 de 1897, foi dono do Jardim Zoológico. E inventou jogo, alistando animais em ordem alfabética, do nº 1 ao nº 25, para arrecadar recursos financeiros para cobrir despesas do negócio. Assim, o jogo consta de avestruz, águia, burro, borboleta, cachorro, cabra, carneiro, camelo, cobra, coelho, cavalo, elefante, galo, gato, jacaré, leão, macaco, porco, pavão, peru, touro, tigre, urso, veado e vaca.

- E, aí, Marineth, a jogatina explorada pelo Barão de Drummond, latifundiário e senhor de escravos, foi apropriada por oportunistas que se tornaram gangster. Os gangsters se meteram na política e na maior manifestação cultural do país: o samba. O jogo-do-bicho está proibido desde 1941. E desde 2014 se discute no Senado o projeto de lei nº 186 que dispõe sobre a exploração de jogos de azar, incluindo o jogo do bicho.

A seleção do Brasil teve 24 atletas na Copa América. No entanto, Douglas Luiz usou a camisa nº 25, por preconceito à camisa de nº 24. Foto Alberto Valdés - EFE

- Não vamos entrar no mérito da história dos crimes do jogo-do-bicho, Athaliba. Vamos nos limitar à referência do nº 24 na relação de bichos daquela jogatina. Ocê sabia que na seleção brasileira de futebol masculino não existe a camisa de nº 24? O nº das camisas pula do 23 para o 25. Em 2021, o juiz Ricardo Cyfer, da 10ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro - TJ-RJ - deu prazo para a Confederação Brasileira de Futebol - CBF - se explicar sobre o fato.

- E a CBF se explicou, Marineth?

- Athaliba, na Copa América, a seleção brasileira foi a única das 10 equipes a não usar a camisa com o nº 24, apesar de ter 24 atletas inscritos. E aí o Grupo Arco Íris de Cidadania LGBT entrou com ação na Justiça contra a CBF. Na ação, o grupo afirma que “o fato da numeração da seleção pular o nº 24, considerando a conotação histórica cultural que envolve o número conexo aos gays, deve ser entendido como clara ofensa a comunidade LGBTQIA+ e como uma atitude homofóbica”.

- E de que maneira, Marineth, o juiz se posicionou?

- Ele, Athaliba, entre outros aspectos, escreveu que a luta da comunidade LGBTQIA+ pelo fim da discriminação, com o reconhecimento do seu direito a uma convivência plena na sociedade é “amplamente conhecida”.

- Como foi o desfecho do bate-papo com as lésbicas Ivonete e Francinete e as transexuais Mary Help e Gina, além da travesti Shelby?

- Athaliba, ao grupo se juntou a sexóloga Dagmar. Ela é considerada orientadora daquela turma. Disse que, na numerologia, o nº 24 é de família, amor e relacionamentos. Por fim, o grupo, no 1º de janeiro, no pedestal do monumento à Bíblia, na conhecida “praça redonda”, onde sempre se reúne, gritou sonoro viva 2024. O grito ainda ecoa por toda Itabira do Mato Dentro.

Lenin Novaes

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Crônicas do Athaliba

LENIN NOVAES jornalista e produtor cultural. É co-autor do livro Cantando para não enlouquecer, biografia da cantora Elza Soares, com José Louzeiro. Criou e promoveu o Concurso Nacional de Poesia para jornalistas, em homenagem ao poeta Carlos Drummond de Andrade. É um dos coordenadores do Festival de Choro do Rio, realizado pelo Museu da Imagem e do Som - MIS

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