Coluna

PATERSON

Rio de Janeiro - Confesso que tinha enormes dúvidas sobre ‘Paterson’, o último filme de Jim Jarmusch - diretor de ‘Estranhos no Paraíso’ e ‘Flores Partidas’ - nome consagrado no meio independente e cult dos Estados Unidos. 

O filme me impressionou. É um tanto melancólico, mas bem feito.

O longa narra o dia a dia de Paterson - o protagonista vivido por Adam Driver - um pacato motorista de ônibus que gosta de escrever poesias, mas sem a pretensão de ser um grande poeta, na cidade de Paterson, Nova Jersey. Sua poesia é inspirada em sua própria vivência: o relacionamento com a namorada, os fragmentos das histórias que ouve dos passageiros durante as viagens e até sua marca de fósforo preferida.

REPRODUÇÃO - 

Paterson leva uma vida pacata e feliz com a namorada Laura (Golshifteh Farahani) e com o seu cão Marvin. Laura é uma jovem talentosa que tem pretensões artísticas, culinárias e até musicais. Já Marvin, está sempre à espera do dono, que o leva até um passeio no bar do Doc, todas as noites.

A pacata cidade de Nova Jersey, onde nasceram os poetas Allen Ginsberg, William Carlos Williams e o comediante Lou Costello, serve de pano de fundo para entrarmos na rotina de uma semana do casal. O filme começa em uma segunda-feira e vai até a segunda seguinte.

O bar do Doc ( vivido pelo excelente Barry Shabaka Henley) é onde se reúnem os moradores de Paterson. O barman Doc se orgulha da cidade e de seus moradores famosos. Os fatos marcantes são assinalados em recortes de jornal nas paredes do bar. 

A poesia do personagem Paterson - na verdade, versos do poeta americano Ron Padgett, escritos originalmente para o filme - serve para dar beleza a um ambiente completamente ordinário. Jarmusch insere o trabalho autoral de Padgett de forma bem inteligente, jogando as letras da poesia na tela.

O problema é que todo o restante da vida do jovem não tem nada de especial. Paterson tem um  comportamento introspectivo e leva uma vida banal, fazendo as mesmas coisas todos os dias: levanta sempre à mesma hora; come sempre o mesmo cereal; faz sempre o mesmo caminho, a pé, até a garagem de ônibus onde trabalha e, à noite, frequenta o bar do Doc. 

Enquanto ele vê sua poesia apenas como um hobby, Laura acredita que sua arte deve ser compartilhada com o mundo, pois vê no marido um talento genuíno.

Jarmusch trabalha a rotina do protagonista de forma tão sutil e talentosa que consegue transformar a vida monótona de Paterson em poesia. O roteiro é muito bem trabalhado e joga contra as expectativas do espectador. Quando o espectador espera uma virada, ele repete uma situação inúmeras vezes, sem ser prosaico. 

Os diálogos e o roteiro escrito por Jim Jarmusch, são recheado pelos versos criados pelo poeta Ron Padgett e que o diretor caprichosamente apresenta ao público não só pela voz de Adam Driver, mas também pelos versos dos  poemas escritos na tela.

Mais conhecido pelo papel de Kylo Ren em ‘Star Wars - O Despertar da Força’, Adam Driver comprova mais uma vez o talento dramático visto em ‘Girls’ e no indie ‘Corações Famintos’. 

O roteiro e os diálogos escritos por Jim Jarmusch, criam um personagem preso numa rotina sem fim, obrigado a viver sempre o mesmo dia, mas, ainda assim, encantador.  

Ediel Ribeiro (RJ)

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Coluna do Ediel

Ediel Ribeiro é carioca. Jornalista, cartunista e escritor. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) do romance "Sonhos são Azuis". É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG). Autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty" publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ) e Editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!". O autor mora atualmente no Rio de Janeiro, entre um bar e outro.

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