Coluna

A POLONESA

Li, na coluna do jornalista Ancelmo Gois, na quarta-feira passada, no jornal ‘O Globo’, que ‘A Polonesa’, um boteco classudo de Copacabana, fecharia as portas neste final de semana.

Fechou. 

O bar, que ficava ali na Hilário de Gouveia, 116, em Copacabana, é mais um restaurante do Rio que não resistiu aos efeitos da pandemia.

Jaguar, listou,  na  nostálgica crônica ‘Bares de Saudosa Memória’ e em seu livro ‘Confesso que bebi’, dezenas de bares que fecharam há uns 30 anos atrás. De lá pra cá, muitos outros bares fecharam. Piorou com a pandemia.

a POLONESA
Divulgação - 

Conheci ‘A Polonesa’ no final dos anos 80, quando eu editava um jornalzinho de humor chamado ‘Cartoon’. Liguei para o veterano jornalista Tony Martinelli, que trabalhou na extinta revista ‘Manchete’, para convidá-lo para trabalhar no ‘Cartoon’. Ele morava em Copacabana, e marcou nosso encontro n´A Polonesa.

De cara, não gostei muito do boteco. Espremido entre dois edifícios, na Hilário, a entrada parecia mais a entrada de serviço de um dos prédios. Pra mim, acostumado com botecos enfumaçados e o ir e vir dos garçons, carregando bandejas cheias de tulipas de chope, estranhei o desfile de garçons carregando doces, flans e sorvetes. Parecia uma doceria. 

Mas, a casa não era famosa só por suas fantásticas sobremesas, como  a torta de maça (tort jablecznik) e o suflê de chocolate (suflet czekoladowy), que se tornou um ícone para os cariocas.

O ambiente era colorido, limpo e ideal para conversar e relaxar. No cardápio, além dos raviolis de queijo ou de carne, o chef sugeria o lombinho de porco servido com repolho roxo ou almôndegas, feitas com trigo sarraceno. O chope da casa (bom), era honesto e bem tirado. Voltamos outras vezes. 

Nós chamávamos - escondido do dono, ‘seu Piotr’ - o boteco de ‘O Polaco”. ‘Polaca’, nos anos 30, foi o epíteto dado pelos comunistas à Constituição Brasileira do Estado Novo, de Getúlio Vargas, em 1937. O Estado Novo foi um período autoritário da nossa história, que durou de 1937 a 1945. Foi instaurado por um golpe de Estado que possibilitou a Vargas fechar o Congresso Nacional e instituir uma nova Constituição  autoritária, baseada na carta constitucional fascista da Polônia que, por isso, ficou conhecida como “polaca”.  

A casa foi inaugurada em fevereiro de 1948, pelo polonês, Piotr Pastusiak; que trabalhou na embaixada polonesa no Rio de Janeiro, como cozinheiro, e também comandava a cozinha do 'Polaco'.

Após a morte de Piotr, ‘A  Polonesa’ passou a ter a cozinha comandada por sua mulher, Josefa Pastusiak, que manteve a qualidade e a originalidade do cardápio. 

Desde então, a direção ficou a cargo do filho do casal, Paulo Pastusiak. O clima do restaurante, que ocupava o térreo de um prédio antigo, te transportava para a Polônia: teto de madeira, mapas  da Polônia, quadros com atrações turísticas e culturais, a bandeira polonesa e toda uma decoração bem polish.

Por suas mesas passaram clientes ilustres como Lech Wałęsa, um dos fundadores do sindicato Solidarność (Solidariedade) e ex-presidente da Polônia e Karol Józef Wojtyla - o papa João Paulo II - que degustou a famosa sopa de beterraba (barszcz) e a torta de maça (tort jablecznik) do restaurante que já ganhou vários prêmios de gastronomia. 

Depois de servir iguarias da Polônia e Europa Oriental por 73 anos, na zona sul do Rio,  ‘A Polonesa’ fechou as portas, deixando a Polônia mais distante ainda do Brasil.

Ediel Ribeiro (RJ)

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Coluna do Ediel

Ediel Ribeiro é carioca. Jornalista, cartunista e escritor. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) do romance "Sonhos são Azuis". É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG). Autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty" publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ) e Editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!". O autor mora atualmente no Rio de Janeiro, entre um bar e outro.

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