- Athaliba, após muito pesquisar sobre o que te presentear no aniversário, dia 1º de maio, escolhi Enciclopédia Negra, magnífica publicação da Companhia das Letras, com Afra Joaquina Vieira Muniz na capa. O trabalho de relevante pesquisa tem assinatura de Lilia Schwarcz e Flávio dos Santos Gomes, historiadores; e Jaime Lauriano, artista plástico. A obra reúne centenas de biografias de políticos, escritores, cientistas, revolucionários, intelectuais, religiosos, músicos, esportistas e mães que lutaram pela alforria da família. Escravos e descendentes. Pessoas cujas feições foram apagadas pela história, mas que reinventaram outras Áfricas no Brasil.
- Marineth, antecipadamente, o meu muito obrigado. Amiga do peito e muto mais.
- Athaliba, inicialmente, por ocê constantemente esbravejar que está “matando cachorro a grito”, em forçada abstinência sexual causada pela intermitente pandemia do COVID-19, pensei em te regalar “com una muñeca inflable”. Desisti por motivos óbvios. É que o plástico é derivado do petróleo e, usado em excesso, causa dano à saúde. Sabe como é, né?
- Marineth, habla sério!
- Athaliba, não se irrite, por favor. Es una broma. Mas, falando sério, um detalhe fantástico da publicação é o belíssimo caderno de retratos inspirados pelos verbetes que foram ilustrados por 36 artistas negros. Os autores da Enciclopédia Negra passam em revista a história do Brasil, da colonização aos dias atuais, a fim de restabelecer o protagonismo negro. E fazem alcançando o que há de singular, multifacetado e profundo na existência particular de mais de quinhentos e cinquenta personagens.
- Maravilha, Marineth. Não vejo a hora de mergulhar de cabeça nesse livro para alargar os meus horizontes, enriquecendo as minhas poucas décadas de existência. Desejo que me passe a publicação antes mesmo de apagar as velinhas no bolo, tá?
- Athaliba, a publicação tem na abertura Abdias Nascimento e, com chave-de-ouro, termina focalizando Zumbi. Abdias, que completa 10 anos de morto dia 23/5, foi escritor, poeta, professor universitário, ator, político e ativista dos direitos civis e humanos das populações negra do país. Fundou o Teatro Experimental do Negro, o Museu de Arte Negra e o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros, além de idealizar o Memorial Zumbi. Foi deputado federal e senador da República; e um dos criadores do Dia Nacional da Consciência Negra. Morreu aos 97 anos.
- Marineth, ele foi professor emérito na Universidade Estadual de Nova Iorque, em Buffalo, durante o seu exílio da ditadura empresarial-militar (1964-1985) no Brasil. Foi, ainda, professor do Departamento de Línguas e Literaturas Africanas da Universidade de Ifé, em Ifé, na Nigéria.
- Isso mesmo, Athaliba. E sobre Zumbi, ele foi um guerreiro do Quilombo dos Palmares, de reconhecida liderança, coragem e de muito conhecimento de estratégias de luta. É considerado um dos maiores símbolos da luta pela liberdade dos negros na história brasileira. Teve a mulher, Dandara, lutando ao lado dele. Morto em 20 de novembro de 1695, aos 40 anos, pelo capitão Furtado de Mendonça - premiado com 50 mil réis pela execução - a data de sua morte foi adotada como o Dia Nacional da Consciência Negra.
- Marineth, pode revelar outros personagens da Enciclopédia Negra?
- Vou citar apenas mais dois, Athaliba, matando sua curiosidade. No mais, ocê conhecerá na leitura do livro. Tem o rei que foi escravizado - Chico Rei - e conseguiu comprar sua liberdade e a do filho. Eles sobreviveram no trajeto do Congo ao Brasil, tendo outros integrantes da família – a rainha Djalô e a filha, a princesa Itulo – jogados ao mar pelos traficantes de escravos do navio negreiro “Madalena”. Chico Rei - tinha o nome Galanga - viveu em Vila Rica, em Minas Gerias, e trabalhou numa mina, tornando-se proprietário depois. Comprou a alforria de muitos compatriotas. Outro personagem é Marielle Franco, vereadora assassinada a tiros há três anos, junto com seu motorista Anderson Gomes, no Rio de Janeiro. Quem mandou matá-la e por quê?
- Bem, Marineth, então aguardo o regalo.
- Athaliba, ocê vai gostar. A co-autora Lilia Schwarcz diz que o objetivo do livro é de “dar alma e rosto a esses heróis cotidianos que foram silenciados e apagados pela história”. E que a obra “é parte do ativismo negro para recontar de maneira mais plural a chamada história universal, que é muito colonial, muito branca e muito masculina”. As mulheres formam maioria na publicação, sabe. Feliz aniversário e muitos anos de vida, combativo e fraterno amigo. Saúde!
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