Coluna

Vitrine do bumbum estilhaçada

Campeã do Miss Bumbum World, a modelo Suzy Cortez diz faturar R4 1 milhão ao mês em ensaio fotográfico de nú explícito. Foto Divulgação
Campeã do Miss Bumbum World, a modelo Suzy Cortez diz faturar R4 1 milhão ao mês em ensaio fotográfico de nú explícito. (Foto: Divulgação)

- Athaliba, a atriz Paolla Oliveira recorreu à mídia para desabafar sobre o fato do bumbum dela, até os dias atuais, ser mais admirado do que o seu desempenho cênico numa minissérie da TV Globo. Na série televisiva, ela aparece de costas, nua, numa varanda, com o bumbum em primeiro plano. Realmente é uma cena instigante que invejou muitas mulheres e aguçou o desejo ardente dos homens, fazendo referência à falsa ideia de que a bunda é “preferência nacional”.

- Marineth, há controvérsia quanto à ideia falsa da bunda ser ou não “preferência nacional”. Veja, por exemplo, o que se constata nos ensaios fotográficos que alguns jornais publicam com frequência. Entre 10 fotos, colocadas para visualização em clique sequencial, a grande maioria tá com foco central no bumbum, explorado em vários ângulos. Subentende-se que a “identidade da mulher” tá no tamanho e formato do bumbum. E os comentários ficam tipo assim: “esse bumbum é de fulana; mas é muito parecido com o da beltrana ou, então, igualzinho ao da sicrana”.

- Athaliba, a atriz argumentou que “a gente pensa em tantas outras camadas que aquela personagem tem e aí vira uma cena de bunda”. E arrematou dizendo que “a gente não pode deixar que esse tipo de coisa diminua o nosso trabalho”. No pé da matéria no jornal, uma leitora fez a seguinte observação: “Então prá que uma cena daquela? Totalmente desnecessária. Ou porque não mostrar de outro ângulo. Ficou óbvio que o objetivo era mostrar a bunda na cena em questão”.

O clipe do funk Bola, Rebola alcançou milhares de visualizações com Anitta saracutiando o bumbum em minúsculo biquini de fio dental. Foto Divulgação
O clipe do funk Bola, Rebola alcançou milhares de visualizações com Anitta saracutiando o bumbum em minúsculo biquini de fio dental. (Foto: Divulgação)

- Marineth, o bumbum, exposto em alto relevo, será sempre admirado e desejado, adverso das demais “camadas” às quais a atriz insinua. Cabe registrar que o nosso saudoso poeta Carlos Drummond de Andrade não se furtou em apreciar essa admirável particularidade feminina e a fez sobressair liricamente no poema “A bunda, que engraçada”, no livro O amor natural:

“A bunda, que engraçada.
Está sempre sorrindo, nunca é trágica.
Não lhe importa o que vai pela frente do corpo.
A bunda basta-se.
Existe algo mais? Talvez os seios.
Ora – murmura a bunda – esses garotos ainda lhes falta muito que estudar.
A bunda são duas luas gêmeas em rotundo meneio.
Anda por si na cadência mimosa,
No milagre de ser duas em uma, plenamente.
A bunda se diverte por conta própria.
E ama. Na cama agita-se.
Montanhas avolumam-se, descem.
Ondas batendo numa praia infinita.
Lá vai sorrindo a bunda.
Vai feliz na carícia de ser e balançar.
Esferas harmoniosas sobre o caos.
A bunda é a bunda, redunda.

- Athaliba, aí é demais. Mas, saiba que a bunda nem sempre é vista como principal atrativo na mulher. E aqueles que têm foco obsessivo em bunda são tidos como neuróticos. O bumbum não é tudo na mulher. Tem mulheres que se assustam quando alguns homens torcem o pescoço ao passar por elas e fixam o olhar na bunda. Se sentem penetradas, invadidas nas suas partes íntimas. Os olhos, seios e até os pés também encantam os homens. São fontes de desejos. Bem diz a minha amiga Berenice: “Não é a bunda que garante ‘selo’ de qualidade da mulher: é preciso conhecer e saber a potencialidade do corpo. Ou seja: é preciso ter malícia e habilidade com o corpo, no seu manuseio geral, no melhor dos sentidos”

- Marineth, a observação da Berenice é interessante. Creio que é primordial à mulher saber da capacidade e limitação do corpo. Assim, portanto, não se sentirá aviltada e, nem tampouco, superfêmea. Mas, a ostentação do bumbum, sem limites, ainda vai virar tese de doutorado.

- É por aí, Athaliba. Acontece que a exposição do bumbum de maneira mundana deixou de ter a leveza sensual como, por exemplo, descreveu Drummond. Tem artistas exagerando nas coreografias nos megashows. Na dança do “quadradinho de oito”, então, o bumbum é a própria coreografia. O bumbum já tem até competição internacional, como o evento Miss Bumbum World, que deu título de campeã à brasileira Suzy Cortez. Ela diz faturar R$ 1 milhão/mês com ensaios de nu explícito. Outra brasileira, a cearense Sheyla Mell, conquistou o Miss Bumbum México. E a funkeira Anitta teve milhares de visualizações e curtidas após lançar o clipe “Bola, rebola”.

- Marineth, será que o vereador Reginaldo das Mercês, da Câmara de Itabira, atochou as mãos na bunda da servidora desatinado pela exibição exagerada, como se a vitrine do bumbum estivesse estilhaçada? O saudoso Gonzaguinha diz na música “É” que “a gente não está com a bunda exposta na janela prá passar a mão nela”.

- Athaliba, o edil Reginaldo foi advertido pela Comissão de Ética e Decoro Parlamentar por abuso contra a servidora. Em contrapartida dedurou o presidente da Câmara de Vereadores, o Heraldo Noronha, de praticar “rachadinha”. O parlamento na cidade berço do poeta Drummond tá de ponta-cabeça, como nunca visto. Aproveito para reverenciar e fechar com Gonzaguinha essa questão do bumbum: “a gente não está com a bunda exposta na janela prá passar a mão nela”. E mesmo que a vitrine  do bumbum esteja estilhaçada. Só pode apalpar o bumbum com permissão.

- Muito bem, Marineth. Só eu sei que não és retrógrada, conservadora. Compreendo-a na atitude intransigente na defesa e preservação dessa parte da tão sublime, altiva, briosa da mulher que é uma beleeeeeeeeeeeeeeeza. Mas, o trem é doido. A apologia à bunda já é interplanetária. E haja silicone à cultura do bumbum. No mais, deixo à apreciação o poema “Receita de mulher”, de Vinícius de Moraes, no link: https://www.youtube.com/watch?v=yupYEDH06po. Ele diz que “as muito feias que me perdoem, mas beleza é fundamental”, fazendo referência ao bumbum. E aí?

Lenin Novaes

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Crônicas do Athaliba

LENIN NOVAES jornalista e produtor cultural. É co-autor do livro Cantando para não enlouquecer, biografia da cantora Elza Soares, com José Louzeiro. Criou e promoveu o Concurso Nacional de Poesia para jornalistas, em homenagem ao poeta Carlos Drummond de Andrade. É um dos coordenadores do Festival de Choro do Rio, realizado pelo Museu da Imagem e do Som - MIS

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