Coluna

DESMENTINDO O PRESIDENTE

Rio - Se tem um órgão do Governo Federal que trabalha - e muito - é o Departamento de Recuos e Desmentidos. 

Ligado à Secretaria de Comunicação - SECOM, ele funciona numa salinha nos fundos do Palácio do Planalto, sob o comando do secretário especial Fábio Wajngarten.

Todo mundo sabe que uma das funções mais importantes no governo, hoje em dia, é a de desmentir as histórias do capitão, de sua prole e de seus colaboradores.

O governo de Jair Bolsonaro já mudou de idéia ou recuou de decisões que estavam tomadas ou anunciadas, tantas vezes que o setor de comunicação do governo está em pânico.

Os recuos e desmentidos, quase diários, estão atrapalhando os trabalhos do Departamento de Recuos e Desmentidos.

Os trabalhos estão se acumulando e os poucos funcionários não tem dado conta da demanda.

O secretário Wajngarten, foi falar com o presidente:

- Presidente, eu sei que o país está atravessando uma grave crise financeira. Sei que as coisas estão tão ruins que o senhor vai cortar até a merenda das escolas públicas…

- Cortar, não! Contingenciar - cortou o presidente. 

- Claro. Mas, o Departamento de Recuos e Desmentidos está precisando de mais verba, de mais pessoal e de uma sala maior. Os desmentidos do seu governo já formam pilhas até o teto. Se não forem dadas melhores condições de trabalho teremos que fechar o departamento.

- Fechar o departamento? E quem vai desmentir as minhas declarações? Sem os desmentidos o governo pode parar. A imprensa e os partidos de oposição ficam esperando pelos desmentidos.

- Entendo, mas nós estamos sobrecarregados de serviços, presidente. Além dos seus desmentidos, ainda temos que desmentir o Zero Um , o Zero Dois, o Zero Três e até aquele economista que o senhor botou no Ministério da Educação. 

- Eu tive que empregá-lo. Foi recomendado pelo Olavo de Carvalho, e depois, o anterior nem falava português.

- Os desmentidos, recuos e gafes não são exclusivos do seu gabinete. Além dele, ainda temos que desmentir que a Ministra Damares Alves tenha visto Jesus na goiabeira, que tenha dito que a princesa Elsa, do filme Frozen, é lésbica; que o Patrick, amigo do Bob Esponja é gay; e que a Branca de Neve seria uma prostituta, só porque dorme com sete anões. É muito trabalho.

Arte: Nani

Na verdade, o Departamento de Recuos e Desmentidos é mais antigo que o governo Bolsonaro.

Alguns recuos vem desde antes do presidente assumir oficialmente a Presidência. Ainda na campanha para a presidência, Bolsonaro disse que seu governo teria de 15 a 17 ministérios. Em janeiro, porém, recuou e assumiu o poder com 22 ministérios.

Em sua primeira lista de ministros, listou 27 homens. Criticado pela ausência de mulheres, voltou atrás e incluiu 4 mulheres, dias depois.

O então ministro da Educação, Ricardo Vélez, disse que pretendia retirar o termo "golpe militar" dos livros escolares. Criticado pelos próprios militares, ele voltou atrás.

Poucos dias depois de dizer que não desligaria o ministro da Educação, Ricardo Vélez, voltou atrás e demitiu o ministro.

Bolsonaro tentou intervir nos preços do diesel da Petrobras, mas, desautorizado por Paulo Guedes, voltou atrás de sua decisão.

Depois de dizer que não aumentaria os gastos com publicidade no seu governo, voltou atrás e só na Rede Record, do Bispo Edir Macedo os investimentos em publicidade subiram 659%, só no primeiro trimestre do ano.

O presidente se reuniu  com os partidos da base aliada onde anunciou que o governo iria rever o bloqueio de recursos no orçamento do MEC. A informação, porém, foi desmentida logo em seguida pela Casa Civil.

O presidente coçou a cabeça e ordenou ao secretário:

- Convoque a imprensa. Eu vou anunciar o fechamento do Departamento de Recuos e Desmentidos. 

- O senhor vai fechar o departamento!?

- Claro que não! Depois você divulga um desmentido.

Ediel Ribeiro (RJ)

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Coluna do Ediel

Ediel Ribeiro é carioca. Jornalista, cartunista e escritor. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) do romance "Sonhos são Azuis". É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG). Autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty" publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ) e Editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!". O autor mora atualmente no Rio de Janeiro, entre um bar e outro.

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