A presença do ciberespaço na vida das pessoas trouxe a própria perspectiva de um alcance ilimitado, um espaço onde as intimidades ganham asas de liberdade. A fofoca toma ares de globalização, com o extremo de se fofocar sobre si mesmo.
Ao contrário do custoso processo de comunicação do ser humano pré web, o futuro trouxe facilidades. Foi a oportunidade de cada um de nós sair da atitude passiva de assistente para personagens atuantes na vida real, ou virtual. Munidos de arsenais tecnológicos, a vida dos habitantes do novo espaço tomou ares de aqui e agora. Como os dois gumes de uma faca, o ser humano deixa de ser prisioneiro do dono das mídias, e passa a ser ele mesmo uma mídia em potencial.
A par disso, o ser humano sendo um ser vivo solitário, não só luta pela sobrevivência, mas luta pela busca do sentido do próprio ser, o sentido da vida e essas coisas, e ele procura outros pares para que possa, enfim, trocar confidências, pensamentos e encontros. Hoje o solitário tem a oportunidade de falar, dizer o que pensa, enfim, ser curtido e compartilhado.
Não é de longe que lembramos dos diários secretos da juventude onde as mulheres, principalmente, registravam seu diálogo com a descoberta do mundo que se abria cheio de incompreensões, dúvidas sobre o futuro e dos relacionamentos amorosos.
A famosa epígrafe, “Meu querido diário”, dizia bem mais do que uma frase simpática e reveladora da inocência de quem escrevia, mas dava o sentido de uma bem guardada caixa de Pandora, onde, se aberta, poderia levar o escrevinhador e seus pensamentos ver, com vergonha, seus fantasmas serem postos em evidência.
Novelas, romances, filmes e toda a sorte de histórias começavam ou começam, terminavam ou terminam, serviam de desvendamento de tramas através dos escritos em diários ditos íntimos.
O ciberespaço se espalhando como febre, principalmente entre os jovens, colocou em xeque o escrever para si mesmo, transformando aquilo que era de um só em um segredo de muitos. O grande diferencial é que essa revelação é feita de uma forma não íntima e espontânea, segredo de um só, mas na ênfase de que todos os fantasmas dentro das consciências ganhem vida e alcem voo pelo espaço infinito do computador, para se tornar público. A distância geográfica, temporal, ideológica deixa de existir. O ser humano parte para um enfrentamento direto com os seus. Expõe a comida que come, a casa onde mora, o ambiente que frequenta, os amigos que tem, intimidades...
Enquanto em outros tempos a necessidade do segredo era o principal mote para a guarda dos pensamentos dentro das páginas de um caderno, esse segredo precisa e gosta de ser revelado.
O segredo perdeu o sentido, ganhou asas. A revelação se torna o grande motivo para que as pessoas possam se sentir próximas. Passam a ter amigos, mesmo que nunca se tenham visto pessoalmente. Os casais também passaram a ser construídos pelo par procurado em qualquer lugar, desde que esteja na web.
A solidão mudou de nome? A revelação é um motivo de desabafo ou uma forma de agressão ao mundo em que vivemos?
O ser humano continuou a ser solitário. Talvez a grande diferença seja que ele publica essa solidão. Há uma necessidade de respostas, os pensamentos tomam forma e além de publicar os pensamentos, as pessoas se aproximam de seus iguais, organizam suas tribos. E desabafam porque descobrem pares em todo mundo. A vergonha toma o lugar da honra em ser aquilo que o inconsciente teimava em esconder. Os escondidos encontram eco nas suas aspirações, tanto na identidade sexual, política, religiosa etc.
A necessidade de “curtir” existe, não importa aquilo que se esteja curtindo. E se coloca no “curtir” a própria vida pessoal. Mostra-me o que curtes e te direi quem és.
As pessoas se revelam e gostam de se revelar porque isso faz parte do sentido que querem dar à vida. O espaço é infinito, e não só de adolescentes ele é habitado, mas também de adultos, revelando o quanto o ser humano precisa de companhia, e quanto o ser humano pode se sentir tão só, apesar de habitar um infinito de possibilidades, preso ao pequeno quadrado da tela do computador.
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