Coluna

A queda do mito é iminente

A dificuldade para acertar o uso correto da máscara contra o COVID é a mesma dificuldade verificada cotidianamente no exercício da administração do pais. (Carolina Antunes/PR)

- Athaliba, com a poeira assentada, após a explosão do escândalo de roupa suja lavada na TV pelo ex-juiz Sérgio Moro, que se demitiu do cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública, e o mito pés de barro, que ocupa o trono da Presidência da República do Brasil, um experiente político me revelou tática de infiltração, no Palácio do Planalto, orquestrada com a finalidade de ampliar o alcance dos anzóis para fisgar corruptos, milicianos e narcotraficantes.

- Marineth, como assim? Estou boiando nas nuvens. Por favor, explique a estratégia.

- Athaliba, o esquema ardiloso foi conjecturado pela turma da República de Curitiba que apurava crimes da Lava-jato. Um deles sacou que, no abstrato tabuleiro do jogo político brasileiro, o mito pés de barro, contrariando todos os vícios do processo eleitoral vigente, venceria a eleição presidencial. E, aí, propôs ao líder da turma que ele teria que ir para o sacrifício, infiltrando-se no núcleo do poder do Palácio do Planalto, se fosse convidado.

- Marineth, tá querendo parafusar meus miolos?

- Que nada, Athaliba. O autor da proposta decidiu colocar em prática a experiência vivida na ditadura civil militar (1964-1985), quando integrava movimento para destituir sindicalista pelego na direção de sindicato de periodistas. A manobra levou à “implantação” de Belisário na chapa do tal pelego, que concorria à reeleição e venceu, no jogo de cartas marcadas. Durante a gestão, o infiltrado municiava seus companheiros com informações valiosas para a execução do golpe final, dois anos depois. Foi longo o tempo de espera, mas, valeu a pena. Tiro e queda.

- Marineth, como foi o desfecho?

- Athaliba, na eleição seguinte, início dos anos 1980, o sindicalista pelego e reacionário foi derrotado fragorosamente nas urnas, com o processo eleitoral ainda fiscalizado de forma indevida e arbitrária por representantes do Ministério do Trabalho, resquício da ditadura militar. 

- Marineth, o trem pegou o sujeito de jeito na curva do ‘S’, abarrotado, em seus 90 vagões, com toneladas de minério de ferro, em tráfego ininterrupto em Itabira, além das alterosas, em MG, cidade de nascimento do saudoso poeta Carlos Drummond de Andrade. Mas, como se aplicou no Palácio do Planalto essa armadilha política que derrubou do trono o sindicalista pelego?

- Athaliba, por falar em Itabira do Mato Dentro, a cidade é chamada, no círculo operário e por boa parcela da população, de “prostituta da exploração da mineração”. A herança que a empresa exploradora deixará à cidade, com o fim da extração do minério, que teve sua identidade maior, o Pico do Cauê, destruída, são mais de uma dúzia de barragens abarrotadas com milhões de m³ de rejeitos de minério de ferro. E a destruição do meio ambiente em todos os aspectos.

- Marineth, lá na frente avaliaremos o caos em Itabira. Como o infiltrado atuou no Planalto?

- Athaliba, o mito pés de barro já era fã de carteirinha da turma da Lava-jato, antes mesmo de ter sido eleito, devido às prisões de empresários e de políticos adversários, incluindo até o ex-presidente Lula, condenados por corrupção. E não perdeu a oportunidade de convidar o símbolo nacional do combate à corrupção para fazer parte do seu ministério.

- Marineth, o mito pés de barro foi eleito sem sequer apresentar programa de governo e gritava aos ventos que não faria conchavos à moda antiga, ou seja, na forma do “toma lá, dá cá”.

- Pois é, Athaliba. A turma da República de Curitiba analisou a proposta e concluiu que, no seio do reinado do mito pés de barro, poderia ampliar os tentáculos para pegar mais corruptos e delinquentes de diversas modalidades criminosas. O esquema vinha funcionando, às vezes com leves turbulências, até que degringolou de vez, culminando com lavagem de roupa suja na TV. O infiltrado chutou o pau da barraca. Ocê imagina que não deve ser nada fácil conviver com o mito pés de barro. Ele só não é indigesto para os abutres ao seu redor.

- Marineth, se Freud analisasse, no divã, o mito pés de barro, ele endoidaria. Mas, então, a estratégia do infiltrado da República de Curitiba, no Palácio do Planalto, fracassou, né?

- Athaliba, como as desavenças ficaram intensas entre o mito pés de barro e o infiltrado, o plano B foi acionado. O propósito foi levar o mito à desestabilização total. Aí, ele mordeu a isca, meteu os pés pelas mãos e o caso abstrato agora está nas malhas do Supremo Tribunal Federal - STF. Analistas políticos ousam afirmar que a queda do mito pés de barro é iminente.

- É, Marineth, o mito acabou cavando a própria sepultura. O que não dá prá prognosticar é quando a retroescavadeira cobrirá a cova com pá de cal. Só o tempo dirá, solidária e fiel amiga!

Lenin Novaes

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Crônicas do Athaliba

LENIN NOVAES jornalista e produtor cultural. É co-autor do livro Cantando para não enlouquecer, biografia da cantora Elza Soares, com José Louzeiro. Criou e promoveu o Concurso Nacional de Poesia para jornalistas, em homenagem ao poeta Carlos Drummond de Andrade. É um dos coordenadores do Festival de Choro do Rio, realizado pelo Museu da Imagem e do Som - MIS

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