Coluna

QUEM ANVISA, AMIGO É

Se tem um órgão do Governo Federal que trabalha - e muito - é o Departamento de Recuos e Desmentidos (DRD).

Ligado à Secretaria de Comunicação Institucional, antiga Secretaria de Comunicação - SECOM - o DRD funciona numa salinha nos fundos do Palácio do Planalto, ao lado do gabinete do ódio, sob o comando do secretário especial, Flávio Augusto Viana Rocha. 

Todo mundo sabe que uma das funções mais importantes no governo, hoje em dia, é a de recuar e desmentir as histórias do capitão e de sua prole.

Reprodução / Montagem -  

No entanto, se o presidente ficar adulterando fatos, desmentindo e fraudando todo tipo de informação, daqui a pouco ninguém mais vai acreditar nas suas declarações.

Sabemos que a guerra das vacinas exigiu do presidente Jair Bolsonaro algumas decisões difíceis, mas nenhuma tem sido mais angustiosa do que a de tentar proibir as crianças de se vacinarem.

Quando o ministro Marcelo Queiroga e o secretário de Comunicação Flávio Augusto entraram no escritório do presidente, encontraram Jair Bolsonaro cochilando, com a 'Folha de São Paulo' nas mãos.

Queiroga por um momento deve ter pensado como deve ser difícil e solitária a vida de um Presidente da República e como são grandes os riscos que ele tem que correr todos os dias, em suas decisões.

- Presidente! - sussurrou o ministro, cutucando o braço do presidente.

- Ãh! Ãh!... Tava aqui concentrado nessa ‘cuestão’ aí do Barra Torres. Viu a carta do presidente da Anvisa veiculada na TV?

- Vi. Tá em todos os jornais, também. Olha só: “Presidente da Anvisa rebate acusações levianas de Bolsonaro”; "Bolsonaro afronta a verdade e desrespeita técnicos da Anvisa e o luto de milhares de brasileiros"; "Sociedade Brasileira de Imunizações repudia ataque de Bolsonaro a Anvisa e à vacinação de crianças" - disse Queiroga, mostrando ao presidente as manchetes dos jornais.

- Temos que rebater essa ‘cuestão’ daí, taokey? Vamos desmentir o presidente da Anvisa. Quero que o Ministério da Saúde, junto com o DRD, solte uma nota desmentindo que eu tenha acusado os profissionais da Anvisa de corrupção.

- Mas, presidente, suas declarações estão no noticiário. O senhor minimizou o número de mortes de crianças pela Covid e colocou em dúvida a honestidade dos profissionais da Agência Nacional de Vigilância Sanitária por terem aprovado a vacinação infantil. O senhor precisa parar de acusar as pessoas e as instituições, sem provas, e, ao levar uma resposta, recuar, fingir-se ofendido e se desmentir, isso tá pegando muito mal para o senhor e para o seu governo - disse o secretário.

- O que eu disse foi que "fiquei sabendo" e que "ouvi dizer". Eu não tenho nada com isso daí. Estão querendo colocar palavras na minha boca. Isso daí são coisas que me dizem nas praias, no cercadinho, no stand de tiro. Até o pastor Malafaia chamou a vacinação de crianças de infanticídio.

- Já estão me chamando de ‘Queirodes’ e ao senhor de ‘Bolsonero’. Estamos virando motivo de chacota, presidente - disse o ministro.

- É comum a gente ver agências criando dificuldades para vender facilidades. Eu não quero acusar a Anvisa de absolutamente nada, mas, que tem alguma coisa acontecendo, isso não há a menor dúvida que tem.

- É melhor o senhor pedir desculpas ao presidente da Anvisa e afirmar que não é contra a vacinação infantil. Que vai comprar as vacinas e vacinar todas as crianças de 5 a 11 anos. Até sua filha. Não vejo outra coisa que possamos fazer, presidente.

- Bom, já que eles não ouviram meus conselhos, não vejo outra alternativa que não seja mentir. De novo!

Ediel Ribeiro (RJ)

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Coluna do Ediel

Ediel Ribeiro é carioca. Jornalista, cartunista e escritor. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) do romance "Sonhos são Azuis". É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG). Autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty" publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ) e Editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!". O autor mora atualmente no Rio de Janeiro, entre um bar e outro.

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