Cultura e Entretenimento

Academia Brasileira de Letras incorpora Gilberto Gil

“Vê, por aquela janela
Entre a sola e o salto do sapato alto dela
Vê, por ali, pelo vão
Entre a sola, o salto do sapato alto dela e o chão
Vê como existe um abrigo
Entre a sola e o salto do sapato alto
Contra o perigo, do orgulho, da ilusão
Basta um centímetro prum' grande coração
No espaço ali embaixo
Entre a sola e o salto existe a imensidão”

A música “Entre a sola e o salto” dá a exata dimensão da genialidade poética e musical de Gilberto Gil. É um dos artistas mais criativos da nossa música popular, com talento incomparável e incontestável. Recordo o que atestou o saudoso maestro Moacir Santos - multi-instrumentista, compositor e arranjador - em defesa do artista baiano quando foi alvo de críticas na criação do tropicalismo: “Gilberto Gil é inigualável, com estilo único, próprio”.

Hoje, tantos anos passados da época de assessor de imprensa da gravadora Copacabana, me regozijo com a decisão da Academia Brasileira de Letras - ABL - incorporar Gilberto Gil. Pois, afinal, percebo que a observação negativa de um dos donos daquela indústria fonográfica de que “o trabalho desse artista baiano é um uma porcaria” empeçonhou a ele mesmo. A obra magnífica e plural de Gilberto Gil, com certeza, é uma fonte inesgotável de prazer à população e patrimônio da nossa cultura popular.

Gilberto Gil
A ABL incorporou Gilberto Gil, o novo 'imortal mortal' como ele se definiu. Reprodução -

Como Gilberto Gil afirma na música “Aquele abraço”, pouco antes de ser solto da prisão para o exílio forçado, na ditadura empresarial-militar (1964-1985), “meu caminho pela mundo/Eu mesmo traço/A Bahia já me deu/Régua e compasso/Quem sabe de mim sou eu/Aquele abraço/Prá você que me esqueceu/Aquele abraço”.

A ABL o incorporou. Seja estimado (a) leitor (a) d’O Folha de Minas qual for a concepção da palavra incorporar que queira congregar. O ex-ministro da Cultura - é oportuno lembrar que ele pediu exoneração do cargo no governo Lula para cuidar da carreira artística - recebeu 21 dos 34 votos para a vacância da cadeira de número 20, que era ocupada por Murilo Melo Filho, falecido em maio do ano passado. O poeta Salgado Maranhão e o escritor Ricardo Daunt eram concorrentes com Gilberto Gil.

Ao falar do novo “imortal” da ABL, o presidente da instituição, Marco Lucchesi expressou uma metáfora do saudoso antropólogo, historiador, sociólogo, escritor e político Darcy Ribeiro, mineiro de Montes Claros (1922-1997), que “o pássaro da cultura tinha duas asas; uma delas era erudita e a outra popular. Para que o pássaro possa voar mais longe ele precisa das duas asas. Certamente Gilberto Gil é esse traço de união entre a cultura erudita e popular”.

Vida longa para o novo acadêmico da ABL e, sem esmiuçar a conhecida e consagrada trajetória artística dele, afinada e comprometida com os anseios do povo brasileiro, sugiro um tour por suas músicas, como “Refazenda”, “Drão”, “Se eu quiser falar com Deus”, “Cálice”, “Domingo no parque”, “A linha e o linho”, “A luz e a escuridão”, “Extra”, “De Bob Dylan a Bob Marley”, “Filhos de Gandhi”, “Esotérico”, “Logunedé”, “Louvação”, “Meio-de-campo”, “O eterno deus Mu dança”, “Oração pela libertação da África do Sul” e outras dezenas mais.

Para minha alegria, satisfação e orgulho de pai, revelo que meu filho caçula, Pablo Milheiro Novaes, ainda criança, dizia admirar as músicas de Gilberto Gil.

Oh, sorte!

Lembrando o saudoso amigo Wilson das Neves.

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