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BAR JOIA, UMA PÉROLA CARIOCA

Rio de Janeiro - Jaguar, no seu livro “De Bar em Bar, Confesso que Bebi”, relata que um botequim deve ser, de preferência, razoavelmente limpo. “Mas não a ponto da gente pensar que está bebendo numa enfermaria. Ninguém morre de infecção contraída em bar. E quantos já morreram de infecção hospitalar?” - escreveu.

Um dia, Jaguar levou o Nássara — genial caricaturista e compositor, além de grande boêmio — para conhecer a filial do Bar Luiz, num shopping da Barra. O bar era chic, mas tinha alguma coisa errada.

— Limpo demais — sentenciou Nássara.

Escondido na esquina da Rua da Conceição com a Rua Júlia Lopes, no Centro do Rio, tem um boteco assim: o Bar do Jóia. Nem sujo, nem limpo demais. Porém, honesto.

Foto: Roberto Netto / Divulgação -  

O bar tem 115 anos de tradição. Inaugurado, como Café e Bar Rio Paiva, em 1909, por  João Nunes, um português que gostava de música clássica;  a partir da década de 80, quando Joaquim Nunes, filho do seu João, assumiu o comando do bar, passou a se chamar ‘Bar do Seu Jóia’ (apelido do Joaquim), ‘Bar do Jóia’ e, finalmente, ‘Joia’, sem o acento.

O boteco, uma pérola carioca, foi cenário do filme “Chocante” de Johnny Araújo, com Bruno Mazzeo, Lúcio Mauro Filho, Bruno Garcia e Marcus Majella. No filme, o bar é um dos pontos de encontro de uma banda de sucesso dos anos 90 que se reencontra 20 anos depois.

Ontem, voltei ao bar acompanhado do cartunista Netto que, como eu, é apaixonado por botecos, mas não conhecia o Joia. 

Decorado com uma velha máquina registradora,  um busto do compositor Beethoven, cartazes de velhos filmes, desenhos e caricaturas, seu charme o fez receber em 2011 o título de Patrimônio Cultural Carioca. 

Adotado como símbolo da boemia carioca,  tem entre os frequentadores famosos a atriz Sônia Braga, o agitador cultural Ataíde Venância, o  cantor e compositor Moacyr Luz,  e os cartunistas Jaguar e Paulo Caruso, entre outros.

Em 2007, com a perda do patriarca, o  boteco que hoje é administrado por dona Alayde , viuva de seu Joia,  quase foi à falência. Graças a um esforço coletivo, promovido por amigos e fregueses (entrel eles, Márcio Pedreira, que ainda hoje assessora dona Alayde) a casa conseguiu manter as portas abertas. 

Boteco raiz, o menu, escrito a mão, fica estampado em um quadro negro, pendurado na entrada, anunciando as especialidades do dia, com destaque para o carro-chefe da casa, o imbatível paio com caldo de feijão, acompanhado de farofa de ovos, couve e torresmo.

O ambiente é rústico e aconchegante, equipado com mesinhas de madeira. Em meio à decoração única, composta por paredes verdes enfeitadas com pôsteres do Botafogo - clube do coração de Seu Joia. As beldades da Playboy, nuas, que antes ocupavam parte das paredes da casa, em nome da moral e dos bons costumes - como se dizia antigamente - foram substituídas por cartazes de filmes nacionais e antigas propagandas de refrigerantes.

É possível viajar no tempo, contemplando o ambiente retrô do bar e ouvindo histórias sobre antigos frequentadores, como seu Oscar, que depois que faleceu, ganhou uma placa com seu nome ao lado da mesa onde sentava todos os dias. 



 

Ediel Ribeiro (RJ)

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Coluna do Ediel

Ediel Ribeiro é carioca. Jornalista, cartunista e escritor. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) do romance "Sonhos são Azuis". É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG). Autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty" publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ) e Editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!". O autor mora atualmente no Rio de Janeiro, entre um bar e outro.

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