Rio de Janeiro - Jaguar, no seu livro “De Bar em Bar, Confesso que Bebi”, relata que um botequim deve ser, de preferência, razoavelmente limpo. “Mas não a ponto da gente pensar que está bebendo numa enfermaria. Ninguém morre de infecção contraída em bar. E quantos já morreram de infecção hospitalar?” - escreveu.
Um dia, Jaguar levou o Nássara — genial caricaturista e compositor, além de grande boêmio — para conhecer a filial do Bar Luiz, num shopping da Barra. O bar era chic, mas tinha alguma coisa errada.
— Limpo demais — sentenciou Nássara.
Escondido na esquina da Rua da Conceição com a Rua Júlia Lopes, no Centro do Rio, tem um boteco assim: o Bar do Jóia. Nem sujo, nem limpo demais. Porém, honesto.
O bar tem 115 anos de tradição. Inaugurado, como Café e Bar Rio Paiva, em 1909, por João Nunes, um português que gostava de música clássica; a partir da década de 80, quando Joaquim Nunes, filho do seu João, assumiu o comando do bar, passou a se chamar ‘Bar do Seu Jóia’ (apelido do Joaquim), ‘Bar do Jóia’ e, finalmente, ‘Joia’, sem o acento.
O boteco, uma pérola carioca, foi cenário do filme “Chocante” de Johnny Araújo, com Bruno Mazzeo, Lúcio Mauro Filho, Bruno Garcia e Marcus Majella. No filme, o bar é um dos pontos de encontro de uma banda de sucesso dos anos 90 que se reencontra 20 anos depois.
Ontem, voltei ao bar acompanhado do cartunista Netto que, como eu, é apaixonado por botecos, mas não conhecia o Joia.
Decorado com uma velha máquina registradora, um busto do compositor Beethoven, cartazes de velhos filmes, desenhos e caricaturas, seu charme o fez receber em 2011 o título de Patrimônio Cultural Carioca.
Adotado como símbolo da boemia carioca, tem entre os frequentadores famosos a atriz Sônia Braga, o agitador cultural Ataíde Venância, o cantor e compositor Moacyr Luz, e os cartunistas Jaguar e Paulo Caruso, entre outros.
Em 2007, com a perda do patriarca, o boteco que hoje é administrado por dona Alayde , viuva de seu Joia, quase foi à falência. Graças a um esforço coletivo, promovido por amigos e fregueses (entrel eles, Márcio Pedreira, que ainda hoje assessora dona Alayde) a casa conseguiu manter as portas abertas.
Boteco raiz, o menu, escrito a mão, fica estampado em um quadro negro, pendurado na entrada, anunciando as especialidades do dia, com destaque para o carro-chefe da casa, o imbatível paio com caldo de feijão, acompanhado de farofa de ovos, couve e torresmo.
O ambiente é rústico e aconchegante, equipado com mesinhas de madeira. Em meio à decoração única, composta por paredes verdes enfeitadas com pôsteres do Botafogo - clube do coração de Seu Joia. As beldades da Playboy, nuas, que antes ocupavam parte das paredes da casa, em nome da moral e dos bons costumes - como se dizia antigamente - foram substituídas por cartazes de filmes nacionais e antigas propagandas de refrigerantes.
É possível viajar no tempo, contemplando o ambiente retrô do bar e ouvindo histórias sobre antigos frequentadores, como seu Oscar, que depois que faleceu, ganhou uma placa com seu nome ao lado da mesa onde sentava todos os dias.
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