Rio de Janeiro - Tem pessoas que passam pela terra rápido, como um cometa. Mas deixam seu rastro, sua luz: foi assim com o cartunista Vagn.
Foi embora tão rápido como surgiu. Brilhante, encantador e sem palavras, como num cartum de Steinberg, seu ídolo.
Vagner Tadeu Horta nasceu em 1946, em Mariana, uma das mais antigas cidades de Minas, mas passou toda a infância em Caratinga, terra natal dos também cartunistas Ziraldo, Zélio, Mayrink, Edra e Lane.
Surgiu com aura de gênio do humor no suplemento “O Centavo”, da maior revista da época, “O Cruzeiro”.
Publicou seus trabalhos, também, no jornal “Correio da Manhã”, “Jornal do Brasil”, “O Sol”, “Jornal dos Sports”, “O Pasquim” e na “Revista da Shell”, “Diner´s” e “Fairplay”.
Filho de um fiscal e de uma mãe de origem alemã - criada em colégio de freiras - Vagn lia muito, desde Sartre até Guimarães Rosa, passando por Gorki e Kafka.
Chegou ao Rio numa madrugada de 1967.
Sonolento e carregando uma velha mala de couro, levou uma “dura” da polícia e foi enganado por um motorista de táxi inescrupuloso que o levou até o Solar da Fossa, em Botafogo.
Sem um níquel para começar a vida no Rio, Vagn teve ajuda do compatriota Ziraldo e sua esposa Vilma Gontijo.
Vilma, por sinal, foi quem sintetizou seu nome artístico de Wagner para Wagn. Mas ele trocou e “W” pelo “V” e passou a assinar Vagn.
Vagn tinha um traço sintético, na linha de Saul Steinberg, um cartunista romeno que viveu nos Estados Unidos e influenciou gerações de artistas em todo o mundo.
Entre os brasileiros, Vagn e Millôr Fernandes beberam da fonte do romeno. Muita coisa do traço do Millôr é do Steinberg. O cartunista carioca chegou a ter um livro recolhido porque um desenho de Steinberg foi atribuído a ele.
Por conta dessa influência, no auge d´O Pasquim, Paulo Francis - tão genioso quanto genial - escreveu que Vagn não passava de um imitador de Steinberg, que não mostrou nada de novo em seus desenhos.
Ziraldo saiu em defesa do amigo: “O Francis já tinha feito isso com a Tônia Carrero; fez uma crítica tão violenta à atriz que levou um soco do marido dela, na época, o Adolfo Celi”.
Na fase mais criativa e crítica do seu trabalho, passou a desenhar cavalos com a bandeira nacional estilizada no ventre do animal, passando a ser perseguido pelos militares.
Foi preso e teve seu nome incluído na lista do AI-5 (Ato Institucional número 5), conhecido instrumento de força da Ditadura Militar.
Torturado física e psicologicamente, o cerceamento da liberdade transtornou-o de modo grave e perpétuo.
Posto em liberdade, confuso, doente e em choque, tentou se matar. Sobreviveu, mas foi internado no Instituto Philippe Pinel, um hospital psiquiátrico localizado no bairro de Botafogo, no Rio.
No "Pinel", super doses de medicamentos e a depressão acabaram por matá-lo, precocemente, no dia 24 de julho de 1970, aos 23 anos.
Ziraldo, em 2007, escreveu um texto em homenagem ao amigo na contra-capa do livro “Ninguém Segura Caratinga”, dedicado a Vagn:
“Este livro é uma homenagem à mais doce das figuras que Caratinga mandou para o mundo e o mundo mandou para o céu: o Vagn.
Ele foi inspiradíssimo e um surpreendente desenhista de humor que encantou a jovem intelligentsia carioca nos agitados anos da repressão”.
Comentários
Sou sobrinha do Vagn, não o conheci, porém sua história me fascina, diante de talento que representou na época, da docilidade como é descrito. Gostaria muito de tê-lo conhecido.