Cidades

Sob protestos e bate-boca entre vereador e manifestantes, Câmara de Itabira aprova cartão-alimentação

ITABIRA (MG) – Com apenas um voto contrário, a Câmara Municipal de Itabira aprovou, nesta terça-feira (22), o Projeto de Lei nº 109/2025, que cria um cartão-alimentação no valor de R$ 700 para vereadores e servidores do Legislativo. A proposta foi aprovada sob protestos no plenário, com críticas ao valor do benefício e à forma como foi conduzida a sessão.

Logo após a leitura do projeto, o ex-presidente da Câmara, Heraldo Noronha (Republicanos), pediu a palavra e saiu em defesa do auxílio. No entanto, sua fala provocou ainda mais revolta entre os presentes. Sob vaias, Heraldo sugeriu que, embora os vereadores sejam bem remunerados, poderiam usar o cartão para comprar cestas básicas e distribuí-las:

“Se o senhor não precisa do cartão-alimentação, o senhor compra uma cesta básica e passa para uma pessoa que precisa”, disse. “Quando o senhor tem um dinheiro a mais, o senhor vai e compra uma cesta básica para uma pessoa”.

A justificativa foi entendida pelos manifestantes como sugestão de uso assistencialista de verba pública, com possível conotação eleitoral. Os protestos se intensificaram com gritos de “vergonha” e acusações de desvio de finalidade.

Incomodado com as críticas, Heraldo reagiu e começou um bate-boca com um grupo de professores que acompanhava a sessão. Ele afirmou que muitos deles recebem bem, mas não ajudam quem precisa:

“Tá esses professores, a maioria professor que tá falando aí, senhor presidente, é o seguinte: muitos deles recebe muito, mas pergunta [se] algum deles já deu a cesta básica para alguém que precisa. [...] E se nós temos nosso cartão, isso vai ajudar a nós ajudar o próximo lá fora.”

A fala foi respondida com vaias. Heraldo concluiu afirmando que “quem não quiser o cartão, passa ele para outra pessoa”, o que pode ser considerado uma confissão de uso indevido de recurso público, sugerindo, inclusive, desvio de finalidade e prática de compra de votos.

camara de itabira
Câmara de Itabira - Foto: Filipe Augusto / Acom CMI  

Único voto contrário

O vereador Luiz Carlos (MDB) foi o único a votar contra o projeto. Ele lembrou que os vereadores têm a obrigação de comparecer à Câmara apenas uma vez por semana e já são bem remunerados:

“Não concordo com isso. Eu falo que o vereador ganha muito bem. O vereador tem obrigação de vir aqui uma vez por semana. Aqui, meu salário: em janeiro eu recebi R$14.734,99 e estava de recesso. Nesse mês passado, R$16.369,12. Então, eu acho um absurdo.”

Ele ainda defendeu que o cartão fosse concedido apenas aos servidores da Câmara, não aos vereadores. Luiz Carlos tentou pedir vista do projeto para apresentar uma emenda nesse sentido, mas foi advertido pelo presidente de que a votação já estava em andamento e que o pedido de vista estava prejudicado.

Histórico de polêmicas e manobras políticas

Não é a primeira vez q

ue a atuação da Câmara provoca revolta popular. Em fevereiro de 2023, os vereadores aprovaram um aumento de salário para si próprios, de R$ 6.986,23 para R$ 17.387,32, em desacordo com o Regimento Interno, que determina que reajustes só podem ser votados no último ano da legislatura e até 30 dias antes da eleição. À época, Heraldo era o presidente da Câmara e levou o aumento a votação dois anos antes do fim do mandato.

Já o aumento do salário do prefeito Marco Antônio Lage (PSB), aprovado em 31 de dezembro de 2024, também sob a presidência de Heraldo, foi realizado fora do prazo permitido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que proíbe reajustes nos últimos 180 dias de mandato. O valor passou de R$ 26.609,60 para R$ 33.341,83.

Fato interessante é que a proposta de aumento salarial para o prefeito Marco Antônio só foi colocada em pauta após sua reeleição. Durante todo seu mandato, Marco Antônio enfrentou forte oposição na câmara com dez dos dezessete parlamentares declaradamente na oposição, incluindo o próprio Heraldo, então presidente da Casa, que sistematicamente barrava projetos do Executivo. Porém, após as eleições que confirmaram Marco Antônio para um segundo mandato, Heraldo mudou repentinamente sua postura e, de crítico ferrenho da gestão, passou a atuar como aliado, o que gerou críticas e levantou suspeitas de possíveis acordos políticos entre ele e o prefeito reeleito. No caso do projeto que aumentaria os salários do prefeito, mais do que pautar o reajuste, Heraldo atuou ativamente para garantir sua aprovação, alimentando a percepção de que a manobra foi cuidadosamente calculada para contornar o cenário político anterior.

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