Rio - No final da década de 70, quando se mudou com seus personagens para São Paulo, Henfil dizia: “As coisas estão acontecendo em São Paulo. Tudo acontece lá. Na área cultural e política”.
E estava.
No Rio de Janeiro, tinha a patota do “Pasquim”. Só.
Em São Paulo nascia a ADesp (Associação dos Desenhistas do Estado de São Paulo) e a ABD (Associação Brasileira de Desenhistas).
Lá, Jayme Cortez e Miguel Penteado fundavam a Editora Continental com revistas 100% nacionais. A editora produziu dezenas de quadrinhos de humor, terror e combate. Descobrindo novos quadrinistas e gerando emprego para muitos artistas daquela época.
E Toninho Mendes criava a seminal “Circo”.
Foi nesse cenário que, abrigados em universidades como a FAU e a ECA, dezenas de artistas se mobilizavam e criavam uma efervecência cultural. Nas artes plásticas e nos quadrinhos, principalmente.
Entre eles, o cartunista Luiz Geraldo Ferrari Martins.
Luiz Gê, como era conhecido, nasceu na cidade de Ribeirão Pires (SP), em 1951, e ainda criança se mudou para São Paulo.
Foi no meio acadêmico que Luiz Gê conheceu Laerte Coutinho.
Laerte tinha a idéia de criar uma revista em quadrinhos; idéia que também passava pela cabeça do Gê, desde os tempos em que trabalhou na “Versus”.
Juntos com a Lúcia - a então mulher do Laerte - Lorde K e Fausto - dois amigos do Laerte que logo em seguida abandonaram o meio - fizeram uma reunião onde criaram uma revista que romperia com os modelos das HQs vigentes à época.
Nascia, em novembro de 1972, “O Balão”, a primeira revista Undergroud brasileira, com capa de Luiz Gê.
A revista abordava temas emblemáticos: futebol, mulheres, drogas, o universo contracultural, o universo universitário, os conflitos familiares e as lutas de classes.
A partir da experiência pioneira da “O Balão”, as histórias em quadrinhos deixaram de ser direcionadas exclusivamente para o público infantil e adolescente e adquiriram conteúdo critico, iniciando a gênese dos modernos quadrinhos adultos brasileiros.
Depois que saiu o primeiro número, a revista, hoje raridade, começou a aglutinar talentos, revelando uma brilhante geração de quadrinistas, cartunistas e ilustradores brasileiros como Laerte, Luiz Gê, Alcy, Angeli, Magnani, Paulo Santos, Xalberto, Sian, Miaidara, Paulo e Chico Caruso, entre outros.
"O Balão" era vendido de mão em mão pelos próprios artistas em bares, filas de cinemas, sinais de trânsito ou era deixado em consignação em poucas e raras livrarias especializadas.
A revista crescia de forma espantosa, e com o sucesso veio a primeira divergência no grupo: uma parte dos desenhistas, liderados pelo Luiz Gê, era favorável que a revista fosse para as bancas e outra facção, encabeçada pelo Laerte, na época bastante engajado em ações políticas e culturais tinha uma visão completamente diferente.
Está oposição de concepções causou um racha na redação. Laerte deixou o grupo, Paulo Santos - na época marido da Conceição Cahú - voltou para Recife e Chico Caruso veio para o Rio trabalhar na redação do jornal Opinião.
Acabava alí, na nona edição, a trajetória da “O Balão”.
O Sonho de Luiz Gê, de uma revista de banca, só foi retomado anos mais tarde na revista "Circo", do Toninho Mendes.
Se não tivesse feito mais nada, só a criação da “O Balão” já daria a Luiz Gê um lugar de destaque no mundo do cartum e da história em quadrinhos brasileira.
Mas Luiz Gê fez mais: foi jornalista, cartunista, editor, e professor de desenho. Trabalhou nos jornais “Folha de São Paulo”, “Estado de São Paulo”, “Jornal da Tarde”, “Jornal do Brasil”, “Folha de Londrina”, “Movimento”, “Versus”, “Pasquim” e nas revistas “Circo”, “Status”, “Veja”, “Visão”, “Isto É” e “Placar”, entre outras.
Anos mais tarde quando o cartunista Fortuna lançou sua revista “O Bicho”, contou para Luiz Gê que tinha se baseado na experiência da “O Balão”.
Luiz Gê, então, disse: “Gostei de ouvir isto! O que me assegura que entramos para a história”.
Entrou mesmo.
Comentários