Política

Marcio Lacerda desiste de candidatura ao governo de Minas e anuncia desfiliação do PSB

O ex-prefeito de Belo Horizonte Marcio Lacerda (PSB), que havia registrado sua candidatura ao governo de Minas contrariando a orientação da nacional de seu partido, informou nesta terça-feira (21) que retirou sua candidatura ao governo e anunciou sua desfiliação do partido. Ele foi registrado como candidato no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG), em 15 de agosto, isto depois de a Executiva Nacional do partido ter decidido que não teria candidato ao governo de Minas.

Em carta divulgada na tarde de ontem, Márcio Lacerda disse que a "velha política" o impediu de disputar as eleições e justificou a sua retirada do pleito. "A impossibilidade do julgamento definitivo do assunto, desenhada nos últimos dias no âmbito da Justiça Eleitoral, conduz esta insegurança jurídica até a véspera do 1º turno, o que me leva a retirar minha candidatura". A decisão de Lacerda aconteceu pouco antes de o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidir sobre o pedido de candidatura.

O presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, também divulgou nota sobre o impasse em Minas e disse que “Márcio Lacerda não compreende que política é uma atividade que se exerce por meio de construções coletivas.”

O ex-prefeito de Belo Horizonte Márcio Lacerda na convenção nacional do PSB, em Brasília (Foto: Daniel Marenco/Agência O Globo)
Em nota, Márcio Lacerda disse que a "velha política" o impediu de disputar as eleições (Foto: Daniel Marenco/Agência O Globo)

 

Crise no partido

A executiva nacional do PSB destituiu a executiva estadual de Minas Gerais que apoiava a candidatura de Márcio Lacerda. Mesmo assim os correligionários do ex-prefeito reuniram-se no dia 4 de agosto e entre ataques e empurrões aprovaram o nome do ex-prefeito como candidato ao governo, criando a partir daí um impasse com a executiva nacional que foi parar na justiça.

No dia 5 de agosto, a nova comissão indicada pela nacional e presidida por Renê Vilela, convocou uma segunda convenção e decidiu que o partido não teria candidato ao governo de Minas e que o PSB coligaria majoritariamente com PT apoiando a reeleição de Fernando Pimentel, somando-se aos partidos PCdoB, DC e PR e proporcionalmente com PT e PR.

Hoje, por volta do meio dia, os partidos que apoiavam Lacerda irão se encontrar para um almoço em um restaurante próximo a Assembléia para decidir quem irá encabeçar a chapa como candidato a governador no lugar de Márcio Lacerda.

Leia abaixo a carta de Marcio Lacerda na íntegra:

"A velha política conseguiu me tirar dessa eleição

Dois comandos partidários, de forma antidemocrática e arbitrária, fizeram, na calada da noite, nos porões sombrios dos gabinetes em Brasília, o mais podre dos conchavos políticos. A cúpula do PSB e do PT conspiraram para retirar a minha candidatura a Governador de Minas Gerais, impedindo a desvinculação definitiva do tradicional papel de braço do PT, desempenhado pelo PSB.

Todos sabem que lutei e resisti. Minha indignação não aceitou essa negociata, essa imposição que agride não apenas a minha candidatura, mas a vontade soberana dos mineiros.

No entanto, a impossibilidade do julgamento definitivo do assunto, desenhada nos últimos dias no âmbito da Justiça Eleitoral, conduz esta insegurança jurídica até a véspera do 1º turno, o que me leva a retirar minha candidatura. Esse prazo alongado dificulta e muito a mobilização de apoiadores e, especialmente, tornará muito fragilizada a situação dos candidatos a deputado do PSB, que estão contra sua vontade, presentes em duas coligações. Além disso, manter uma campanha eleitoral, muito curta e de grandes desafios como essa, com tamanha indefinição jurídica, poderia prejudicar muito o crescimento que vínhamos detectando nos últimos meses em torno da nossa proposta para Minas Gerais.

Os representantes da velha política conseguiram impedir minha candidatura.

Minas Gerais precisava de uma terceira via. E a nossa candidatura era, sim, muito viável. Todas as pesquisas divulgadas até o momento apontaram o meu nome com reais possibilidades de chegar ao segundo turno e obter uma vitória. Por isso os grandes interesses agiram dessa maneira covarde.

Infelizmente essa é a política que ainda impera no Brasil. Sou retirado da disputa esperando, sinceramente, que esse fato deplorável que ocorreu com a minha candidatura sirva de exemplo para ajudar a transformar de fato a nossa política. Não podemos mais deixar que acordos e conchavos de gabinete predominem sobre a vontade popular.

E é essa vontade popular que sustenta a esperança que estava depositada em nossa candidatura. Nos últimos dezoito meses visitei mais de duzentas cidades em Minas, vendo de perto a situação de cada região do estado. Dialogando e ouvindo pessoas de todos os segmentos da população aprofundei meus conhecimentos sobre Minas Gerais e sobre a realidade das pessoas em mais de mil reuniões que participei nesta que eu chamei de peregrinação de aprendizado.

Quero agradecer a todos que nos acompanharam e participaram dessa caminhada. A todos os cidadãos que estavam dispostos a construir uma nova alternativa para Minas e que viam em nossa candidatura a esperança de algo diferente.

Nas pessoas do meu candidato a vice-governador, deputado estadual Adalclever Lopes, e do meu candidato a senador, deputado federal Jaime Martins, quero agradecer profundamente a todos os partidos, dirigentes, parlamentares, prefeitos, vice-prefeitos, vereadores, enfim, todos os políticos de bem que estiveram ao nosso lado neste momento e que também estão profundamente indignados. Desejo boa sorte a todos os candidatos a deputado da coligação Minas tem Jeito, em especial aos do PSB que apoiaram minha candidatura a Governador.

Apesar do sentimento de frustração, digo a todos que esta foi uma experiência extremamente proveitosa. Ouvir de perto os mineiros permitiu a mim, ao lado de outros colaboradores e de lideranças partidárias que confiaram em nosso projeto, apresentar um programa de governo chamado “Pacto Pela Retomada da Grandeza de Minas”, que está registrado no Tribunal Regional Eleitoral e publicado em marciolacerda.com.br. São ideias e conceitos que permitiriam que Minas Gerais voltasse a olhar para a frente de novo.

Aproveito este comunicado para também anunciar a minha desfiliação do Partido Socialista Brasileiro, ao qual nos últimos onze anos fui filiado, honrando com dignidade seus princípios e valores. Infelizmente, este conchavo de sua direção nacional terá reflexos ainda mais profundos no PSB e, principalmente, nos olhos de quem enxergava neste partido alguma coisa diferente na vida partidária deste país.

A política continua sendo o grande instrumento de transformação social no Brasil, mas transformação mesmo precisa acontecer primeiro na forma de se fazer política.

Marcio Lacerda, 21/08/2018"

Leia a carta de Carlos Siqueira na íntegra:

"A POLÍTICA É SEMPRE UMA CONSTRUÇÃO COLETIVA

Em resposta à carta divulgada à imprensa pelo ex-prefeito Márcio Lacerda:

O senhor Márcio Lacerda fez chegar à imprensa uma carta, em que credita a "conchavos de gabinete" e à "velha política" a retirada de sua candidatura ao governo do Estado de Minas Gerais.

O motivo imediato, contudo, está longe de se encontrar no que foi alegado: a desistência se dá como consequência natural da derrota certa que encontraria na Justiça Eleitoral, mobilizada por ele na tentativa de anular as deliberações do Congresso Nacional Eleitoral do PSB, que ocorreu no dia 5 de agosto de 2018.

O contexto geral, por outro lado, explica os motivos pelos quais a candidatura ou qualquer outra alternativa se tornaram inviáveis.

Inicialmente, Márcio Lacerda não compreende que política é uma atividade que se exerce por meio de construções coletivas. Ou seja, diálogo não é conchavo; construir candidaturas viáveis não equivale a fazer má política; ouvir o conjunto de forças envolvidas não representa caudilhismo.

Por outro lado, a vontade - grandeza essencial a qualquer ator político que se queira relevante - não é afirmação autoritária e irresponsável de uma postulação.

Vejamos: Márcio Lacerda foi informado, em primeira hora, sobre o andamento das articulações do PSB Nacional relacionadas a Minas Gerais. Desde sempre, houve a preocupação de encontrar, para ele, até ali merecedor de tal deferência, uma posição compatível com sua trajetória política.

Já nesse ponto se apresentou a surpresa: um candidato que havia declinado de sua própria candidatura, por meio de carta dirigida à presidência nacional do PSB, que afirmara a intenção de ir "cuidar de seus netos", resolveu impor a todos, por meio da judicialização do processo, sua vontade individual.

A atitude confere com o estilo: um político inseguro, vacilante, indeciso, que faz política sem qualquer consideração ao esteio de relações que ela implica, afirma não raro, com seu autoritarismo, uma tentativa de superar as fragilidades que promove, ao cultivar um personalismo, de natureza obviamente antidemocrática.

Se os brasileiros, especialmente aqueles de Minas Gerais, quiserem formar um juízo mais acurado sobre o quilate desse binômio personalismo/autoritarismo, basta recordar o que ocorreu na sucessão do próprio Márcio Lacerda, na prefeitura de Belo Horizonte.

Ele anunciou, pela imprensa, a retirada da candidatura do executivo Paulo Brant para, na sequência, emprestar seu apoio ao candidato do PSD, que mereceu míseros 3% de votos, quando as urnas se fecharam.

É certo, em meio a uma crise tão severa como a atual, que a população do grande Estado das Minas Gerais merece mais razoabilidade e respeito do que se pode esperar de alguém tão claudicante.

Carlos Siqueira

Presidente Nacional do Partido Socialista Brasileiro - PSB"

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