A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) busca o apoio de parlamentares a uma emenda global substitutiva à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016, que trata da reforma da Previdência Social. A ideia é conseguir 171 assinaturas de deputados e senadores para que a proposta possa ser protocolada e analisada pelo Congresso.
A presidente da Comissão de Direito Previdenciário da OAB/RJ, Suzani Ferraro, disse que a instituição não é contra a reforma da Previdência, mas não concorda com alguns pontos da proposta do governo encaminhada ao Congresso. Por isso, preparou a emenda global substitutiva que “traz regras mais acessíveis para a atual realidade da sociedade brasileira”.
A emenda global, elaborada pela OAB em conjunto com as comissões de Previdência Social da entidade, técnicos especialistas na área, associações dos juízes trabalhistas e federais, de auditores-fiscais; e sindicatos aponta pontos que divergem da proposta do governo encaminhada ao Congresso. Entre outros itens mantém a permissão de acumular pensão por morte com aposentadoria, mas vedada pelo governo. “Se tem duas rendas que mantêm a família e um dos partícipes, por algum motivo, deixa de compor a renda, principalmente, pelo motivo da morte, é importante que possa se acumular a pensão com a aposentadoria”, afirmou.
Em outro ponto, a emenda propõe que a idade do regime geral dos trabalhadores da iniciativa privada seja igual ao regime próprio do servidor público. A OAB contesta ainda a vinculação da idade ao tempo. No lugar dos 49 anos de contribuição para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), propostos pelo governo, para o trabalhador receber a aposentadoria integral, pede que sejam 40 anos.
A emenda propõe também a permanência da possibilidade de acumular benefícios do regime geral com os do regime próprio. “Um professor universitário que dá aula na universidade pública e em universidade particular, contribui para as duas fontes, então, é justo que ele se aposente pelas duas. Isto pode e não há vedação legal hoje”, completou.
Na visão da advogada, ao apontar um déficit o governo usa o argumento para convencer a população que poderá ficar sem aposentadoria, se a PEC 287/2016 não for aprovada. “Ninguém vai conseguir trabalhar 100 anos para ter direito à aposentadoria. Vai morrer antes”, contou.
Discussão
O representante brasileiro da Organização Ibero-americana de Seguridade Social (OISS), o médico Baldur Schubert, disse que a reforma da Previdência é essencial para o país e agora que a proposta do governo está no Congresso o momento é apropriado para a discussão com a participação da sociedade.
Para Schubert, é importante considerar o aspecto demográfico, uma vez que a população brasileira está envelhecendo rapidamente. O médico destacou que nos últimos 50 anos a expectativa de vida do brasileiro era em torno de 50 anos para as mulheres e 49 para os homens. Hoje, alcançou 79 anos para as mulheres e 71 para os homens. “Isso é um impacto muito grande em curto espaço de tempo e a tendência é ter cada vez mais pessoas de terceira e quarta idade. Isto significa um custo para a sociedade e para a Previdência Social no particular, também na área de saúde e de assistência social”, apontou.
“Temos que estar preparados para esta nova circunstância que está pressionando a sociedade como um todo,"disse.
O representante brasileiro da OISS alertou que parte da população está na informalidade e, portanto, não contribui para a Previdência e mais tarde vai obter o benefício de prestação continuada. Ele chamou atenção também para as novas formas de trabalho no mundo, de forma automatizada e com aspectos da inovação. “Isto tudo vai impactar nas contas da Previdência Social, então, terá que ser analisado como garantir sustentabilidade no regime de repartição dos que estão na ativa, trabalhadores entre 20 e 60 anos que são os que contribuem para manter os que estão com mais de 60 anos”, contou.
De acordo com o médico, a previdência é um tema de preocupação no mundo e vários países buscam uma reforma para atender o critério de sustentabilidade do sistema. Um dos pontos de convergência nas propostas em discussão nos países é a idade mínima. “O mundo inteiro está caminhando para a idade mínima. O Brasil tem uma aposentadoria que é tempo de contribuição que não exige idade mínima. São poucos os países no mundo que não tem idade mínima, entre os quais o Brasil. Acho que a idade mínima vai acontecer, vai ser este piso que será definido pelo Congresso”, concluiu, acrescentando que o patamar terá que levar em consideração a expectativa de vida do brasileiro e o tempo de contribuição.
“Este assunto vai ter que ser enfrentado. A tendência das pessoas é empurrar para frente. Fica mais difícil, porque, quando as coisas podiam ser mais programadas com esquema de transição gradual, seria mais fácil de ser assimilado, quando fica procrastinando chega um momento em que é obrigado a fazer de chofre, aí fica muito mais difícil.”
Déficit
A OAB contesta ainda o déficit da Previdência. Segundo a presidente da comissão, há estudos que demonstram isto. “A Receita da Previdência Social e a gente não está falando nem de Seguridade Social, se pegar o artigo 195 da Constituição Federal vai ver que lá existem quatro rubricas de receita previdenciária. O governo fala em rubricas que não estão incluídas e ele fala de forma genérica e não demonstra nada. Tudo que fizemos foi com base em dados disponibilizados pelo governo no site da Receita Federal”, informou.
Suzani Ferraro reconhece que a receita da Previdência vem caindo, mas aponta que é por causa da influência da Desvinculação de Receitas da União (DRU), que permite ao governo federal usar livremente 30% da arrecadação de tributos federais vinculados por lei a fundos ou a despesas específicas. Até 2015, o percentual era de 20%, que foi modificado no ano passado após proposta do governo ao Congresso, com aplicação estendida até 2023.
“Ora, se não tenho dinheiro como é que dou para outras pastas”, explicou.
A presidente descartou que a diferença de conceitos de deficit e de superavit seja decorrente de diversos métodos de cálculo entre a avaliação da OAB e a posição do governo. “Não é método de cálculo não. O governo, simplesmente, nunca demonstrou. Ele não fez o estudo que deveria ser feito e só fala, mas não demonstra que tem o déficit.”
Em entrevista à Agência Brasil, o secretário de Previdência Social do Ministério da Fazenda, Marcelo Caetano, informou que em 2016, no sistema de aposentadorias do INSS, que junta o regime geral de previdência social [empregados da iniciativa privada] e o regime geral próprio dos servidores públicos, o déficit ficou em R$ 150 bilhões, resultado de uma arrecadação de R$ 358 bilhões e de gastos com aposentadorias e pensões de R$ 508 bilhões.
No conceito da Seguridade Social, que além da previdência envolve saúde e assistência, incluindo gastos com os benefícios de prestação continuada da Lei Orgânica da Assistência Social (BPC/LOAS), que garante um salário mínimo mensal a pessoas acima de 65 anos sem renda ou às que tem deficiência física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo, que as impeça de atividades plenas na sociedade, em igualdade de condições com outras pessoas e, ainda, os benefícios do Programa Bolsa Família, o déficit registrado, segundo Marcelo Caetano, ficou em R$ 259 bilhões, apesar de contar com um conjunto de tributos como a contribuição sobre o líquido liquido, Cofins, Pis/Pasep e concursos de prognósticos.
“Nos dois casos houve déficit. Tanto na previdência como na seguridade social”, apontou.
Congresso
Sobre a proposta de reforma da Previdência que está no Congresso, Caetano disse que o governo reconhece a soberania do poder legislativo, mas vai desenvolver um trabalho de convencimento para “se manter, o mais fiel possível, a proposta original”.
O secretário acrescentou ainda que a idade mínima é um ponto fundamental. “O Brasil é um dos poucos países em que se aposenta sem ter uma idade mínima. Então, instituir uma idade mínima de aposentadoria seria um ponto fundamental”.
Na visão dele, nas conversas que vem estabelecendo com parlamentares percebeu uma consciência da necessidade da reforma. “Claro que não são com todos, mas é uma posição, razoavelmente, comum de ver expressado. Agora, a gente sempre vai reconhecer a soberania do Congresso em relação a isso”, completou.
O representante brasileiro da OISS estimou que a discussão no Congresso será extensa. “Este assunto é complexo e sempre vai ser complexo porque mexe com as pessoas”, disse, lembrando que já em 1980, em um congresso mundial da entidade, quando 150 países discutiam o tema, houve uma briga entre a delegação francesa dos trabalhadores criticando os aposentados da França. “Então esta discussão vem de longa data. Não é de hoje”.
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