Coluna

Afinal, quem tem direito a aposentadoria especial?

O Brasil é um dos poucos países do mundo que concede aposentadoria especial ao trabalhador. Criada através da Lei 3807 de 05 de setembro 1960, a aposentadoria especial é assegurada para quem atuou por 15, 20 ou 25 anos em condições insalubres. Ou seja, trabalhou exposto a agentes físicos, químicos ou biológicos ou à combinação desses agentes sem os devidos equipamentos de proteção coletivos ou individuais, popularmente conhecidos como EPIs ou EPCs, além do mínimo de 180 meses de efetiva atividade, para fins de carência.

É claro que de 1960 até agora várias mudanças ocorreram, porém, o benefício continua a existir, mas com critérios cada vez mais restritivos. Até 1995, a aposentadoria especial se dava simplesmente com o preenchimento de um formulário e enquadrava-se como ‘insalubre’ em função da atividade ou agente ao qual o funcionário estava exposto. A partir dessa data, a Previdência Social passou a exigir o LTCAT (Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho), com levantamentos realizados por engenheiros ou médicos de segurança do trabalho.

O LTCAT é importantíssimo, pois é nele que constam os agentes identificados e quantificados referente a exposição do colaborador dentro da empresa. Neste documento é possível verificar, por exemplo, se os agentes identificados no ambiente de trabalhe como, por exemplo, ruídos estão acima dos limites estabelecidos e se a empresa adota medidas preventivas, como o uso equipamentos de proteção Individual. A conclusão se a aposentadoria especial é devida, ou não, acontece com a ajuda deste laudo.

Desde 2004, as empresas são obrigadas a fornecer ao funcionário o PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário) na rescisão do contrato de trabalho. O PPP, contém, o histórico laboral dos funcionários, assim como, os agentes aos quais o colaborador esteve exposto, o uso dos equipamentos de proteção, se a empresa eliminou ou neutralizou os riscos e valores dos limites de tolerância durante a jornada de trabalho. Graças a isso, as empresas estão efetuando uma gestão mais efetiva sobre seus riscos. Caso sejam fiscalizadas é necessário disponibilizar documentos comprobatórios. Além disso, as multas são altas e o valor é pago por funcionário chegando a milhões de reais.

Com todos esses cuidados, aliados aos novos sistemas implantados nas empresas para gestão dos riscos, houve uma redução de 85% no número de aposentadorias especiais. Em contrapartida houve um aumento dos processos previdenciários e trabalhistas.

Hoje muitas pessoas entram com ações trabalhistas para caracterização de adicional de insalubridade para depois tentarem aposentadoria especial. Outros, com processos previdenciários solicitando revisão do tempo ou do valor do benefício. No Brasil, aposentar-se cedo é cultural.

As empresas que passaram a reconhecer a insalubridade devem realizar o recolhimento específico, ou seja, se o funcionário tem direito a aposentar-se com os 15 anos de trabalho por exposição aos agentes insalubres, tendem a receber o benefício por mais tempo, portanto, a empresa geradora do risco deve ressarcir a Previdência e vice-versa.

Se a empresa investe, propícia um local e/ou condições ambientais adequadas, possui controle e gerencia seu risco, isto faz com que paguem menos imposto para a Previdência, que é o mais adequado.

Com a implantação do E-social, as empresas deverão fornecer todas as informações, o que irá gerar um grande banco de dados, causando por parte das empresas uma preocupação maior.

É necessário ter um sistema que favoreça o trabalhador em todos os sentidos e não exponha a vida ao risco. Pagamos para ter benefícios dignos e condizentes com nossas contribuições, livre de fórmulas mirabolantes e critérios inexequíveis. Cada vez mais, precisamos ter consciência de que ambientes salubres são fundamentais e acabar com estes dogmas antigos e doutrinários do século passado.

Não estamos aqui para analisar o benefício. Devemos deixar claro que cada vez mais, temos que priorizar a vida em toda sua plenitude. Aposentar-se antecipadamente por ter adquirido uma doença ocupacional é uma visão distorcida. Reitero que manter a integridade física e mental dos nossos funcionários é nosso objetivo e responsabilidade.

 

*Marcia Ramazzini é engenheira civil pela PUC Campinas, engenheira em segurança do trabalho e meio ambiente pela Unicamp e mestranda em Saúde Ocupacional também pela Unicamp. Tem especializações em Riscos Industriais e Construção Civil pela OSHA (Occupational Safety Health Administration), Ministério do Trabalho dos Estados Unidos. Marcia é diretora da Ramazzini Engenharia e tem 20 anos de experiência de mercado e atua como assistente técnica de empresas para processos trabalhistas e previdenciários.

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