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Mauro Cid afirma que Bolsonaro ordenou vigilância sobre Alexandre de Moraes e participou de reuniões sobre golpe

Ex-ajudante de ordens confirma ao STF que ex-presidente pediu monitoramento do ministro e leu minuta de decreto para instaurar estado de sítio e prender autoridades

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Foto: Ton Molina / STF - 

Brasília - O tenente-coronel do Exército Mauro Cid afirmou nesta segunda-feira (9), em depoimento ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que o ex-presidente Jair Bolsonaro pediu que fosse feito o monitoramento da rotina do próprio Moraes no fim de seu mandato. A ordem, segundo Cid, visava verificar se o ministro do STF teria se encontrado com o então vice-presidente Hamilton Mourão.

"Por várias vezes, o presidente recebia algumas informações de que aliados políticos estariam se encontrando com adversários políticos. Então, foi comum a gente verificar se isso era verdade ou não. Não tinha nenhuma análise de inteligência. A gente perguntava para a Força Aérea ou via a agenda do ministro", relatou Cid ao ser interrogado por Moraes no Supremo.

O depoimento do militar foi o primeiro de uma série de interrogatórios programados até sexta-feira (13), que inclui nomes como o ex-presidente Jair Bolsonaro, o general Walter Braga Netto e outros seis acusados de integrarem o chamado “núcleo decisório” da tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022.

Segundo Cid, o pedido de monitoramento foi encaminhado ao coronel Marcelo Câmara, ex-assessor de Bolsonaro, também réu no processo. O militar revelou ainda que o ex-presidente tinha o hábito de solicitar esse tipo de vigilância informal contra autoridades e adversários políticos.

Minuta golpista foi lida e alterada por Bolsonaro, diz Cid

Outro ponto central do depoimento foi a confirmação de que Bolsonaro teve acesso a uma minuta de decreto golpista que previa a instauração do estado de sítio e a prisão de ministros do STF, além da convocação de novas eleições. Segundo Cid, o ex-presidente não apenas leu o documento como também fez alterações no texto, que foi apresentado em reuniões por Filipe Martins, então assessor de assuntos internacionais da Presidência.

“Foi levado esse documento ao presidente. O documento consistia em duas partes. A primeira parte eram os considerandos. Dez, onze, doze páginas, muito robusto. Esses considerandos listavam as possíveis interferências do STF e TSE no governo Bolsonaro e nas eleições. Na segunda parte, entrava em uma área mais jurídica, estado de defesa, estado de sítio e prisão de autoridades”, explicou o militar.

Ao confirmar sua colaboração premiada com a Polícia Federal, Mauro Cid reiterou que não sofreu qualquer tipo de pressão para assinar o acordo e afirmou:

“Presenciei grande parte dos fatos, mas não participei deles.”

Contexto da investigação

As revelações de Cid integram a ação penal que investiga a tentativa de golpe de Estado com o objetivo de impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, eleito em 2022. Segundo a Procuradoria-Geral da República, há indícios robustos de que Bolsonaro e aliados civis e militares planejaram medidas inconstitucionais para anular o resultado do pleito.

De acordo com reportagem do G1 e da Folha de S.Paulo, os investigadores identificaram a existência de um núcleo central no plano golpista, formado por Bolsonaro e seus principais assessores, que se articularam para mobilizar as Forças Armadas e setores da segurança pública contra as instituições democráticas. A minuta citada por Cid já havia sido localizada em diligências da PF na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, em janeiro de 2023.

A delação de Cid reforça os elementos da acusação, ao atribuir ao próprio ex-presidente a ciência e atuação direta no planejamento de ações ilegais. Especialistas em direito constitucional e criminal consultados pelo jornal O Globo consideram que, se confirmadas por provas materiais e testemunhos convergentes, as declarações de Cid podem ser decisivas para o futuro político e jurídico de Bolsonaro.

Depoimentos seguem até sexta-feira

Além de Cid, também serão interrogados nesta semana:

  • Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin;

  • Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;

  • Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;

  • Augusto Heleno, ex-ministro do GSI;

  • Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;

  • Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;

  • Walter Braga Netto, general e ex-ministro da Casa Civil.

As audiências ocorrem no Supremo Tribunal Federal e são conduzidas pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito.

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