Rio de Janeiro - Conheci Nássara em novembro de 1980, no lançamento do livro “Natureza Morta e Outros Desenhos” do Chico Caruso, na época, chargista do Jornal do Brasil.
Os grandes nomes do humor nacional estavam lá: Chico Caruso, Nássara, Millôr Fernandes, Jaguar, Paulo Caruso, Lan, Nani, e Ziraldo, entre outros.
Houvesse, na época, esses telefones com câmeras - eram tempos de câmeras analógicas. Nada era instantâneo: você levava meses para terminar um filme e conferir o resultado -, eu teria grandes lembranças daquela noite.
Outro encontro nosso foi , anos depois, na casa dele, em Laranjeiras. Levei uma caricatura que fiz dele; ele autografou e, simpático, escreveu: me vejo mais jovem e bem desenhado.
Antônio Gabriel Nássara nasceu na Rua Esperança, no bairro de São Cristóvão, em 12 de novembro de 1909. Morou em Vila Isabel, onde foi vizinho de Noel, que sonhava em ser caricaturista.
Nássara estreou na imprensa carioca em 1927, aos 17 anos, no jornal ‘O Globo’, com o desenho que acompanha a reportagem de Eduardo Bahouth sobre a travessia do Atlântico realizada pelo hidroavião Jahú.
Em 1928, aos 18 anos, Nássara inicia o curso de arquitetura da Escola Nacional de Belas Artes - Enba. Em 1929, Nássara publica três caricaturas em ‘O Globo’, onde trabalhava como paginador, iniciando uma carreira que o levaria do anonimato a fama. Em 1930 é levado para a revista ‘A Noite’ pelo caricaturista Fritz onde publica seus primeiros trabalhos. Em 1931, abandona o curso de arquitetura e trabalha como paginador no jornal ‘A Esquerda’, no qual publica diversas caricaturas.
Euricles de Matos, redator-chefe do jornal, encoraja o jovem Nássara a continuar na carreira de desenhista. Ele, então, tem as primeiras aulas formais de desenho com Modesto Brocos, que o aconselha a abandonar o desenho acadêmico e seguir sua vocação para a caricatura.
Assim como Theo, Alvarus, Mendez, Otelo e Martiniano - jovens desenhistas surgidos nos anos 1930 -, Nássara sofria influência do grande caricaturista da época, o carioca J. Carlos e do traço geometrizado e das caricaturas em meio-tom do paraguaio radicado no Brasil, Guevara.
Em 1950, convidado por Samuel Wainer, trabalha no jornal ‘Última Hora’ no qual, com humor afiado e traço econômico e certeiro, mantém uma página dupla, em cores, com crônica do cotidiano do Rio de Janeiro e caricaturas dos políticos da época.
Em 1974, já surdo de um ouvido, Nássara estava desaparecido havia décadas por conta do nosso contumaz "alzheimer cultural" (licença, Mariano) quando foi encontrado e levado para o semanário 'Pasquim' pelo Jaguar, onde trabalhou com os cartunistas Mariano, Ziraldo e Millôr Fernandes, até 1983.
Para o cartunista Millôr Fernandes, Nássara é o ‘Mondrian do portrait-charge’: “Ele corrige a natureza fazendo com que as personagens acabem se parecendo com a caricatura” - dizia.
Já para o cartunista Jaguar, Nássara faz "logotipos" das pessoas que retrata.
Cartunista, ilustrador e diagramador, com seu talento colaborou com grandes publicações como ‘A Crítica’, ‘Carioca’, ‘Vamos Ler’ ‘O Globo’, ‘A Noite’, ‘A Hora’, ‘A Nação’, ‘Careta’, ‘O Cruzeiro’, ‘Diretrizes’, ‘Última Hora’, ‘Cartoon’ e ‘O Pasquim’, entre outros.
Nássara criou - paralela à vida no jornalismo gráfico - uma carreira brilhante no rádio. Nássara começou no rádio em 1932, como locutor do "Programa Casé", na rádio Philips. Lá, cantou o primeiro jingle nacional, (composto por Luiz Peixoto) para a padaria Bragança.
Em 1928, funda o Conjunto da Enba com Jota Rui, Barata Ribeiro, Manoelito Xavier, Jaci Rosas e Luis Barbosa. Com esse grupo musical compõe seus primeiros sambas.
Em 1932, Mário Reis e Francisco Alves gravam o samba de sua autoria intitulado "Formosa”. A música fez sucesso no carnaval carioca de 1933. Como compositor tem gravados aproximadamente 200 sambas e marchas de 1932 a 1970.
Autor de mais de 200 canções, entre elas seu maior sucesso, a marchinha “Alá-lá-ô”, de 1941 (em parceria com Haroldo Lobo). Tentou virar cantor, com o codinome de Luiz Antônio, mas o desenhista foi superior ao músico.
Como compositor, Nássara fez diversas músicas, sobretudo marchinhas de carnaval hoje antológicas, como ‘Formosa’, seu primeiro sucesso em 1932, gravada por Francisco Alves e Mário Reis; ‘Alá Lá Ô’, e o grande hit ‘Balzaquiana’ (1950), que ganha versão para o francês de Michel Simon. Em 1972, Nássara desenha 12 capas de disco para a série No Tempo dos Bons Tempos, do selo Fontana.
Foi um autêntico boêmio, enquanto fazia caricaturas no jornal, frequentava os cabarés da Lapa, onde brilhava Madame Satã, e as rodas de samba com Noel Rosa; sempre observando a cidade e seus moradores.
Descendente de libanês, era apaixonado pelo Rio, cidade que foi um de seus maiores cronistas, seja cantando ou desenhando.
Parafraseando Jaguar - quando lhe perguntaram se Millôr Fernandes era melhor escritor ou cartunista: Nássara é melhor desenhista que compositor. E vice-versa.
N.A: crônica publicada em O Dia, Brasil 247 e no Jornal O Folha de Minas
Comentários