Dorothy Stang: 20 anos após sua morte, legado de luta permanece vivo
Missionária foi assassinada em 2005 no Pará; conflitos agrários ainda persistem

Brasília - Duas décadas após o assassinato da missionária norte-americana Dorothy Stang, seu legado de luta em defesa das comunidades assentadas e da Amazônia segue vivo. Morta em 12 de fevereiro de 2005, na cidade de Anapu (PA), a religiosa da Congregação das Irmãs de Notre Dame de Namur vivia um momento de esperança com a implementação de projetos agroflorestais na região. A ativista e missionária Jean Ann Bellini, da coordenação da Comissão Pastoral da Terra (CPT), lembra que Dorothy defendia um modelo sustentável para a sobrevivência das comunidades locais.
Os fazendeiros Vitalmiro Bastos de Moura e Regivaldo Pereira Galvão foram apontados como mandantes do crime e condenados pela Justiça. Segundo Bellini, Dorothy acreditava na agrofloresta como uma alternativa viável para conciliar produção agrícola e preservação ambiental. “Ela se entusiasmava com a ideia de integrar culturas anuais com árvores nativas, como castanheiras e cupuaçuzeiros”, recorda a missionária, que na época trabalhava no interior do Mato Grosso.
Conflitos agrários persistem
Mesmo após a morte de Dorothy, os conflitos no campo não cessaram. Bellini afirma que, apesar do avanço das políticas públicas, a pressão de grandes proprietários de terra intensificou-se na região. “Na época, Anapu era uma área pouco explorada, com muitas terras federais. A ausência do Estado facilitava a ocupação irregular”, explica.
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) propôs a criação de assentamentos voltados para a preservação da floresta, mas enfrentou resistência. “Entre os assentados, havia aqueles que priorizavam o modelo convencional de exploração, buscando lucro imediato, o que gerou embates”, analisa Bellini. Para ela, a disputa entre os modelos de uso da terra ainda persiste, com fazendeiros pressionando comunidades agroflorestais a abandonarem suas práticas sustentáveis.
Amazônia ameaçada
Desde a morte da missionária, Bellini visitou Anapu três vezes. A ativista destaca que a infraestrutura da cidade permanece precária, mas a exploração madeireira e a especulação fundiária cresceram. “A Transamazônica continua sendo estrada de chão, mas a quantidade de carretas transportando madeira e material de construção impressiona. O ‘desenvolvimento’ segue um modelo predatório”, critica.
Dorothy Stang era conhecida pelo seu compromisso com a justiça social e a preservação ambiental. “Ela tinha amor pelas famílias e queria acelerar os projetos sustentáveis. Defendia que a luta pela terra deveria ser coletiva, garantindo um futuro para as próximas gerações”, ressalta Bellini.
A morte da missionária reforçou a necessidade de proteger lideranças comunitárias e fortalecer redes de apoio. “As comunidades entenderam que não podem expor demais uma única liderança. A luta precisa ser compartilhada por todos”, pontua a ativista.
Violência no campo cresce
Os dados mais recentes da Pastoral da Terra, divulgados em 2023, indicam que os conflitos agrários continuam em alta. Foram registradas 2.203 disputas no campo, um aumento em relação a 2022, quando ocorreram 2.050 casos. A Bahia lidera o ranking de estados com maior número de conflitos (249), seguida do Pará (227).
A violência contra pessoas também preocupa. Em 2023, houve 554 registros, incluindo 31 assassinatos, uma redução de 34% em comparação com os 47 homicídios de 2022. O uso de agrotóxicos foi a principal forma de violência, vitimando 336 pessoas. Além disso, foram registradas 218 ameaças de morte, 194 casos de intimidação e 160 processos de criminalização de líderes comunitários.
A luta de Dorothy Stang e de tantas outras lideranças segue viva, mas os desafios persistem. A preservação da floresta e a defesa dos direitos das comunidades continuam no centro das disputas pelo futuro da Amazônia.
*Com informações da Agência Brasil
Comentários