Rio de Janeiro - Heleno de Freitas foi, provavelmente, o primeiro craque-problema do futebol brasileiro.
Heleno nasceu em São João Nepomuceno, Minas Gerais, em 12 de fevereiro de 1920. Formado em advocacia, culto, bonito, boêmio, galã, bon vivant, mas de temperamento explosivo, quase intratável.
Descoberto por Neném Prancha no time de praia do Botafogo, Heleno se transferiu para o Fluminense depois que o Botafogo fechou a sua equipe juvenil. Em 1940, retornou ao Botafogo para substituir Carvalho Leite (ídolo e goleador do tetracampeonato estadual, de 1932 a 1935).
Com um 1,82m de altura, Heleno era um centroavante irrequieto, brigador e de boa técnica. Viveu a glória máxima do futebol jogando pelo Botafogo e, principalmente, pela Seleção Brasileira. Foi o maior ídolo do Botafogo, antes de Garrincha. Marcou sua passagem pelo Botafogo com 209 gols em 233 partidas, tornando-se um dos maiores artilheiros da história do clube.
Dono de um talento absurdo e de um gênio destemperado, muitas vezes era expulso por brigar com adversários, juízes e até mesmo com companheiros de time. Além do talento nos gramados, Heleno tinha o dom de encantar as mulheres com seu porte elegante e sua vida boêmia e sedutora.
Fez parte do jet-set carioca da época, frequentava os melhores restaurantes, as melhores festas e a cama das mais lindas mulheres - reza a lenda que teve até um affair com Eva Peron. O jogador foi apelidado de "Gilda" por seus amigos do Clube dos Cafajestes em alusão ao personagem vivido nos cinemas da época pela atriz norte-americana Rita Hayworth. Diziam que Heleno jogava com um pente no calção, para pentear os cabelos depois dos gols de cabeça.

Deixou General Severiano em 1948, quando foi vendido ao Boca Juniors, da Argentina, por 600 mil cruzeiros, na maior transação do continente. No Boca não obteve sucesso. apenas 7 gols em 17 jogos. Retornou ao Brasil contratado pelo Vasco da Gama. No Vasco conquistou o campeonato carioca de 1949 com o memorável Expresso da Vitória.
Em março de 1950, Heleno abandonou um treino do Vasco da Gama alegando estar sendo sabotado pelos seus companheiros. Repreendido, Heleno discutiu com o técnico Flávio Costa e teve que ser apartado pelos companheiros. Heleno foi afastado por indisciplina e teve seu passe colocado à venda por 300 mil cruzeiros.
Em 13 de março de 1950, o Atlético Junior de Barranquilla adquiriu o seu passe por empréstimo. No clube, Heleno marcou 15 gols. Na sua passagem pela Colômbia ganhou a admiração de Gabriel Garcia Márquez. O escritor escreveu que Heleno poderia ser romancista criminal soberbo, pelo “seu senso de cálculo, seus movimentos calmos de investigador e os seus resultados rápidos e surpreendentes”.
Em janeiro de 1951, Heleno retornou ao Brasil e se reapresentou ao Vasco da Gama. A três meses de começar a Copa do Mundo, foi expulso de um baile por cheirar Lança-perfume, em seguida, foi posto à venda pelo Vasco da Gama, após quase trocar socos com Flávio Costa, que também era treinador da seleção. Oferecido a outros clubes, Heleno foi recusado pelo São Paulo e cogitou abandonar a carreira. Acabou se acertando para defender o Santos.
Após uma curta passagem pelo futebol paulista, Heleno retornou ao Rio de Janeiro. Prometendo se regenerar, Heleno foi contratado pelo América, onde encerraria a carreira, tendo jogado apenas uma partida pelo clube de Campos Sales. Expulso ainda no primeiro tempo, após acertar um carrinho violento em um zagueiro adversário. Aquela foi também sua última partida no estádio do Maracanã.
Ainda tentou, depois, voltar aos campos pelo Flamengo, por indicação de Kanela, mas se desentendeu com os jogadores do rubro-negro num jogo treino e não foi aceito.
No Campeonato Sul-Americano de Futebol de 1945 formou um quinteto de ataque famoso com Zizinho, Jair da Rosa Pinto, Tesourinha e Ademir Menezes, considerado por Obdulio Varela o melhor da história da seleção. Fez 18 partidas pela Seleção Brasileira marcando 15 gols, tendo sido artilheiro do Campeonato Sul-Americano de Futebol de 1945 (atual Copa América) com 7 gols.
O vício em drogas, a bebida e a vida desregrada, no entanto, lentamente começaram a vencer Heleno e sua queda foi tão vertiginosa, veloz e intensa quanto sua subida ao topo da carreira. Heleno contraiu sífilis e complicações por causa da doença levaram-no a ser internado em um sanatório para loucos em Barbacena, interior de Minas Gerais.
Heleno foi casado com Ilma, com quem teve um filho, Luiz Eduardo. Porém, por conta do temperamento de Heleno de Freitas, Ilma fugiu para Petrópolis em 1952. Luiz Eduardo — por ter perdido contato desde a separação — só teve notícias sobre o pai com 10 anos de idade, justamente sobre seu falecimento.
Em 1956, o time do Botafogo foi visitá-lo no sanatório. Encontraram Heleno deformado pelos remédios, desdentado e calvo. Aquela foi a primeira e única vez que Heleno esteve ao lado daquele que viria a ser o maior ídolo alvinegro: Mané Garrincha.
Na manhã do dia 8 de novembro de 1959, o enfermeiro foi levar-lhe o café da manhã e o encontrou morto. Aos 39 anos, vitima de complicações da sífilis.
Comentários