Coluna

Luz emanada da cegueira

José Álvares de Azevedo, ícone da educação para cegos, ignorado pelo poder público no Dia Nacional do Braille. Imagem do Google - 

- Marineth, sábado, 8/4, deparei-me com ilustração distinta à frente do Google. Logo cliquei e fui enviado à informação do 189º aniversário de José Álvares de Azevedo. A homenagem a ele, professor, cego de nascença, fundador da primeira escola para pessoas com deficiência visual e que trouxe o Braille para o Brasil, aguçou minha curiosidade. Por que o tributo à data que marca o Dia Nacional do Braille, se ele, responsável pela implantação do sistema, não dá nome à principal instituição para cegos no país? E o governo, em todos os âmbitos, ignorou a data, solenemente.

- Sim, Athaliba. E daí, e dai? Deficientes, no Brasil, são jogados pra corner, pra escanteio.

- Daí, Marineth, decidi sugerir às entidades de cegos no país ampla campanha, escorada em abaixo-assinado, com o objetivo de mudar o nome do Instituto Benjamim Constant para José Álvares Azevedo. Trata-se de imperiosa reparação à injustiça de dar a quem de direito seu nome à base de criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos, realizada por D. Pedro II. O imperador ficou maravilhado e sensibilizado com a exibição de José Azevedo sobre como alfabetizar cegos. E acatou a ideia dele de construir uma escola especializada para deficientes visual. Assim sendo, 2024 deverá marcar a mudança do nome daquela entidade para Instituto José Álvares Azevedo.

- Athaliba, afinal, diga-me quem foi José Álvares Azevedo?

- Marineth, preciso dizer logo de cara que ele atuou com intensidade e tomou as principais providências para a fundação do Instituto dos Meninos Cegos. Mas, infelizmente, morreu poucos meses antes de ver o sonho realizado, aos 19 anos, em 17/3 de 1854, acometido de tuberculose. A inauguração do instituto aconteceu em 17/9, naquele ano de falecimento dele. Seria natural que o seu nome foi dado à instituição que idealizou. O 1º diretor foi José Francisco Xavier Sigaud, médico da Corte Imperial. Ele era pai de Adélia Sigaud, cega e que fora aluna de José Álvares de Azevedo. Fascinado com o método do professor de cegos, Sigaud o apresentou a D. Pedro II.

- Athaliba, me fala mais do mestre, dotado de luz emanada da cegueira, que fez a cabeça do magnânimo segundo e último monarca do Império do Brasil?

- Marineth, ele é considerado Patrono da Educação de Cegos no Brasil. A data de nascido, 8/4 de 1834, comemora-se o Dia Nacional do Braille. Era natural do Rio de Janeiro, onde faleceu. Por indicação de um médico amigo da família foi estudar no Instituto Real dos Jovens Cegos de Paris, na França. Única escola, até então, especializada em educação para cegos no mundo. Dos 10 aos 16 anos de idade desenvolveu suas habilidades, tendo aprovação máxima nas disciplinas. Fato corroborado por um ex-aluno daquela escola em Paris e que, anos depois, foi professor no Instituto Benjamim Constant.

- Athaliba, tô fascinada e ocê tem o meu incondicional apoio para fazer justiça em colocar o nome de José Álvares de Azevedo na fachada do imponente prédio na Urca. Bairro charmoso da Zona Sul. Lá mora Roberto Carlos. Tem o Morro do Pão de Açúcar, além de sediar algumas das importantes instituições, como a UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro. Abriga o Istituto Europeo di Design, local que sediou a TV Tupi, após o Cassino da Urca ser proibido de promover jogos de azar no Brasil. Piada, né? A jogatina está institucionalizada, em diversas modalidades.

- Marienth, não deixa de alistar instituições no bairro que privilegiam as forças armadas, como a Escola Superior de Guerra - ESG -, o Instituto Militar de Engenharia - IME -, a Escola de Comando e Estado-Maior do Exército - ECEME - a Escola de Guerra Naval - EGN - e o Forte São João. Tem que registrar ainda o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas; a UNIRIO - Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro; o Museu de Ciências da Terra; e a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais - CPRM. Na área da cultura, o Instituto Ricardo Cravo Albin, o amigo do rei.

- Athaliba, a praia da Urca, com 100 metros de extensão, fica na entrada do bairro, que tem ainda a praia Vermelha; e a praia de Fora, onde foi fundada a Cidade do Rio de Janeiro. Mas, lá, o acesso só é permito pelo Exército. E guarda Monumentos aos Heróis de Laguna e Dourados e aos mortos na Intentona Comunista. Bem, tenho na lembrança shows memoráveis no Morro da Urca, na década de 1980, com Gilberto Gil, Egberto Gismonti e bandas de rock.

- Marineth, é preciso não desviar do foco de mobilização para que no 190º aniversário de José Álvares de Azevedo o nome dele seja fixado no prédio de educação para pessoas com deficiência visual. Benjamim Constant, que foi militar e dirigiu a instituição por 20 anos, talvez, por isso, mereceu o nome na fachada da entidade, como estipêndio de dívida de gratidão.

Lenin Novaes

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Crônicas do Athaliba

LENIN NOVAES jornalista e produtor cultural. É co-autor do livro Cantando para não enlouquecer, biografia da cantora Elza Soares, com José Louzeiro. Criou e promoveu o Concurso Nacional de Poesia para jornalistas, em homenagem ao poeta Carlos Drummond de Andrade. É um dos coordenadores do Festival de Choro do Rio, realizado pelo Museu da Imagem e do Som - MIS

Comentários


  • 12-04-2023 20:56:23 Julio Oliveira

    Lênin, esse reparo histórico deve ser feito o quanto antes. Forte e fraterno abraço.