- Marineth, nem sempre clico nas mensagens no correio eletrônico. Procuro ao máximo ser cauteloso para evitar fake news e não cair em golpes de “piratas virtuais” que plantam armadilhas ardilosas para fisgar incautos. Descarto à primeira vista assuntos inconsistentes que, geralmente, são disparados em cadeia de transmissão por adeptos do hipotético mito pés de barro que ocupa o trono da presidência da República. Alguns correspondentes têm a minha atenção, nem sempre pela afinidade de ideias ou de concepção política ideológica. Uma mensagem recebida em 17/11 - dia de nascimento da escritora Rachel de Queiroz, 1ª mulher a acessar a Academia Brasileira de Letras e a receber o Prêmio Camões - calhou com o assunto que bolava abordar em crônica.
- Athaliba, depois de explicar que coincidência foi essa, por favor, conte sobre a escritora Rachel de Queiroz, nem que seja um tiquinho de nada, tá?
- Marineth, em ato de protesto, na manhã de 17/11, manifestantes colaram cartaz com a palavra “fome” na imitada escultura “Touro de Ouro”, inaugurada no dia anterior, em frente à sede da Bolsa de Valores de São Paulo. Daí a ideia de escrever sobre o caso e mostrar a escancarada contradição do dinheiro em relação à fome que atinge índices inimagináveis no Brasil. E na tarde daquele dia recebi mensagem de internauta relacionando a inauguração da imitação da escultura do artista siciliano Arturo Di Modica à coloniedade brasileira.
- Seja mais explícito, Athaliba. Afinal, o que tem a ver o fundilho da calça com as nádegas?
- Marineth, ele, na mensagem, criticava o fato do Brasil, subservientemente, ter imitação do “Touro de Ouro” na frente da sede da Bolsa de Valores de São Paulo, como a existente na Bolsa de Valores em Nova York, nos EUA. E foi enfático, ao observar que “é uma demonstração típica de coloniedade; nesse caso a coloniedade a que a nossa ‘elite do dinheiro’ se submete. Aliás, é bom que se saiba que, muito mais do que a parcela submissa da população, é a nossa elite, serviçal, que mais se submete aos interesses estrangeiros em detrimento da própria pátria, do próprio povo, da nossa própria essência humana fundamental”.
- Athaliba, ele, talvez, até então, quando lhe enviou mensagem no correio eletrônico, não sabia ainda da oportuna manifestação contra a fome na carcaça da escultura em São Paulo.
- Marineth, pode ser. O fato é que a abordagem dele sobre coloniedade - diz que “o termo que, no senso genérico, significa o domínio da mente do oprimido pelo opressor” - é uma questão corriqueira. E isso se dá em todos os segmentos da vida brasileira. Seja na cultura, na economia, por exemplo, a subserviência do Brasil é flagrante. A cicatriz da submissão desde a colonização não fecha. Continua aberta como na frase rejeitável de Juracy Montenegro Magalhães, nomeado embaixador do Brasil nos EUA nos anos de 1964/5 pela ditadura do golpe empresarial-militar de 1964 de “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”.
- Athaliba, o que se sabe do escultor Arturo Di Modica?
- Marineth, ele nasceu em 1941 e morreu em fevereiro deste ano. Estudou na Academia de Belas Artes de Florença e ganhou fama com a escultura de bronze de 3.2 toneladas, que nomeou “Charging Bull” e lhe custou US$ 350 mil dólares. Na madrugada de 15/12 de 1989, furtivamente, às escondidas, ele fixou a obra em frente da Bolsa de Valores de Nova York e justificou: “É o meu presente aos Estados Unidos”.
- Fama arrancada no peito e na raça, né, Athaliba?
- Pois é Marineth. Mas, o que importa destacar, como novidade, à imitação da escultura, é o protesto contra a fome e a absurda desigualdade econômica que massacra grande parcela da população do país. Segundo os manifestantes, “o que para eles simboliza a força do mercado financeiro, para nós é um símbolo da fome, da miséria e da superexploração do trabalho”. E, além disso, tem memes que já ocupam espaços nas redes sociais troçando a crença de que coçar o focinho, agarrar os chifres ou testículos do “Touro de Ouro” traz boa sorte. É certo que ainda acontecerá muitas pichações na escultura em crítica à ganância capitalista.
- Athaliba, não duvido. Fale agora da escritora Rachel de Queiroz.
- Marineth, a Rachel nasceu em 17/11 de 1910, ano da Revolta da Chibata, liderada pelo marujo negro João Cândido Felisberto. Ela conquistou o prêmio da Fundação Graça Aranha já no primeiro romance, “O quinze”. E o romance “Memorial de Maria Moura” mereceu adaptação para a televisão, exibido em minissérie. No mais, aproveite agora para conhecer a obra dela, amiga!
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