Coluna

ETERNÍFLUO

vista do mar
Foto: Ussama Azam on Unsplash - 

Em contato com essa palavra, me chamou a atenção o que seria o seu significado. O nome me pareceu imaginativo, chamativo, essa junção da eternidade com a fluidez. Eternífluo significa, exatamente, essa fluidez eterna. Portanto, imaginar algo que flui eternamente tem uma magia, tem uma mágica impressionante. Além do valor poético do termo: eternífluo.

Como todas as palavras, elas cabem em qualquer contexto, desde as coisas boas, quanto às coisas más que vão fluindo por aí, eternamente, como a inteligência que vai penetrando nas cabeças e vai espalhando o conhecimento. E nas coisas más, na ignorância que, no caso, ela boia mesmo, porque têm certas coisas que não afundam… e cheiram, fluindo no ambiente.

Eternífluo pode ser aquele discurso modorrento, que vai dando aquele sono e aí, realmente, a gente entra no vagar da abstenção da realidade. E ele, também, pode ser aquele ir e vir, dizer e desdizer que vai se eternizando e enchendo o saco da gente, como os políticos que voltam para prometer as mesmas coisas que eles juraram, antes, que realizariam.

Eternidade, de fato, é algo entediante. Tipo ficar lendo as mesmas bobagens e argumentos inundando as redes sociais, não importando os fatos novos. Aquela bitolação eterna, os antolhos doutrinando tudo. Acho que essa eternidade tem uma função tático-social importante de manter o nível de ignorância em modo aceitável. É claro que algumas vezes transborda e foge do controle. É o caso da fluidez que vai por aí, e não afunda. Sendo constituído, assim, o problema de como colocar isso tudo de volta; tipo arrumar a bagunça.

A fluidez tem uma outra conotação. Porque esse fluxo precisa de espaços. E espaços é o que não faltam em mentes que, quando solicitadas para refletir, mostram um deserto, aquela eternifluidade (essa nem existe, mas eu gosto mesmo assim) que vai desembocar em lugar nenhum.

Existe, também, o eternífluo proposital. Corroborando o parágrafo anterior, são os espaços que não se enchem, são repletos de vazios, mas é proposital, porque contém os argumentos despropositados. No caso dos espaços vazios, é impressionante como a ignorância consegue preenchê-los com seus atributos.

Como no caso de uma internauta, no caso aquela que vaga pela internet, eternamente, porque a vida se resumiu a isso, uma internauta eterníflua, em um post sobre a extinção dos dinossauros, dizendo que eles não acreditaram na Palavra, outro disse que os dinossauros não falavam, mas ela disse que eles entendiam muito bem. Fico imaginando que os dinossauros provocaram um suicídio coletivo, imaginando o que estaria por vir.

Logo, essas coisas que ficam boiando por aí, esbarrando em alguns pontos, ao sabor da corrente, é algo eternífluo e desde o sempre estiveram por aí, e não vão embora, facilmente.

Romper com esse eterno tem a sua importância, nos retira do marasmo. Eternífluo é uma palavra poética, criativa e cativante, o que assusta é essa eternidade, e a fluidez que nos levará não se sabe onde.

Nilson Lattari

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Crônicas e Contos

NILSON LATTARI é carioca e atualmente morando em Juiz de Fora (MG). Escritor e blogueiro no site www.nilsonlattari.com.br, vencedor duas vezes do Prêmio UFF de Literatura (2011 e 2014) e Prêmio Darcy Ribeiro (Ribeirão Preto 2014). Finalista em livro de contos no Prêmio SESC de Literatura 2013 e em romance no Prêmio Rio de Literatura 2016. Menções honrosas em crônicas, contos e poesias. Foi operador financeiro, mas lidar com números não é o mesmo que lidar com palavras. "Ambos levam ao infinito, porém, em veículos diferentes. As palavras, no entanto, são as únicas que podem se valer da imaginação para um universo inexato e sem explicação".

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