- Athaliba, a justiça do Brasil vai reabrir o caso do assassinato brutal do jornalista Vladimir Herzog, em 1975, ocorrido na ditadura civil-militar (1964-1985), após o país ser condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em 5/7/2018, pois a morte dele é considerada crime de lesa-humanidade, não podendo ser prescrita com a Lei de Anistia.
- Que reviravolta é essa, Marineth?
- Pois é, Athaliba, o Brasil está obrigado a acertar as contas com a verdadeira história em relação ao assassinato de Vladimir Herzog nos porões da ditadura. O Ministério Público Federal, dia 17/3, denunciou seis ex-agentes do regime militar por participação na morte do jornalista e pela montagem da falsa cena de suicídio para encobrir o assassinato. Caberá, agora, a um magistrado da Primeira Vara Federal Criminal de São Paulo decidir se aceita ou não a denúncia, cabendo recurso.
- Marineth, felizmente foi preciso que um tribunal internacional interferisse no caso. A CIDH considerou o Brasil como responsável ao direito à verdade e à integridade pessoal, em prejuízo dos familiares do jornalista. Isso é vergonhoso para a sociedade brasileira, né?
- Athaliba, a nossa justiça vinha ignorando a decisão internacional, sob o argumento da validade da Lei de Anistia. Mas, agora, na denúncia assinada pela procuradora Ana Letícia Absy, é acusado José Barros Paes, chefe de comando da 2ª Seção do Estado Maior do II Exército; Audir Santos Maciel, o comandante do DOI-Codi, um dos principais centro de torturas; e Altair Casadei, ex-agente daquela unidade militar. A procuradora também denunciou os médicos legistas Harry Shibata e Arildo de Toledo, além Durval Moura Araújo, promotor de Justiça Militar aposentado. Absy lembrou que o crime teve a participação de outros agentes da repressão que, por já terem falecido ou não terem sido identificados ao longo das investigações, foram excluídos da acusação.
- Marineth, a farsa do suicídio de Vladimir Herzog, montada pelos militares, não deixava a menor dúvida, notada na fotografia na qual o mostrava enforcado a pouco mais de 1.60 metros do chão, com as pernas arqueadas.
- Athaliba, a simulação de suicídio foi ridícula, cômica, se não se tratasse de uma situação tão trágica. A farsa caiu por terra poucos anos depois com a entrevista à Folha de São Paulo do autor da foto, Silvado Leung Vieira, que na época tinha 22 anos de idade e era aluno do curso de fotografia da Polícia Civil de São Paulo. Ele contou que dia 25 de outubro de 1975 foi chamado ao local da cena do suicídio, no DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações da Defesa Interna), e fez a foto da porta da cela.
- Marineth, os algozes da ditadura tinham a prática de tentar transformar a morte de presos vítimas da tortura em suicídio, quando não desapareciam com os corpos.
- Athaliba, o Silvado disse ao jornal que “não tive liberdade, fiz aquela foto praticamente da porta; não fiquei com nada, câmera, negativos ou qualquer outro registro; só dias depois fui entender o que tinha acontecido; tudo foi manipulado e infelizmente eu acabei fazendo parte dessa manipulação”. Em 1979, ele saiu de férias do cargo de fotógrafo do Instituto de Criminalista e nunca mais votou. Vive desde então em Los Angeles, nos EUA.
- Marineth, o jornalista Vladimir Herzog tinha ido espontaneamente ao DOI-Codi, após ter sido procurado por agentes da repressão em sua casa e na TV Cultura, onde trabalhava como diretor de jornalismo. Embora ligado ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), ele não chegou a ter atividades na clandestinidade, e foi assassinado sob tortura.
- Athaliba, o Durval Moura, promotor de Justiça Militar, aos 99 anos, nos dias 26 e 28/3 do ano passado, em entrevista ao jornal El País, sobre o caso do Vladimir Herzog, disse que “eu estava integrado no aparato militar e não me arrependo de nada, prestei relevantes serviços ao país e ao Ministério Público Militar”. O papel dele era de ocultação dos crimes cometidos pelos militares, que começaram a vir à tona no processo de redemocratização do Brasil.
- Marineth, os filhos do jornalista conseguiram, em 2013, o reconhecimento de que Herzog foi morto mediante tortura. Agora, com a decisão da CIDH, é preciso concluir o processo penal e punir os responsáveis. Dedico, amiga, a crônica à Creusa das Graças Oliveira, mãe do nosso saudoso filho Vladimir, nascido em 10/4/1978 e vítima de bala perdida em 25/3/2007, no RJ, cujo nome homenageava Vladimir Herzog, inspirado em Vladimir Ilych Ulianov. Vida que segue!
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