Brasil

Mulher trans morta a facadas

“Tá lá o corpo estendido no chão,
Em vez de rosto, uma foto de um gol,
Em vez de reza, uma praga de alguém,
E um silêncio servindo de amém”.

Os versos da popular música “De frente pro crime”, de autoria de João Bôsco e Aldir Blanc, exemplificam a realidade da indiferença com assassinatos cometidos contra integrantes LGBTI+. Como observou Agripino Magalhães, presidente da Aliança Nacional LGBTI+, em declaração ao site Ponte Jornalismo, “é muito difícil ser uma mulher trans, negra, pobre e nordestina morando em São Paulo. Todos vão te olhar e te julgar de alguma forma. Há quem diga que ser trans ou travesti e se prostituir é ter uma vida fácil. Que vida fácil é essa que você tem que trabalhar às três horas da manhã, sujeita a qualquer coisa, inclusive a morte?”.

Vitória, mulher trans, foi assassinada a facadas em São Paulo. Reprodução

O ativista se referia ao assassinato da travesti Vitória Rodrigues Ferraz, ocorrido 23/10, na Alameda dos Uapês, no bairro do Planalto Paulista, na zona sul da capital. Segundo testemunha, cujo crime é investigado pelo delegado Rodolpho Junior, do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa - DHPP -, ela foi esfaqueada e jogada de um carro em movimento. O corpo da vítima foi submetido a exames necroscópicos e continua no Instituto Médico Legal - IML -, onde aguarda a liberação de familiares para sepultamento.

Michele Feitosa, irmã de Vitória, disse que parentes e integrantes do movimento LGBTI+ estão se cotizando para transladar o corpo para a cidade de Fortaleza, capital do Ceará. Relatou que Vitória deixou o bairro da Serrinha, na periferia da capital cearense, há 17 anos, “em busca de um sonho maior vivendo em São Paulo, onde não temos parentes”. A travesti nunca mais retornou à cidade e Michele diz que “ela falava conosco sempre; ligava, fazia chamada de vídeo, mas dizia que não tinha como voltar ainda porque tinha algumas coisas para resolver. Mas nunca soubemos que coisas eram essas”.

Vitória, ainda na adolescência, fazia programas em Fortaleza e, aos 14 anos de idade, foi levada para São Paulo por pessoas que os familiares dela não conheciam. Segundo Michele, “a gente até tentou saber, mas ela nunca falou; nós sempre aceitamos Vitória como ela era. A nossa mãe ficou muita abalada quando soube do assassinato e teve que tomar remédio”.

Relatório da Associação Nacional de Travestis e Transexuais - ANTRA - mostra que 80 pessoas trans e travestis foram assassinadas no Brasil, no primeiro semestre; sendo 175 no ano passado. Muito dos casos são subnotificados e a maioria das vítimas tem o mesmo perfil de Vitória Ferraz: negras e pobres que trabalham como prostitutas às noites nas ruas das principais capitais e cidades do Brasil.
 

Comentários