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ONDE O MAL SE ESCONDE

 Itay Kabalo / Unsplash

Questionamentos que os grupos fazem, na internet, através das redes sociais sobre assuntos de política e comportamentos, cada um defendendo seu ponto de vista, me fazem lembrar que, para alguns, o verso de Caetano Veloso se encaixa com perfeição: Que Narciso acha feio o que não é espelho. Cada um mira seu ataque naquilo que lhe desagrada, não importando onde esteja a razão.

A guerra verbal desanda até as lacrações através de memes, palavras grosseiras, referências uns aos outros com ofensas pessoais, e todos transferindo a posse da idiotice para o colo do outro.

Isso me lembra um pensamento de Sartre em seu livro Reflexões sobre o Racismo, quando ele começa o texto falando sobre o mal. Em outras palavras, define que quando você responde o mal com o mal, o mal, finalmente, se instala.

Houve um tempo em que isso me incomodava. Replicar uma informação sem, primeiro, verificar a fonte foi uma das coisas que eu fiz no início de todo esse processo. Até que uma vez eu compartilhei uma informação atribuída à atriz Fernanda Montenegro, em que ela, supostamente, discorria sobre uma entrega de uma parte do Brasil, se não me engano, Mato Grosso, aos americanos porque administrariam melhor. O vídeo dizia isto. No entanto, minha mulher me advertiu que aquela fala não poderia ser dela. Foi quando corri atrás do texto, ou do vídeo original, e verifiquei que aquela opinião estava completamente fora do contexto e o sentido era outro.

Apaguei aquele compartilhamento e verifiquei que o Narciso que estava dentro de mim se comportou muito mal. E o mal que eu estava ajudando a espalhar desfavorecia a imagem da atriz. Caí na realidade, e pude verificar que esta atitude me proporcionou um distanciamento de tudo aquilo.

Ainda hoje, verifico algumas pessoas propagando a informação falsa, mentiras claras e evidentes, apenas refletindo e compartilhando o seu narcisismo. E, consequentemente, espalhando o mal, que vai correndo pela internet pegando Narcisos inocentes e úteis e Narcisos altamente preparados que, mesmo sabendo que a informação seja falsa, continuam clicando e replicando. Feito isso, conscientemente, o mal se instala e se propaga.

O mal destrói coisas boas. Até porque o bom demora muito tempo para se constituir, mas o mal é rápido, corre como o rio caudaloso carregando tudo que está por perto.

Em alguns momentos, posso verificar que o mal é irreversível, ainda mais alimentado pelos internautas artificiais, que ajudam a replicar e a replicar.

Não dá para saber o que vai acontecer com o futuro, que está comprometido pela infusão de descrédito com a Humanidade. Junto a isso, cai sobre nós a tragédia do real, uma doença que assola a todos. E com ela, mentiras que ajudam a espalhar falsas realidades. O mal da doença é carregado pelo mal que está na ponta dos dedos quando toca em um teclado.

Nilson Lattari

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Crônicas e Contos

NILSON LATTARI é carioca e atualmente morando em Juiz de Fora (MG). Escritor e blogueiro no site www.nilsonlattari.com.br, vencedor duas vezes do Prêmio UFF de Literatura (2011 e 2014) e Prêmio Darcy Ribeiro (Ribeirão Preto 2014). Finalista em livro de contos no Prêmio SESC de Literatura 2013 e em romance no Prêmio Rio de Literatura 2016. Menções honrosas em crônicas, contos e poesias. Foi operador financeiro, mas lidar com números não é o mesmo que lidar com palavras. "Ambos levam ao infinito, porém, em veículos diferentes. As palavras, no entanto, são as únicas que podem se valer da imaginação para um universo inexato e sem explicação".

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