STJD analisa caso de mala preta e estuda eliminação de dirigente
Após revelar que ofereceu dinheiro a árbitro, mas sem especificar quando, supervisor do Cruzeiro é alvo da Procuradoria do Tribunal e corre risco de ser banido do futebol
A procuradoria do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) informou que está analisando as declarações dadas pelo supervisor de futebol do Cruzeiro, Benecy Queiroz, sobre o aliciamento financeiro a um árbitro, a popular mala preta, durante uma das passagens do técnico Ênio Andrade pelo clube, entre 1989 e a primeira metade dos anos 90. De acordo com o órgão, a procuradoria está trabalhando no caso e deve convocar Queiroz para esclarecimentos. O dirigente pode responder pelos artigos 237 e 241 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD) e artigos 42 e 62 do Código Disciplinar da Fifa.
O STJD ressalta que o tempo de prescrição no CBJD é de 20 anos, ou seja, os casos que tenham ocorrido antes de 1996 não podem mais ser alvos de denúncia do Tribunal. No entanto, no texto do Art. 4, do Código Disciplinar da Fifa, não existe tempo de prescrição em caso de corrupção.
O Art. 237. prevê punição para aquele que dê ou prometa vantagem indevida a qualquer entidade desportiva. A pena é de multa de R$ 100 a R$ 100 mil, suspensão de 360 a 720 dias e eliminação no caso de reincidência. O Art. 241 fala também de eliminação do clube, do intermediário e do árbitro que aceitar a vantagem, mas não cita reincidência. O artigo 62 do Código disciplinar da Fifa determina que qualquer pessoa que ofereça, prometa ou conceda vantagem a algum membro do corpo da entidade, jogo, jogador ou funcionário como tentativa de incitar a violação de regras será punido com multa de pelo menos 10 mil francos suíços, proibição de participar de qualquer atividade relacionada ao futebol e também de entrar em qualquer estádio de futebol. Caso seja reincidência, a punição de banimento pode ser vitalícia.
De acordo com Benecy Queiroz, a tentativa aconteceu em uma das cinco passagens do técnico Enio Andrade pelo clube (1989, 1990, 1991, 1994 e 1995). Ainda segundo ele, a tentativa não foi bem-sucedida, já que o árbitro não favoreceu o Cruzeiro na partida. O dirigente não citou contra qual time e nem em que ano o fato ocorreu.
– Só vou citar um caso específico aqui em Minas Gerais, mas não falo o nome. O treinador era o Ênio Andrade, e nós, através de indicação de uma pessoa, achamos que compramos um juiz, que falou: "Olha, fique tranquilo que o time do adversário não sai do meio de campo." Nos 45 primeiros minutos ele deu muita falta só no meio de campo. Falei com ele: "É, acho que o negócio vai dar certo." Só que, para azar nosso, o adversário chutou uma bola do meio de campo, no ângulo e gol. E o goleiro eu posso falar o nome, o Vitor. O que foi que o juiz fez, então? Continuou dando falta só no meio, só no meio, só no meio. Teve uma hora, porque antigamente podia entrar dentro de campo, que eu falei: "Velho, eu paguei a você. Veja se dá o pênalti." Ele falou assim: "Manda o seu time lá para frente que eu dou o pênalti." Disse para o capitão: "Olha, manda todo mundo para frente. Temos que empatar o jogo." Aí o time foi para frente, mas toda bola ele dava falta contra o Cruzeiro. Eu cheguei à conclusão de que empreguei um dinheiro errado – afirmou o dirigente em entrevista à Rede Minas.
De acordo com Bruno Vicintin, vice-presidente de futebol do Cruzeiro, a declaração do supervisor foi "confusa e infeliz". O dirigente nega que qualquer título tenha sido conquistado indevidamente. Ele ainda destaca que o clube celeste nunca admitiu esse tipo de conduta dos funcionários. Porém, a posição oficial ainda será passada pelo presidente do Cruzeiro, Gilvan de Pinho Tavares.
– Primeiro, é óbvio que a posição oficial do Cruzeiro quem vai dar é o presidente do clube. Mas todos nós ficamos muito chateados. Foi, sem dúvida, uma entrevista infeliz. Benecy tem 45 anos como funcionário do clube, vinha contando "causos" do futebol, e é público que no futebol mineiro existem "causos" e lendas, mas que nunca tomaram essa proporção. Para quem conhece o futebol mineiro, existem "causos", e ele estava contando os da carreira dele. Foi uma declaração infeliz. Ele se confundiu todo. Vi a declaração três vezes e nem consegui entender quando foi a história. Eu desafio qualquer pessoa que está escrevendo a falar um título que o Cruzeiro ganhou com ajuda da arbitragem. O Cruzeiro conquistou o que conquistou trabalhando e jogando, e nada vai tirar isso do clube e da nossa torcida. O Cruzeiro já foi muito prejudicado, mas não houve essa mesma repercussão. A declaração foi infeliz, mas acho que tomou uma proporção muito grande. Cheguei a ler que o Benecy comprava árbitros em diversas épocas. O Cruzeiro nunca admitiu isso de funcionários do clube, e não aceitaria isso. O presidente Gilvan é conhecido por sua idoneidade. Não só ele, mas também o Cruzeiro. Isso ninguém vai tirar. Esse caso que o Benecy contou vai ser conversado entre ele e o presidente, e os dois vão passar a posição oficial do clube – disse Vicintin em coletiva na Toca da Raposa II
.
Benecy é um dos funcionários mais antigos do Cruzeiro, atuando no clube mineiro desde a década de 1970. Já exerceu diversas funções, até mesmo sendo treinador por algumas partidas. Atualmente no cargo de supervisor de futebol, cuida principalmente da logística e dos trâmites burocráticos da Raposa.
Confira os artigos em que Benecy Queiroz pode ser denunciado:
CBJD
Art. 237. Dar ou prometer vantagem indevida a quem exerça cargo ou função, remunerados ou não, em qualquer entidade desportiva ou órgão da Justiça Desportiva, para que pratique, omita ou retarde ato de ofício ou, ainda, para que o faça contra disposição expressa de norma desportiva. PENA: multa, de R$ 100 (cem reais) a R$ 100.000 (cem mil reais), suspensão de trezentos e sessenta a setecentos e vinte dias e eliminação no caso de reincidência. (NR).
Art. 241. Dar ou prometer qualquer vantagem a árbitro ou auxiliar de arbitragem para que influa no resultado da partida, prova ou equivalente. PENA: multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais), e eliminação. (NR).
Parágrafo único. Na mesma pena incorrerá:
I - o intermediário;
II - o árbitro e o auxiliar de arbitragem que aceitarem a vantagem.
Fifa
Art. 42 Prazo de prescrição para a acusação
1. As infrações cometidas durante uma partida não podem mais ser processadas após um período de dois anos. Como regra geral, outras infrações podem não ser processado após dez anos.
2. Violações à regra do antidoping não pode ser processadas depois de oito anos depois de corridas.
3. Infrações por corrupção (vide art. 62) não estão sujeitas a um prazo de prescrição.
Art. 62
1. Qualquer pessoa que oferece, promete ou concede uma vantagem injustificada a um corpo
da FIFA, um jogo oficial, um jogador ou um funcionária em nome próprio ou de terceiros, em uma tentativa de incitá-lo a violar os regulamentos da FIFA será
sancionado:
a) com uma multa de pelo menos 10.000 Francos suíços;
b) com a proibição de tomar parte em qualquer atividade relacionada com o futebol, e
c) com a proibição de entrar em qualquer estádio.
2. Corrupção passiva (solicitar, sendo prometido ou aceitar uma vantagem injustificada) será sancionado da mesma maneira.
3. Em casos graves e no caso de repetição, pode ser pronunciado para a vida.
4. Em qualquer caso, o corpo vai ordenar o confisco dos envolvidos ativos na infração. Esses ativos serão utilizados para o futebol e programas de desenvolvimento.
Comentários