Rio - Louise Glück ganhou o Nobel de Literatura do ano passado. A última poeta a receber o Nobel foi a escritora polonesa Wislawa Szymborska, em 1996.
Bom para a poesia.
Louise Glück, de 77 anos, é poeta, ensaísta e professora de Yale, uma das mais respeitadas universidades dos Estados Unidos. Entre os prêmios da autora, estão o Pulitzer, em 1993, por seu livro The Wild Iris (A Íris Selvagem, em tradução livre), e o National Book Award, em 2014, com a obra Faithful and Virtuous Night (Noite Fiel e Virtuosa, em tradução livre).
A Academia Sueca afirma que Louise Glück ganhou o Nobel “por sua voz poética inconfundível que, com beleza austera, faz universal a existência individual. Mesmo se Glück nunca negasse a importância do contexto autobiográfico, ela não deveria ser encarada como uma poeta confessional.
Glück busca o universal, e nisso ela se inspira em mitos e motivos clássicos, presentes na maior parte do seu trabalho.
As vozes de Dido, Perséfone e Eurídice — a abandonada, a punida, a traída — são máscaras para um eu lírico em transformação, tão pessoal quanto válido de maneira universal”, afirma a Academia Sueca.
Confesso que conhecia pouco da obra de Louise Glück. Para mim e muitos brasileiros, o nome soa como novidade, mas isso tem uma explicação: a obra da autora nunca foi traduzida no País.
Mas a avaliação da Academia Sueca - que cabe como uma luva para vários poetas - parece precisa para a poeta.
Para quem ainda não conhece Glück, aí vai uma de suas poesias e algumas opiniões que encontrei na internet sobre a autora:
“A Academia Sueca sugere que sua poesia “busca a clareza”. Todos os escritores buscam, por certo. Alguns menos, outros mais. Talvez, pela poesia lida por mim, busca mais a luz, rever a vida pela poesia, do que a clareza.
Porque não é fácil tornar “claro” — preciso — aquilo que é enviesado e ambíguo”.
“Filha de uma família de imigrantes húngaros de origem judaica, Glück é conhecida por uma obra marcada pela precisão e pela economia a fazer contraste com seu tom confessional, criando um estranho distanciamento subjetivo”.
Uma interpretação um tiquinho mais luminosa do que a da Academia Sueca, que às vezes comenta as obras de maneira genérica, protocolar — o que não significa, no geral, equivocada”.
“Outro aspecto importante é um retorno aos temas clássicos, seja pelo culto ao mundo natural, assunto dominante em seu premiado ‘Wild Iris’ (1992), seja pela retomada criativa de figuras que povoam a mente de poetas e leitores filiados à tradição ocidental”, registra Pedro Gonzaga. O apontamento da retomada dos “temas clássicos” é correta, mas, se o crítico substituísse “temas clássicos” por temas universais, estaria igualmente justo.
Poetas quase sempre são excelentes comentaristas de poesia. Parece ser o caso, segundo Pedro Gonzaga. “A economia e a clareza de suas avaliações, seja na análise de suas memórias, seja sobre os desafios da lírica, em muito lembram essas mesmas qualidades admiráveis em seus poemas. Numa era de politização total dos temas e de guetificação da experiência humana, numa arte que mais parece propaganda de meia dúzia de lemas gastos, suas palavras são água cristalina e fresca no mais desolador dos verões”, pontua o professor.
Os Estados Unidos são uma nação de grandes poetas, como Emily Dickinson, Marianne Moore, Edna St. Vincent Millay, Elizabeth Bishop, Anne Sexton e Sylvia Plath. Louise Glück merece figurar na lista, não pelo Nobel em si — e já havia sido laureada com o Pulitzer —, e sim pela beleza de sua poesia.
O poema “Flores silvestres”, tão bem traduzido, merece um adjetivo que não sai de moda: é lindo.
Flores silvestres
O que estão dizendo? Que querem
vida eterna? Seus pensamentos são mesmo
tão arrebatadores assim? Com certeza
não olham para nós, não nos ouvem,
em sua pele
mancha de sol, pó
de botões-de-ouro: estou falando
com vocês, vocês que olham fixamente por entre
os talos de grama alta agitando
o pequeno guizo — Ó
alma! alma! Basta
olhar para dentro? Desdém
pela humanidade é uma coisa, mas por que
desprezar o vasto
campo, seu olhar elevando-se acima das nítidas cabeças
dos botões-de-ouro silvestres em direção a quê? Sua pobre
ideia de céu: ausência
de mudança. Melhor que a terra? Como
saberiam, se não estão nem
aqui nem lá, eretas entre nós?
(Tradução de Maria Lúcia Milléo Martins)
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