Coluna

COMEMORANDO O GOLPE

Rio - Como todo mundo leu, Bolsonaro ficou eufórico com a proximidade do aniversário de 57 anos do golpe militar de 1964, que instaurou uma ditadura no país.

O presidente ainda estava decorando o gabinete com bolas coloridas e bandeirinhas para a comemoração quando os ministros do Exército, Marinha e Aeronáutica entraram na sala.

Imagino que a conversa entre eles, foi mais ou menos essa:

- É seu aniversário, presidente? - perguntou o ministro da Marinha. 

- Nada disso daí. Vamos comemorar a Revolução de 1964 - disse o presidente, enquanto soprava uma língua de sogra.

A fala de Bolsonaro celebrando e exaltando o golpe militar de 31 de março de 1964, que instaurou  o AI-5  no país, gerou forte reação entre os ministros: 

militares, por nani
Ilustração - Nani. 

- Revolução, presidente? Nunca houve nenhuma revolução em 64. O que houve foi um golpe militar que depôs o presidente João Goulart - democraticamente eleito - fechou o Congresso, cassou liberdades individuais, assassinou e torturou professores, políticos e jornalistas - retrucou o ministro do Exército.

- E mergulhou o país em uma ditadura que durou 21 anos - completou o ministro da Aeronáutica.

- Que provas temos que houve um golpe militar, além da palavras dos esquerdistas - perguntou o presidente. - Eles estão tentando desacreditar um movimento legítimo dos militares.

- Movimento legitimo? - perguntou o ministro da Aeronáutica, sorrindo.

- Não existe nenhuma prova que houve golpe - disse o presidente - exceto o fato de que algumas pessoas que queriam instalar o comunismo no país, se suicidaram.

O ministro do Exército falou:

- É verdade. As pessoas naquela época costumavam se suicidar quando ouviam Chico Buarque. A única coisa que não consigo entender é como não vimos isso durante todos esses anos.

O ministro da Marinha concordou:

- Na minha cidade 12 pessoas se suicidaram depois de ouvir Geraldo Vandré cantar “Pra Não Dizer Que Não Falei Das Flores”.

- O tal do Wladimir Herzog foi um deles, taokey - disse o presidente. 

- O jornalista Herzog se suicidou, presidente? - perguntou o ministro do Exército. - Como alguém consegue se enforcar pendurado em uma janela e com os pés no chão?

- Isso daí já é outra ‘cuestão’, taokey? Acho que só estamos procurando problemas ao darmos ouvidos a tais rumores. Todo mundo vai morrer um dia. Vai ficar lamentando até quando? Chega de mi-mi-mi, porra!

- Mas - disse o ministro da Marinha - a ditadura é uma realidade e o senhor terá que encarar esse problema mais cedo ou mais tarde. Acho que o senhor deveria anunciar que acredita que existiu uma ditadura no país e que pretende renegá-la e não  idolatrá-la. Que acredita na vacina, no distanciamento social, que a terra é redonda e que a rachadinha é uma realidade.

- Não existe nenhuma prova de que a terra é redonda - disse o presidente - E depois, meus apoiadores não são lá muito inteligentes, se reconhecermos agora a possibilidade de que a terra é redonda, só iremos confundi-los. 

- Seus apoiadores também não acreditam na rachadinha. Acredito que se o senhor anunciar que a terra é redonda e que a rachadinha não é invenção do PT, talvez eles acreditassem.

- Essa ‘cuestão’ da rachadinha, é uma invenção da esquerda.

- Se é uma invenção, presidente, como seu filho comprou uma mansão com ela?

- Estão todos demitidos!! - berrou o presidente.

E assim se fez a reforma ministerial.

Ediel Ribeiro (RJ)

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Coluna do Ediel

Ediel Ribeiro é carioca. Jornalista, cartunista e escritor. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) do romance "Sonhos são Azuis". É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG). Autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty" publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ) e Editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!". O autor mora atualmente no Rio de Janeiro, entre um bar e outro.

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