A censura é sempre exercida por aqueles que detêm um poder, ou um tipo de poder, e a necessidade de mantê-lo é sobrevivência. O censor pode ter mais motivos para censurar do que o censurado de se esconder.
Normalmente, o censurado é aquele que precisa de um canal de comunicação para o mundo, para a sociedade em que vive, e é impedido de alguma forma de possuí-lo. Imaginemos que o indivíduo queira denunciar uma forma de opressão, não importando que ele tenha razão ou não, mas a própria situação de tentar colocar seu estado em debate é uma forma de verbalizar os seus argumentos. Ele é impedido de várias formas: por impedimento físico, através da dor e do sofrimento; do impedimento moral, na forma de uma chantagem qualquer ou, simplesmente, dando a ele o direito da voz, mas o impedimento material de falar no mesmo palanque, e de tempo do outro, o que se iguala ao calar.
Partindo do pressuposto que haja igualdade na sociedade, todos exercem o direito de pleitear aquilo que ache certo. No caso, contra uma voz, é dada a mesma liberdade de falar, porém, a mesma voz que chancela a tal liberdade, também pode ser a voz que censura, porque tem o direito à última palavra. Liberdade, então, torna-se um conceito muito relativo, e relativo pela oportunidade de igualdade nos debates.
As formas de comunicação se proliferaram, com o advento da internet, e, portanto, a tecnologia deu voz às vozes que apenas berravam nas janelas das casas, ou nas passeatas das ruas. Senão, vejamos: uma passeata com duração de uma, duas, três horas, com palavras de ordem, adesões, é noticiada pelas mídias com parcos segundos, alegando pouco espaço na programação, o que não define o alcance do movimento, e o assemelha a um mero e prosaico transtorno no trânsito. No entanto, hoje, a internet é uma forma de burlar a censura, e, pelo menos, tentar igualar o palanque.
Outra forma de censura é manter o oponente sempre acuado, reverberando os seus malfeitos, ainda que sob suspeição e investigação, e ignorando os fatos que lhe tragam benefícios, e, portanto, anulando-os. Muitas vezes é feita por ditos especialistas, escolhidos, é claro, pelo dono da voz, celebridades que são escolhidas porque dão voz ao dono da voz, por verbalizar sentimentos que blindem as fortalezas econômicas em que as vozes se encastelaram e passam o poder de geração para geração, sem que as novas tenham tido um mínimo de história própria para contar. Ah! Como os famosos especialistas são convocados para calar vozes: autoridade é tudo.
A censura, na dita democracia e liberdade, torna-se uma censura muito mais perversa, porque ela não está identificada em castelo próprio, é velada, distribuída em diversos arcabouços, como trustes imobiliários, industriais, de comunicação, financeiros que se dizem capazes de sobreviver por conta da própria iniciativa privada que apregoam, mas mantém o poder, que mesmo sob suspeição ou investigação se impõem como tribunais de inquisições: são as últimas palavras, e onde autoridade é tudo.
Antes de qualquer coisa, a marca, o nome, a grife, sob uma capa de moralidade, fica sempre atenta no sentido de mudar para se conservar, e ditando as normas de comportamento, censuram o novo que tenta surgir e uma das formas de sobrevivência do censor é ignorar o outro.
Até porque aquele que está com a razão não tem a necessidade de ir além do fato, cabendo ao oponente a construção do factoide.
Algumas vezes o grito pela liberdade de expressão não passa de cortina de fumaça quando o medo real precisa ser enfrentado de igual para igual, caminhar com as próprias pernas, e os que detém o poder alertam para a censura. E, assim, a censura, a acusação de estar sendo censurado, vem com a sucumbência econômica, que ameaça desmanchar os castelos de cartas. Duvide sempre dos apelos à ordem, à moral e aos costumes, porque são munição para manter um ataque sistemático e sufocar o censurado de muitas perguntas para fazer, e ao censor nenhuma delas responder.
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