Coluna

SE HERÓIS MATAM

Quem são nossos heróis? Aqueles que nos apontam como modelos, ou aqueles que nos enchem de orgulho por tê-los perto de nós?

Heróis são aqueles que se escondem nas suas próprias vergonhas e humilhações. Heróis são nossos pais que se submetem a um emprego, a um trabalho vil, porque o único propósito é que seus filhos não passem privações, e muitas vezes escondem seus desapontamentos com sorrisos ao chegar em casa. Heróis são nossas mães que abrem mão de seus sonhos de trabalho porque um filho precisa da sua companhia, e que os médicos não são capazes de curar.

Foto: morguefile.com
Foto: morguefile.com

Heróis são anônimos, são os “santos de todos os dias”, que estendem as suas mãos, nos avisam dos perigos, nas ruas e desaparecem sem deixar qualquer vestígio, seus endereços, e não esperam nenhum tipo de agradecimento.

Heróis nascem dentro deles mesmos, num repente, quando lança o próprio corpo contra a arma para salvar alguém que julga deva ser preservado para o futuro: heróis enxergam o futuro, se alicerçam no passado do aprendizado e se fazem presentes na hora certa.

Heróis enxergam o que outros não veem, conduzem para caminhos que a epifania os ilumina, e seguem, e como um ímã atraem outros, a perseguir ideias e soluções que passem pela compreensão do outro como o próximo, aquele próximo que está ao seu lado, na precisão do momento, e não o próximo escolhido a dedo.

Heróis são desobedientes, heróis confrontam ordens que vão de encontro aos seus princípios. Heróis desafiam os poderosos, mesmo sabendo do próprio risco, heróis metem medo, porque é próprio dos heróis serem o próprio medo da mudança, porque confrontam com ideias, caráteres e personalidades fortes.

Heróis morrem, heróis não matam. Porque heróis se deixam levar pela ideia, porque heróis se sacrificam pelo outro, por isso são heróis, os outros são apenas assassinos.

Herói foi Duque de Caxias que se recusou a continuar uma guerra fratricida, porque seu trabalho havia terminado, e o resto seria política. Desobedeceu seu Imperador, que tinha o ódio e a raiva nos olhos, e se recusou a afrontar sua personalidade, porque “A afronta se lava com fibra de herói e gente brava”. Heróis não se imiscuem nas ordens superiores para poder dar vazão ao seu instinto: heróis dizem não na hora devida e sim a todo momento.

Herói não age no ímpeto, heróis, nossos heróis, morreram na forca pela independência, morreram enrolados na bandeira no fragor da batalha. Heróis descem em buracos na busca do sobrevivente, heróis enfrentam o meliante e não pedem retribuição, apenas continuam suas vidas.

Heróis? Heróis não matam, se deixam matar para que o outro sobreviva. Herói é todo aquele que personifica o que os covardes não têm coragem de ser.

Nilson Lattari

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Crônicas e Contos

NILSON LATTARI é carioca e atualmente morando em Juiz de Fora (MG). Escritor e blogueiro no site www.nilsonlattari.com.br, vencedor duas vezes do Prêmio UFF de Literatura (2011 e 2014) e Prêmio Darcy Ribeiro (Ribeirão Preto 2014). Finalista em livro de contos no Prêmio SESC de Literatura 2013 e em romance no Prêmio Rio de Literatura 2016. Menções honrosas em crônicas, contos e poesias. Foi operador financeiro, mas lidar com números não é o mesmo que lidar com palavras. "Ambos levam ao infinito, porém, em veículos diferentes. As palavras, no entanto, são as únicas que podem se valer da imaginação para um universo inexato e sem explicação".

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